19 Junho 2015
A humanidade, na sua relação com o ambiente, encontra-se diante de desafios cruciais, que também requerem a elaboração de políticas adequadas, que também figuram na agenda internacional. Certamente, a Laudato si' poderá e deverá ter um impacto sobre esses processos.
A opinião é do cardeal ganês Peter K. A. Turkson, presidente do Pontifício Conselho Justiça e Paz. O artigo foi publicado no jornal L'Osservatore Romano, 19-06-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto. O texto foi apresentado, no dia de ontem, por ocasião da apresentação da Encíclica, no Vaticano.
Eis o texto.
O ponto de partida da encíclica Laudato si' consiste em uma escuta espiritual dos melhores resultados científicos disponíveis hoje em matéria ambiental, para "deixar-se tocar por ela em profundidade e dar uma base concreta ao percurso ético e espiritual seguido" (n. 15). A ciência é o instrumento privilegiado através do qual podemos ouvir o grito da terra.
Abordam-se questões extremamente complexas e urgentes, algumas das quais – como as mudanças climáticas e, especialmente, as suas causas – são objeto de um debate acalorado no campo científico.
O objetivo da encíclica não é intervir nesse debate, coisa de competência dos cientistas, muito menos estabelecer exatamente em que medida as mudanças climáticas são uma consequência da ação humana. O Santo Padre recordava isso ainda no dia 15 de Janeiro, no voo de Sri Lanka às Filipinas.
Na perspectiva da encíclica – e da Igreja – é suficiente que a atividade humana seja um dos fatores que explicam as mudanças climáticas para que decorra daí uma responsabilidade moral grave de fazer tudo o que está em nosso poder para reduzir o nosso impacto e para evitar os seus efeitos negativos sobre o ambiente e sobre os pobres.
O passo posterior no caminho da encíclica é a recuperação das riquezas da tradição judaico-cristã, sobretudo no texto bíblico e, depois, na elaboração teológica que se fundamenta nela. Essa revelação explicita a "enorme responsabilidade" do ser humano em relação à criação, a ligação íntima entre todas as criaturas e o fato de que "o ambiente é um bem coletivo, patrimônio de toda a humanidade e responsabilidade de todos" (n. 95).
A análise, então, lida com as "raízes da situação atual, de modo a identificar não apenas os seus sintomas, mas também as causas mais profundas" (n. 15), em um diálogo com a filosofia e as ciências humanas. O objetivo é elaborar o perfil de uma ecologia integral, que, nas suas diversas dimensões, incluindo compreenda "o lugar específico que o ser humano ocupa neste mundo e as suas relações com a realidade que o rodeia" (n. 15), nas diversas dimensões da nossa vida, na economia e na política, nas diversas culturas, em particular nas mais ameaçadas, e também em cada momento da nossa vida cotidiana.
Sobre essa base, o quinto capítulo aborda a pergunta sobre o que podemos e devemos fazer, e propõe uma série de perspectivas de renovação da política internacional, nacional e local, dos processos de tomada de decisão em âmbito público e empresarial, da relação entre política e economia e entre religiões e ciências.
Para o Papa Francisco, é indispensável que a construção de caminhos concretos não seja abordada de modo ideológico, superficial ou reducionista. Por isso, é indispensável o diálogo, um termo presente no título de cada seção desse capítulo: "Há discussões sobre problemas relativos ao meio ambiente, onde é difícil chegar a um consenso. Repito uma vez mais que a Igreja não pretende definir as questões científicas nem substituir a política, mas [eu] convido a um debate honesto e transparente, para que as necessidades particulares ou as ideologias não lesem o bem comum" (n. 188).
Por fim, com base na convicção de que "cada mudança precisa de motivações de um caminho educativo", o sexto capítulo propõe "algumas linhas de amadurecimento humano inspiradas no tesouro da experiência espiritual cristã". Nessa linha, a encíclica se encerra oferecendo o texto de duas orações.
A humanidade, na sua relação com o ambiente, encontra-se diante de desafios cruciais, que também requerem a elaboração de políticas adequadas, que também figuram na agenda internacional. Certamente, a Laudato si' poderá e deverá ter um impacto sobre esses processos.
No entanto, mesmo um rápido exame do seu conteúdo, como o que acabo de delinear, mostra que ele tem uma natureza magisterial, pastoral e espiritual, cujo porte, amplitude e profundidade não podem ser reduzidos apenas ao âmbito das políticas ambientais.
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Ecologia integral. Artigo de Peter K. A. Turkson - Instituto Humanitas Unisinos - IHU