15 Junho 2015
Ainda não há bispos atrás das grades no Vaticano. Exceto, obviamente, o arcebispo polonês Jozef Wesolowski. Acusado de ter abusado de menores quando era núncio em Santo Domingo, ele ainda está em prisão domiciliar no palácio dos Penitenciários dentro da Cidade Leonina. Autorizado a uma certa liberdade de movimento, mas com obrigação de permanecer dentro do Estado vaticano e sujeito a oportunas limitações nas comunicações com o exterior, ele espera há um ano um julgamento que ainda não chegou.
A reportagem é de Paolo Rodari, publicada no jornal La Repubblica, 12-06-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Mas, enquanto isso, ele deve estar lá, dentro dos muros, até que o processo judicial se conclua. Além de um processo canônico, Wesolowski deve sofrer um processo civil no Tribunal do Estado da Cidade do Vaticano. E é por causa desse segundo processo que puderam prendê-lo.
Isso não poderá acontecer, ao contrário, para os bispos "acobertadores", aqueles que se tornam culpados por encobrir os padres pedófilos dentro das próprias dioceses. Por decisão ratificada há dois dias pelo Papa Francisco, eles deverão passar por um processo canônico regular dentro do Vaticano. Mas não poderão ser detidos.
Em suma, lhes será dada a permissão de entrar e sair dos muros leoninos antes e depois da sentença contra eles, mas a Gendarmeria Vaticana não terá nenhum poder coercitivo sobre eles. Até porque as penas que eles podem sofrer não preveem o cárcere: trata-se de sanções relativas ao exercício do próprio ofício, a limitação das celebrações litúrgicas públicas e ainda, em casos excepcionais, a demissão do estado clerical.
Além disso, isso também aconteceu recentemente com o bispo estadunidense Robert W. Finn. Condenado há dois anos por um tribunal secular por ter acobertado abusos, no dia 20 de abril passado, por vontade do papa, ele deixou a arquidiocese de Kansas City-St. Joseph.
Nas semanas que precederam a decisão papal, ele havia sido visto várias vezes em Roma, entrando e saindo dos portões vaticanos. A imprensa dos EUA há muito tempo pedia a sua demissão: culpado em 2012 por ter protegido o padre Shawn Ratigan que, por anos, tinha tirado fotos de pornografia infantil de crianças da sua paróquia, pedia-se a sua rendição definitiva. Mas ele não queria ceder, embora, em certo ponto, teve que abdicar, depois que uma visitação apostólica tinha sido enviada para Kansas City pelo Vaticano.
A visitação apurou os crimes. E tudo se consumou. O seu processo foi uma antecipação daquilo que, de agora em diante, se tornará a norma. Três congregações, a dos Bispos, a da Evangelização dos Povos e a das Igrejas Orientais terão a faculdade de avaliar os casos de bispos acusados de ter acobertado padres pedófilos. O crime, segundo o Código de Direito Canônico, é por abuso de ofício.
Quando considerado oportuno, o dossiê de cada bispo individual será enviado a uma nova seção judicial, que será constituída dentro da Congregação para a Doutrina da Fé, uma espécie de novo tribunal.
Essa seção, com pessoal estável, será liderada por um secretário que, tecnicamente, enviará os processos para a frente. Ele terá o direito de se encontrar com os bispos acusados várias vezes, sozinhos ou junto com os seus respectivos advogados.
Ele ouvirá testemunhas, avaliará cuidadosamente os dossiês: o risco de calúnias gratuitas é um câncer sempre presente na Igreja Católica. Sobre os bispos acusados, será aberto um arquivo, que irá envolver a escuta de mais testemunhos, começando pelo das vítimas.
Uma vez que as acusações sejam consideradas ao menos verossímeis, ao bispo poderá ser imposta uma suspensão temporária. Depois disso, iniciará o processo propriamente dito.
A linha é dupla: garantir ao máximo as vítimas, mas também o acusado. "Atenção – diz o padre Fortunato di Noto, presidente da associação Meter, que luta há muito tempo contra a pedofilia –, se quisermos 'matar' uma pessoa, basta acusá-la de pedofilia."
Em todo caso, para os procedimentos internos, o caminho ainda é longo. Como explicou há dois dias o padre Federico Lombardi, há cinco anos de tempo para que as novas propostas sejam examinadas.
O assunto é sério e delicado. Mas o salto é evidente e marca o fim de uma época. Certamente, no horizonte, não faltam alguns riscos. Gianfranco Svidercoschi, ex-vice-diretor do L'Osservatore Romano, autor de "Um papa sozinho no comando" e de dois livros anteriores em que tratava a fundo o problema da pedofilia dos padres, explica: "Certamente, a nova disposição abre para uma novidade positiva, dados também os casos dolorosos do passado, como, por exemplo, o do ex-cardeal de Boston, Bernard Law, acusado de acobertamentos. Mas eu vejo riscos: a multiplicação de gestos e de órgãos que, às vezes, não resolvem os problemas. Além disso, centraliza-se em Roma uma série de competências que, talvez, poderiam ser resolvidas no nível das Conferências Episcopais, como defende a Evangelii gaudium. De fato, Bento XVI já havia demitido por pedofilia ou por acobertamentos cerca de 80 bispos, até sem um tribunal propriamente dito. Até porque aquilo de que mais se precisaria, a meu ver, seria uma verdadeira reforma dos seminários: o padre pedófilo deve ser detido a tempo, antes da ordenação sacerdotal".
Diz Luca Diotallevi, sociólogo da Universidade de Roma Tre, vice-presidente das Semanas Sociais dos católicos italianos: "Se lermos a constituição dogmática sobre a Igreja do Concílio Vaticano II e o Código de Direito Canônico, que é em grande parte inspirado nela, compreende-se que a Igreja prescreve ao ministério eclesiástico tarefas bem mais exigentes. Os pastores são chamados a prover, de todos os modos, pelo bem dos fiéis, até terem que se encarregar de alguns sacrifícios e de algum rigor. O ato, portanto, que Francisco está prestes a tomar não inova, mas explicita uma parte do ensinamento da Igreja. O que deve ser enfatizado é a consciência que o papa expressa: definir apenas os objetivos não basta. Em uma história coletiva como a da Igreja, também é preciso definir os limites. Caso contrário, por trás da inevitável vagueza dos fins, pode-se constituir um cone de sombra no qual é possível se esconder, tanto nas organizações civis quanto nas eclesiásticas. Isso vale para a pedofilia, mas também para as questões econômicas e da liturgia".
No entanto, é um fato: por anos, alguns bispos de todo o mundo haviam contornado as regras do direito canônico, encobrindo pedófilos com o método da transferência de paróquia em paróquia. Permitindo, desse modo, que os crimes se perpetrassem.
O padre Fortunato Di Noto diz ainda, não por acaso, que "o percurso de mudança está em curso e é irreversível. A Igreja começou o caminho da limpeza não sem dificuldades, com dor e admissões nada fáceis das próprias culpas. Portanto, com uma nova assunção de responsabilidade, com a consciência de que pecados tão graves nunca podem ser tolerados. Muitas vezes, a societas eclesial, mas também a sociedade em geral não tem a consciência dos danos que as crianças podem sofrer. E a assunção de responsabilidade não diz respeito apenas aos bispos, mas também aos clérigos, aos religiosos e aos agentes de pastoral. Várias vezes eu me perguntei o que levava um bispo a acobertar, a não denunciar, a esconder. E entendi que a resposta é apenas uma: diante de crimes tão graves, considera-se mais importante defender a estrutura, a instituição. Agora é a partir da instituição que se diz: 'Chega!'. Até porque, muitas vezes, as famílias com filhos vítimas de sacerdotes não encontraram nos respectivos bispos a ajuda que esperavam. Tornavam-se vítimas duas vezes, acusadas de acusações falsas. Tudo isso é intolerável".
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O sacro processo contra a pedofilia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU