02 Junho 2015
“A religiosa virtuosa era e é incensada como eixo entre o mundo visível e invisível, mas tudo isto depois desemboca numa servidão doméstica e social... A situação piorou agora ainda mais por causa do aumento de pequenas fundações diocesanas, criadas por bispos e padres africanos sem carisma e espiritualidade particulares: só para ter mulheres ao seu serviço”.
O texto é de Gian Guido Vecchi, publicado pelo jornal Corriere della Sera, 30-05-2015. A tradução é de Benno Dischinger.
A Irmã Rita Mboshu Kongo, teóloga congolesa, conseguiu o doutorado em Teologia em Roma enquanto trabalhava como cozinheira no Colégio Capranica, o mais prestigioso seminário da capital. Hoje ensina na Universidade Urbaniana e colabora com “mulheres, igreja, mundo”: precisamente a edição mensal do L' Osservatore Romano, coordenado pela historiadora Lucetta Scaraffia, desde ontem organizou no Vaticano um seminário internacional sobre “A Igreja diante da condição das mulheres hoje”, que concluirá amanhã com a missa celebrada pelo secretário de Estado Pietro Parolin.
Irmã Rita intervirá hoje na Casina Pio IV, tocando um tema central: as mulheres reduzidas a servas na Igreja, à submissão. Foi Francisco quem repetiu que “é preciso ampliar os espaços de uma presença feminina mais incisiva” e as mulheres “estão levantando questões profundas que são enfrentadas”.
Irmã Rita, em seu relatório, percorre a “crise de identidade das religiosas africanas”. Na África, contrariamente a 35 mil padres e 3.500 missionários, as Irmãs são mais de 60 mil. No entanto, “a Igreja jamais tem se empenhado muito em sua formação”. Precisamente para ensinar às crianças. De resto, as bravas Irmãs “cozinham bem por amor a Jesus, limpam, remendam, acodem a prelados e anciãos...”. Nenhuma voz em capítulo, decisões “sempre já tomadas por outros”.
Quando bispos e padres “encerram o mandato ou morrem”, as irmãs usadas como servas ou auxiliares continuam “abandonadas a si mesmas”, revela Irmã Rita. “Algumas vezes vêm à Europa como missionárias nas dioceses”, mas “faltam projetos” e acontece que “acabem nas ruas, tornando-se pessoas sem morada fixa”.
Fala-se sem reticências, no encontro no Vaticano. Família, identidade feminina, violências. Em muitas regiões da Terra a Igreja representa para crianças e mulheres “a única rede de proteção e salvação” de exploração e estupros.
Mas, existem também as violências sexuais cometidas por sacerdotes sobre as religiosas. Irmã Rita retoma a denúncia de Lucetta Scaraffia no livro Papa Francisco e as mulheres, escrito com Giulia Galeotti: as Irmãs são consideradas mais “seguras” onde a Aids é pandêmica, padres que exploram sua “autoridade” exigindo favores sexuais.
Que futuro têm as religiosas? Irmã Rita conclui: “Só queremos ser respeitadas e ter os instrumentos para decidir e pensar”. Sua Congregação faz o serviço de cozinha no Capranica desde 1978. Ela contou ao mensal do Osservatore a relação de “confronto e apoio recíproco” com os outros doutorandos. Com uma diferença, notava Scaraffia: “Ela cozinhou para jovens seminaristas e sacerdotes que estavam percorrendo uma via de estudos semelhante ao seu, mas tinham todo o tempo à sua disposição para o estudo”.
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Aquelas irmãs usadas como servas e auxiliares, de Gian Guido Vecchi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU