Por: Jonas | 20 Agosto 2015
É “perigosa” a tendência de se “considerar a família um obstáculo, um peso, uma passividade para a produtividade do trabalho”. Durante a audiência geral, o papa Francisco denunciou o risco de que a organização do trabalho a tenha “como refém” ou, inclusive, obstaculize o seu caminho, porque neste caso “estamos certos de que a sociedade humana começou a trabalhar contra si mesma”. A gestão do trabalho, disse o Pontífice, “não pode ser deixada nas mãos de poucos ou descarregada sobre um mercado divinizado”.
A reportagem é de Iacopo Scaramuzzi, publicada por Religión Digital, 19-08-2015. A tradução é do Cepat.
O Papa, que havia dedicado a catequese da semana passada ao tema da “festa”, centrou-se, hoje, sobre o “trabalho”: “Ambos fazem parte do desenho do criador Deus, a festa e o trabalho”, disse. “De uma pessoa séria, honesta, a coisa mais bonita que se pode dizer é: “É um trabalhador”, é alguém que trabalha, é alguém que na comunidade não vive à custa dos outros. Há tantos argentinos hoje, que eu vi, e direi como nós dizemos ‘no vive de arriba’, entende-se? E de fato, o trabalho, em suas mil formas, a partir daquele espaço, cuida também do bem comum. E onde se aprende este estilo de vida laborioso? Antes de tudo, aprende-se na família: o pai e a mãe que trabalham pelo bem da família e da sociedade”.
Francisco citou o Evangelho, onde Jesus é definido como “filho do carpinteiro”, e uma expressão usada por São Paulo na Carta aos Tessalonicenses, “quem não trabalha, não deve comer” (“É uma bela receita para emagrecer”, brincou). “O compromisso do trabalho e a vida do espírito, na concepção cristã, em absoluto, não estão em oposição entre elas. É importante entender bem isto! Oração e trabalho podem e devem estar juntos, em harmonia, como ensina São Bento. A falta de trabalho prejudica o espírito, como a falta de oração prejudica também a atividade prática”.
“Trabalhar – repito, de mil modos – é próprio da pessoa humana. Exprime sua dignidade de ser criada à imagem de Deus. Por isso, diz-se que o trabalho é sagrado. E por isso a gestão do trabalho é uma grande responsabilidade humana e social, que não pode ser deixada nas mãos de poucos ou descarregada sobre um ‘mercado’ divinizado. Provocar uma queda nos postos de trabalho significa provocar um grave dano social. Eu – prosseguiu o Pontífice argentino, improvisando – entristeço-me quando vejo que não há trabalho, que há gente sem trabalho, que não encontra trabalho e que não tem a dignidade de levar o pão para casa e me alegro muito quando vejo que os governantes fazem muito esforço, trabalham, para encontrar postos de trabalho, para fazer com que todos tenham um trabalho. O trabalho é sagrado, o trabalho dá dignidade a uma família e devemos rezar para que não falte trabalho para nenhuma família”.
Em seguida, o Papa citou sua encíclica Laudato Si’ para ressaltar que a “beleza da terra e a dignidade do trabalho foram feitas para estar unidas. A terra se torna bela quando é trabalhada pelo homem, seguem juntas. Quando o trabalho se separa da aliança de Deus com o homem e a mulher, quando se separa de suas qualidades espirituais, quando – disse Francisco – é refém apenas da lógica da ganância e despreza os afetos da vida, a degradação da alma contamina tudo: também o ar, a água, a relva, a comida... A vida civil se corrompe e o hábitat se decompõe. E as consequências golpeiam, sobretudo, os mais pobres e as famílias mais pobres. A moderna organização do trabalho demonstra, às vezes, uma perigosa tendência a considerar a família um gravame, um peso, uma passividade para a produtividade do trabalho. Contudo, perguntemo-nos: qual produtividade? E para quem? A chamada ‘cidade inteligente’ é indubitavelmente rica de serviços e de organizações, mas, por exemplo, é frequentemente hostil às crianças e idosos. Às vezes, quem projeta está interessado na gestão da força – trabalho individual, para embutir e utilizar ou descartar segundo a conveniência econômica. A família é um grande lugar de prova. Quando a organização do trabalho a tem como refém, ou inclusive obstaculiza o seu caminho, então estamos certos de que a sociedade humana começou a trabalhar contra si mesma!”.
As famílias cristãs, concluiu o Pontífice argentino, “recebem desta conjuntura um grande desafio e uma grande missão. Elas colocam em jogo os fundamentos da criação de Deus: a identidade e o vínculo do homem e da mulher, a geração dos filhos, o trabalho que domestica a terra e torna o mundo habitável. A perda destes fundamentos é um assunto muito sério, e na casa comum já há muitas fissuras! A tarefa não é fácil. Às vezes, pode parecer às associações das famílias que são como Davi diante de Golias... porém, sabemos como acabou esse desafio! São necessárias fé e astúcia. Que Deus nos conceda acolher com alegria e esperança seu chamado, neste momento difícil de nossa história. O chamado ao trabalho para dar dignidade a si mesmo e à própria família”.
O Papa, concluindo a audiência, recordou a comunidade de Taizé, que nesses dias comemora o 75º aniversário de sua fundação e o 10º aniversário da morte do fundador, Irmão Roger.
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“As famílias não são um obstáculo para o sistema produtivo”, diz Francisco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU