11 Mai 2015
"Sempre me admira o modo pelo qual se tende a banalizar uma figura extraordinária como São Francisco, fazendo prevalecer o aspecto hagiográfico mais elementar: o amor pela natureza, o fato de falar com os passarinhos... Ao mesmo tempo, é incrível como a partir do estudo das suas relações com as hierarquias eclesiásticas, em particular com a Cúria papal pela questão da aprovação da Regra, emerge um São Francisco aprofundado. Uma pessoa que, mediante a fé, a sensibilidade humana, a humildade, a perseverança, a coerência cristã, a pobreza extrema, consegue superar todo obstáculo, trazendo para as suas posições papas e cardeais, com ideias e estilos de vida muito distantes dos dele."
A reportagem é de Roberto I. Zanini, publicada no jornal Avvenire, 07-05-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Maria Pia Alberzoni, professora de história medieval da Universidade Católica de Milão, há cerca de uma década, realiza estudos sobre as ordens mendicantes e os seus fundadores. Um trabalho do qual nasceu de Santa povertà e beata semplicità. Francesco d’Assisi e la Chiesa romana [Santa pobreza e beata simplicidade. Francisco de Assis e a Igreja Romana] (Ed. Vita e Pensiero, 308 páginas), livro que aprofunda a vasta documentação existente com os fatos e os personagens que a unem, restituindo-nos o retrato do Pobrezinho na sua complexidade.
Eis a entrevista.
Mas a popularidade de tantos santos está ligada precisamente à hagiografia.
Há hagiografias muito boas, mas, muitas vezes, incorre-se no defeito de relatar o personagem em função da santidade, desvinculando os episódios das referências e dos conteúdos históricos.
Tem um exemplo significativo a esse respeito?
O ministro geral dos Frades Menores, Girolamo Masci, quando se tornou o primeiro papa franciscano com o nome de Nicolau IV (1288-1292), fez com que se acrescentasse a uma biografia do fundador um episódio, que lhe havia sido relatado, sobre o encontro entre o santo e Inocêncio III: Francisco chega, o papa comenta que tal mendigo deveria apenas rolar entre os porcos. Ele executa isso e se reapresenta. Inocêncio fica impressionado e, depois de fazê-lo lavar, ouve-o. Tudo isso para evidenciar a santidade diante da arrogância do poder e sem nenhuma certeza sobre o acontecido. Mas, quando se encontra com Inocêncio, Francisco não tem a auréola, é considerado excêntrico e pede algo que, para as normas da época, não é possível ter.
Refere-se à aprovação do estilo de vida dele e dos seus irmãos?
Exato. Há alguns anos, a Cúria papal decidiu que todas as formas de vida religiosa nascentes deveriam adotar ou a Regra de Santo Agostinho ou a de Bento. E é justamente o que é proposto a Francisco, que rejeita. Para que nos entendamos: a uma proposta semelhante, alguns anos depois, em 1215, São Domingos aceita aderir à Regra agostiniana. Depois, quando Francisco vai ao encontro de Inocêncio, ele é um dos tantos representantes de grupos religiosos que, naquele momento, pedem para ser reconhecidos. Além disso, o papa recém resolveu o caso dos valdenses de Durando d'Osca, que, depois da morte de Valdo, tinham decidido retornar para a Igreja de Roma. E outros grupos valdenses estavam batendo na sua porta.
E, com Francisco, como ele faz?
Na realidade, ele se mostra compreensivo. Entende as motivações espirituais do homem, mas não na forma de vida comum que ele adota com os seus irmãos: eles não têm conventos, estão pelas estradas e, muitas vezes, se adaptam como hóspedes de quem os acolhe. No fundo, Francisco, embora manso e humilde, era uma espécie de aventureiro sem-teto, muito distante da idealidade monástica. Assim, Inocêncio concedeu uma aprovação genérica daquele estilo de vida fraterna e itinerante, atestando que não eram hereges, mas católicos para todos os efeitos. Assim, ele convida Francisco a voltar quando os seus irmãos fossem mais numerosos.
Francisco, porém, não se adapta.
Não, mas, na realidade, ele compreende que deve escrever uma verdadeira regra só no retorno do Oriente, no verão de 1220. Naquele ponto, torna-se fundamental o encontro com o cardeal Hugo de Ostia.
Diz-se que ele o escolheu.
Aqui também a hagiografia doura a história. É mais provável que lhe tenha sido imposto. O fato é que, justamente graças ao cardeal Hugo (ele reescreve a chamada "Regra não bulada", que havia sido rejeitada em 1221), Francisco consegue obter de Honório III a aprovação da Regra, embora, na realidade, Honório não escreve "aprovo", mas usa uma fórmula com a qual diz se conformar à regra aprovada pelo seu antecessor, embora Inocêncio só tivesse aprovado um "estilo de vida". Mas o que importa para entender Francisco é que ele compromete toda a vida para alcançar esse objetivo, convencido de que tem que fazer o que o próprio Jesus lhe dissera naquela que ele chama de Revelação do Altíssimo.
Um homem obstinado e capaz de pôr tudo em jogo.
Sim. E o episódio resolutivo ocorre com Hugo de Ostia, que havia sido solicitado pelos coirmãos de Francisco a fazer com que o fundador pensasse para levá-lo a comportamentos mais razoáveis. Francisco se apresenta no capítulo geral com o cardeal e, surpreendendo a todos, afirma: "Meus irmãos, o Senhor me revelou que eu devo ser um novo louco no mundo". Em um só golpe, passa a ideia de que o pedido de uma nova regra vem do Senhor, colocando em xeque D'Ostia e a rixa interna. Não só: naquele mesmo instante, ele consegue curar o grande "drama" da sua vida: obedecer à Revelação do Altíssimo e obedecer à Igreja. Ele sofre para manter juntas essas duas obediências e, no fim, consegue, afirmando a verdade perante todos.
Uma humildade obstinada que convence até o papa.
Sim. Porque todos entendem que ele não quer afirmar uma ideia própria. Ele é só um instrumento nas mãos do Altíssimo. Hugo de Ostia pensa diferente, mas dá configuração jurídica à ideia de "fraternitas" que vem da Revelação. Com a mesma humildade obstinada, Francisco também obtém outro objetivo, provavelmente ligado também à Revelação...
Qual e por que "provavelmente"?
Até a aprovação da Regra, não há uma verdadeira hierarquia na Ordem. Francisco reitera que quer ser apenas um simples irmão. Ao contrário, Hugo de Ostia gostaria de pô-lo no comando. Depois de se tornar Gregório IX, ele o faz escrever claramente na sua vida oficial redigida em 1240 (ele morreu em 1241): "O cardeal Hugo cuidou dos Frades Menores, deu forma ao que era informe e pôs à frente Francisco". Na realidade, Francisco foi inflexível na recusa, e é lícito pensar que isso também fazia parte da Revelação do Altíssimo, mesmo que ele nunca tenha dito isso: "Depois que o Senhor me deu irmãos, ninguém me mostrava o que eu devia fazer, mas o próprio Altíssimo mo revelou...". E o cardeal Hugo, com a morte de Francisco, encontrou a mesma obstinação em Santa Clara. Ele vai ao seu encontro em São Damião, tenta convencê-la a escolher uma regra diferente, mas ela responde que não quer ser exonerada do seguimento de Cristo segundo a Revelação tida por Francisco.
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Pobreza: como Francisco de Assis venceu a Cúria. Entrevista com Maria Pia Alberzoni - Instituto Humanitas Unisinos - IHU