30 Julho 2008
A pesquisadora Naira Maria Balzaretti olha a nanociência pensando nas pesquisas que estão sendo feitas nesta área. “Eu não chego a pensa num futuro pós-humano. Para mim, a nanotecnologia envolve questões bem práticas, não envolvendo nada muito futurista. Pois estamos trabalhando com os mesmos materiais e temos controle sobre eles também em escala nano. Ou seja, não existe nada muito diferente do que se tem hoje, apenas um controle, uma capacidade de eficiência, de usar menos material para ter o mesmo desempenho e menor consumo de energia”, relatou a professora, em entrevista concedida por telefone à IHU On-Line.
Naira analisa as nanotecnologias a partir do que está sendo feito hoje no Brasil, em termos de pesquisa. Assim, ela vê que essa nova ciência é trabalhada com o mesmo tipo de controle que é feito em outras áreas e pesquisas. “Claro que as nanotecnologias podem ser usadas para o ‘mal’ também, mas eu prefiro olhá-las sob o aspecto positivo”, afirmou.
Naira Maria Balzaretti é graduada em Física, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), onde realizou o mestrado e o doutorado na mesma área. É pós-doutora pelo National Institute of Standards and Technology, nos Estados Unidos. Atualmente, é professora da UFRGS e é diretora do Centro de Nanociência e Nanotecnologia da universidade.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Para a senhora, os debates acerca do desenvolvimento das nanotecnologias estão em que patamar, hoje?
Naira Maria Balzaretti – O governo está fazendo mesas de estudo, em nível nacional, convidando profissionais das universidades e das empresas. Esses debates tratam do planejamento estratégico do governo para o período de 2008 a 2025, pois as nanotecnologias estão na agenda do PAC. Nas universidades, os debates são mais restritos porque trabalham por disciplinas. Em razão de a nanociência e nanotecnologia implicarem na interdisciplinaridade, os seus temas entram um pouco enviesados no contexto das universidades. São necessários, então, eventualmente, alguns centros específicos para que o debate seja mais efetivo. Foi com esse objetivo que criamos o Centro de Nanociência e Nanotecnologia na UFRGS: para tentar congregar pesquisadores que desenvolvem, em suas unidades, trabalhos em nanociência e nanotecnologia, realizando-se ações em parceria. Na Universidade do ABC, há um curso específico, ou seja, que forma, na graduação, a partir desse viés interdisciplinar. Esse é um assunto incipiente, porque no Brasil, em geral, a interdisciplinaridade é um pouco deficiente.
IHU On-Line – Como a senhora analisa as discussões acerca do limite da ética no desenvolvimento das nanotecnologias?
Naira Maria Balzaretti – Isso precisa, necessariamente, ocorrer em paralelo. As nanotecnologias são uma coisa nova, e estamos no limite de uma nova era de manipular matéria a nível atômico, de construir novos dispositivos, de tirar proveito de todo esse contexto. Precisamos tomar esse caminho de uma maneira muito consciente, inserindo nele sempre a ética. Mesmo as pesquisas acadêmicas envolvendo as nanotecnologias precisam se preocupar com a ética.
IHU On-Line – Qual é o valor das nanotecnologias para a sociedade?
Naira Maria Balzaretti – Hoje em dia já existe uma categorização, ou seja, já podemos classificar as ações de nanotecnologias em nanomateriais, que incluem nanocompósitos, nano-objetos, revestimentos, nanodispositivos, que podem ter propriedades diferenciadas pela sua dimensão. Isso tem impacto nos setores automotivo, de couro, calçado, celulose, no meio ambiente, na saúde etc. Há a parte de nanoeletrônica com a construção de dispositivos de memória, processadores, sensores etc.; a parte nanofotônica, com displays, leds, com impacto na área de energia, saúde, automação; a parte de nanobiotecnologia, que envolve saúde, medicina, medicamentos, cosméticos, fármacos, higiene etc; e a parte de nanoenergia e nanoambiente. Essas áreas já estão sendo atingidas pela nanociência e já traz impactos positivos com todo o controle que se deve ter.
IHU On-Line – Como a senhora relaciona as nanotecnologias com o futuro pós-humano?
Naira Maria Balzaretti – Eu não chego a pensar num futuro pós-humano. Para mim, a nanotecnologia envolve questões bem práticas, não envolvendo nada muito futurista. Pois estamos trabalhando com os mesmos materiais e temos controle sobre eles também em escala nano. Ou seja, não existe nada muito diferente do que se tem hoje, apenas um controle, uma capacidade de eficiência, de usar menos material para se obter o mesmo desempenho e menor consumo de energia. São coisas mais práticas. Na área de saúde humana, eventualmente irá se precisar de menos remédios e se conseguirá mais eficiência. Eu sempre penso na otimização do que temos atualmente, e não em nada diferente, ou, como disse, muito futurista. Não é nesse espírito que eu vejo a nanotecnologia.
IHU On-Line – Que tipo de impacto podemos esperar que as nanotecnologias causem nas sociedades marginalizadas?
Naira Maria Balzaretti – Como, a princípio, conseguiremos materiais mais eficientes, eu acredito que no futuro essas pessoas serão beneficiadas com tecnologias mais simples, baratas e eficientes. De alguma maneira, todo mundo será beneficiado com remédios, tratamento e energia mais eficientes. Obviamente, não é uma tecnologia restrita para uma determinada classe social.
IHU On-Line – Qual é o panorama atual acerca das pesquisas sobre nanotecnologias no Brasil?
Naira Maria Balzaretti – Acredito que ela esteja sendo feita majoritariamente em grandes universidades, nos centros de estudos, e em algumas empresas que patrocinam esse tipo de pesquisa. As empresas de fármacos e cosméticos são as principais, pois têm utilizado os resultados dessas pesquisas. Além disso, a Petrobras, entre outras empresas, também as tem utilizado, investindo na área. O tema também está na agenda do governo. Assim, de modo geral, há um estímulo por parte do governo e das universidades.
IHU On-Line – Podemos dizer que estamos nos encaminhando para algo maior com o desenvolvimento das nanotecnologias?
Naira Maria Balzaretti – É um contra-senso, porque estamos trabalhando numa escala muito menor (risos). Mas eu acredito que seria uma boa nova situação para aproveitar o átomo da matéria. Isso nos deixa numa situação privilegiada! Claro que as nanotecnologias podem ser usadas para o “mal” também, mas eu prefiro olhá-las sob o aspecto positivo.
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"A nanotecnologia envolve questões bem práticas". Entrevista especial com Naira Maria Balzaretti - Instituto Humanitas Unisinos - IHU