14 Novembro 2025
Bispos católicos dos EUA votaram na quarta-feira para oficializar a proibição de tratamentos de transição de gênero para pacientes transgêneros em hospitais católicos. A medida formaliza um processo de anos da Igreja nos EUA para abordar a questão da saúde de pessoas transgênero.
A reportagem é de Tiffany Stanley, publicada por Crux, 13-11-2025.
Em um salão de baile de um hotel em Baltimore, os bispos aprovaram, por ampla maioria, revisões em suas diretrizes éticas e religiosas que orientam os milhares de instituições e profissionais de saúde católicos do país.
Segundo a Associação Católica de Saúde, mais de um em cada sete pacientes nos EUA recebe tratamento diário em hospitais católicos. Em algumas comunidades, os hospitais católicos são o único centro médico disponível.
Os principais grupos médicos e organizações de saúde apoiam o atendimento de transição de gênero para pacientes transgêneros.
A maioria das instituições de saúde católicas adotou uma abordagem conservadora e não ofereceu atendimento para transição de gênero, que pode envolver tratamentos hormonais, psicológicos e cirúrgicos. As novas diretrizes formalizarão essa determinação. Os bispos terão autonomia para transformar as diretrizes em lei para suas dioceses.
“No que diz respeito à ideologia de gênero, acho muito importante que a Igreja faça uma declaração firme a esse respeito”, disse D. Robert Barron, bispo da diocese de Winona-Rochester, em Minnesota, durante a discussão pública das diretrizes revisadas.
A Associação Católica de Saúde agradeceu aos bispos por incorporarem grande parte do feedback da organização às diretrizes. Em comunicado, afirmou: “Os profissionais de saúde católicos continuarão a acolher aqueles que buscam atendimento médico conosco e se identificam como transgênero. Continuaremos a tratar essas pessoas com dignidade e respeito, o que está em consonância com a doutrina social católica e com nossa obrigação moral de servir a todos, especialmente aos marginalizados.”
As novas diretrizes incorporam documentos anteriores sobre identidade de gênero do Vaticano, de 2024, e dos bispos dos EUA, de 2023.
Na nota doutrinal de 2023, intitulada “Limites Morais à Manipulação Tecnológica do Corpo Humano”, os bispos especificaram: “Os serviços de saúde católicos não devem realizar intervenções, sejam cirúrgicas ou químicas, que visem transformar as características sexuais de um corpo humano nas do sexo oposto, nem participar do desenvolvimento de tais procedimentos”.
Vozes religiosas progressistas respondem
A Igreja Católica não é monolítica quando se trata dos direitos das pessoas transgênero. Algumas paróquias e padres acolhem católicos trans, enquanto outros não são tão receptivos.
“O ensinamento católico defende a dignidade inestimável de toda vida humana e, para muitas pessoas trans, o acompanhamento da transição de gênero é o que torna a vida suportável”, disse Michael Sennett, um homem trans ativo em sua paróquia em Massachusetts.
Sennett faz parte do conselho da New Ways Ministry, que defende a inclusão LGBTQ+ na Igreja Católica. Em 2024, o grupo organizou um encontro com o Papa Francisco para discutir a necessidade de apoio a pessoas em transição de gênero.
O diretor executivo do New Ways Ministry, Francis DeBernardo, afirmou que, para muitos católicos transgêneros que ele conhece, “o processo de transição não foi apenas uma necessidade biológica, mas um imperativo espiritual. Se eles quisessem viver como pessoas autênticas, da maneira como acreditam que Deus os criou, então a transição se tornaria algo necessário”.
No mesmo dia em que bispos católicos dos EUA discutiam identidade de gênero, os líderes de várias denominações religiosas progressistas importantes emitiram uma declaração em apoio a pessoas transgênero, intersexuais e não binárias, em um momento em que muitas legislaturas estaduais e o governo Trump estão restringindo seus direitos.
Entre os 10 signatários estavam os líderes da Associação Unitária Universalista, da Igreja Episcopal, da União para o Judaísmo Reformista e da Igreja Presbiteriana (EUA).
“Num momento em que o nosso país coloca as suas vidas sob ameaça cada vez mais grave, persiste a ideia errada e vergonhosa de que nem todas as pessoas de fé defendem a diversidade de gênero – muitas de nós defendemos. Que fique claro, em vez disso, que os nossos entes queridos foram criados à imagem de Deus – santos e íntegros”, afirmaram os líderes religiosos num comunicado.
Bispos dos EUA unidos em sua preocupação com os imigrantes
Os bispos católicos, ao encerrarem sua conferência em Baltimore, aprovaram por ampla maioria uma “mensagem especial” sobre imigração na quarta-feira. Declarações pastorais desse tipo são raras; a última havia sido em 2013, em resposta à exigência do governo Obama de que as seguradoras oferecessem cobertura para contraceptivos.
Líderes católicos criticaram individualmente a repressão à imigração promovida pelo governo Trump. O medo da fiscalização imigratória diminuiu a frequência às missas em algumas paróquias. Clérigos locais estão lutando para administrar os sacramentos a imigrantes detidos.
“Estamos perturbados ao vermos, entre nosso povo, um clima de medo e ansiedade em torno de questões de perfilamento racial e aplicação das leis de imigração”, diz a declaração dos bispos. “Estamos tristes com o estado do debate atual e com a difamação dos imigrantes. Estamos preocupados com as condições nos centros de detenção e com a falta de acesso à assistência pastoral.”
Em uma demonstração de unidade, vários bispos se levantaram para falar a favor da declaração durante a discussão final da tarde, incluindo o arcebispo de Oklahoma City, D. Paul Coakley, o recém-eleito presidente da conferência.
“Sou totalmente a favor disso, pelo bem de nossos irmãos e irmãs imigrantes, mas também para encontrarmos um bom equilíbrio”, disse Coakley, observando que eles apelam “aos nossos legisladores e à nossa administração para que nos ofereçam um caminho significativo de reforma do nosso sistema de imigração”.
O cardeal-arcebispo de Chicago, D. Blase Cupich, dirigiu-se ao microfone para recomendar uma linguagem mais incisiva em relação à deportação em massa. "Esse parece ser o principal problema que enfrentamos com nosso povo neste momento", disse ele.
Seus irmãos bispos concordaram. O texto atualizado agora afirma que os bispos católicos dos EUA “se opõem à deportação em massa indiscriminada de pessoas”.
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