23 Novembro 2024
“Os carismas, dons do Espírito para o uso comum” (1 Cor 12,4-7,11) é o tema da catequese. “Não há cristãos de segunda categoria, cada um tem seu próprio carisma. Que é um dom comum e não deve ser identificado com dotes e capacidades espetaculares”.
O texto da catequese é do Papa Francisco, publicado por Avvenire, 21-11-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Caros irmãos e irmãs, bom dia! Nas últimas três catequeses, falamos sobre a obra santificadora do Espírito Santo, que se concretiza nos sacramentos, na oração e seguindo o exemplo da Mãe de Deus. Mas ouçamos o que diz um famoso texto do Vaticano II: “O Espírito Santo não só santifica e conduz o Povo de Deus por meio dos sacramentos e ministérios e o adorna com virtudes, mas ‘distribuindo a cada um os seus dons como lhe apraz’ (cf. 1 Cor 12,11)” (Lumen Gentium, 12). Nós também temos dons pessoais que o próprio Espírito concede a cada um de nós.
Chegou o momento, portanto, de falar também desse segundo modo de atuação do Espírito Santo, que é a ação carismática. Uma palavra um tanto difícil, vou explicar. Dois elementos ajudam a definir o que é carisma. Primeiro, o carisma é o dom dado “para o uso comum” (1Cor 12,7), para ser útil a todos. Em outras palavras, não é primariamente e normalmente destinado à santificação da pessoa, mas ao serviço da comunidade (cf. 1Pd 4,10). Esse é o primeiro aspecto.
Segundo, o carisma é o dom dado “a um”, ou “a alguns” em particular, não a todos da mesma maneira, e é isso que o distingue da graça santificante, das virtudes teologais e dos sacramentos, que são, ao contrário, iguais e comuns a todos. O carisma é concedido a uma pessoa ou a uma comunidade específica.
É um dom que Deus dá.
O Concílio também nos explica isso. O Espírito Santo - diz ele - “distribui também graças especiais entre os fiéis de todas as classes, as quais os tornam aptos e dispostos a tomar diversas obras e encargos, proveitosos para a renovação e cada vez mais ampla edificação da Igreja, segundo aquelas palavras: ‘a cada qual se concede a manifestação do Espírito em ordem ao bem comum’ (1 Cor. 12,7)”. Os carismas são os “enfeites”, ou os ornamentos, que o Espírito Santo distribui para embelezar a Esposa de Cristo. Assim, pode-se entender por que o texto conciliar termina com a seguinte exortação. “E esses carismas, quer sejam os mais elevados, quer também os mais simples e comuns, devem ser recebidos com ação de graças e consolação” (Lumen Gentium, 12).
Bento XVI afirmou: “Quem olha para a história da época pós-conciliar pode reconhecer a dinâmica da verdadeira renovação, que muitas vezes assumiu formas inesperadas em movimentos cheios de vida e que torna quase tangível a inesgotável vivacidade da santa Igreja”. E esse é o carisma dado a um grupo, por meio de uma pessoa.
Devemos redescobrir os carismas, porque isso faz com que a promoção do laicato, e da mulher em particular, seja entendida não apenas como um fato institucional e sociológico, mas em sua dimensão bíblica e espiritual. Os leigos não são os últimos, não, os leigos não são uma espécie de colaboradores externos ou “tropas auxiliares” do clero, não! Eles têm seus próprios carismas e dons com os quais podem contribuir para a missão da Igreja. Vamos acrescentar mais uma coisa: quando se fala de carismas, é preciso imediatamente desfazer um equívoco: o de identificá-los com dotes e capacidades espetaculares e extraordinários; em vez disso, são dons comuns - cada um de nós tem seu próprio carisma - que adquirem valor extraordinário quando inspirados pelo Espírito Santo e encarnados nas situações da vida com amor. Essa interpretação do carisma é importante, porque muitos cristãos, ao ouvirem falar de carismas, sentem tristeza ou decepção porque estão convencidos de que não possuem nenhum e se sentem excluídos ou cristãos de segunda classe. Não, não existem cristãos de segunda classe, não, todos têm seu próprio carisma pessoal e também comunitário. Santo Agostinho respondia a isso já em sua época com uma comparação muito eloquente: “Se você ama”, dizia ele a seu povo, “o que você possui, não é pouco. Se, de fato, você ama a unidade, tudo o que nela é possuído por alguém, você também o possui! Somente o olho, no corpo, tem a faculdade de ver; mas é somente para si só que o olho vê? Não, ele vê pela mão, pelo pé e por todos os membros” (Santo Agostinho, Tratados sobre João, 32,8). Aqui está revelado o segredo pelo qual a caridade é definida pelo Apóstolo como “o melhor caminho de todos” (1Cor 12,31): ela me faz amar a Igreja, ou a comunidade em que vivo e, na unidade, todos os carismas, não apenas alguns, são “meus”, assim como os “meus” carismas, mesmo que pareçam pouca coisa, pertencem a todos e para o bem de todos. A caridade multiplica os carismas: faz com que o carisma de um, de uma pessoa, seja o carisma de todos. Obrigado!
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O Papa: “Os leigos não são tropas auxiliares. Eles têm seus próprios carismas, para o bem de todos” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU