04 Mai 2016
"Eu confessei ao papa os meus pecados, e ele nem me deu a penitência. Um momento doce, nada inquisitório." Isso aconteceu há uma semana, na Praça de São Pedro: uma escoteira de 15 anos, admitida na presença do Papa Francisco, soube relatar o inesperado colóquio com o pontífice como ato de escuta e não de juízo.
A reportagem é de Simonetta Fiori, publicada no jornal La Repubblica, 03-05-2016. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O acaso quis – mas talvez não seja apenas um acaso – que, justamente nestes dias, estivesse sendo publicado pela editora Einaudi um belíssimo livro de Adriano Prosperi sobre os primeiros jesuítas entre os séculos XVI e XVII (La vocazione). E um capítulo importante dessas histórias de iniciação é dedicado à confissão.
É o único ponto em que o historiador faz uma referência explícita ao Papa Francisco, artífice, em 2013, da canonização do sacerdote jesuíta Pedro Fabro. "Foi uma escolha mirada", conta Prosperi no seu estúdio de Pisa. "Fabro fazia parte do grupo de mediadores que, em 1541, foram falar com os luteranos em Regensburg. Bastante indiferente às questões teológicas, ele anotou no seu 'memorial' como devia ser o modo mais correto para se aproximar dos hereges: mostrar-lhes muito amor, também mediante a confissão de que era uma conversa amigável. Desse modo, segundo Fabro, eles conseguiriam convencer o próprio Lutero a se arrepender e a retomar o hábito religioso".
Na figura do confessor, assomam-se duas imagens: o juiz e o médico. "O juiz passa em revista os pecados e pronuncia a sentença; o médico se põe à escuta e cura as feridas. É esse segundo aspecto que os jesuítas sempre cultivaram no exercício da confissão."
É difícil ler o novo ensaio de Prosperi sem pensar no líder mundial mais influente que surgiu da Companhia de Jesus. Uma figura que nunca é nomeada – senão em nota –, mas que continua no pano de fundo, até porque o historiador alonga a sua lente sobre o processo de formação da segunda geração dos jesuítas: não tanto os companheiros de Inácio de Loyola, mais estudados e conhecidos, mas "a geração daqueles que descobriram a ordem quando ela começava a se expandir na Itália, Espanha e no resto da Europa católica e alongava a sua projeção para as fronteiras orientais das terras conhecidas".
Um percurso reconstruído através das "relatórios autobiográficos" impostos aos jesuítas a partir de cima com um duplo objetivo: o relato de uso interno e externo da vocação e o chamado constante ao momento da escolha de obediência absoluta a uma força superior. E é essa a passagem mais dilacerante sobre a qual jogam luz as "vocationes", o arrancamento da família natural para entrar na espiritual representada pela Companhia de Jesus. Uma rebelião ao pai carnal em nome da obediência a outro pai, que muitas vezes despertava uma "tempestade de parentes", prenúncio de grandes aventuras e peripécias.
As histórias recolhidas por Prosperi narram sobre pais hostis e às vezes até violentos, de mães desesperadas, de parentes poderosíssimos que se esforçam de mil maneiras para evitar o afastamento do menino.
"Para os noviços, tratava-se de um renascimento, de uma nova vida que cortava radicalmente as pontes com a anterior", explica o historiador. "E era necessário renovar constantemente a sua recordação, também para confirmar uma escolha que devia ser irrevogável."
Só assim era possível cultivar uma disciplina interior a ponto de enfrentar as tentações do pecado. "E só desse modo, renovando o pacto de fidelidade à nova família, os jesuítas podiam ir sozinhos ao mundo, como Matteo Ricci na solidão da imensa extensão chinesa."
Existem elementos recorrentes – nesse romance de formação dos jesuíta – que ajudam a entender mais a figura do Papa Francisco? "Uma característica que distingue a ordem fundada por Inácio é a abertura sem limites ao diferente religioso", responde Prosperi.
"E, acima de tudo, a disponibilidade para perceber nos comportamentos uma religiosidade difusa, mesmo que não expressamente manifesta. Penso em Francisco Xavier, que, tendo desembarcou no Japão, disse aos estudantes universitários europeus: corram, porque aqui se trata de revelar a este povo que eles são cristãos, mesmo que não saibam. Entendemo-nos: eram tempos de guerra religiosa, e os jesuítas também tiveram que ir fortemente contra os inimigos hereges. Mas, no fundo, permaneceu essa convicção de que, com base em preceitos morais simples, era possível se encontrar. Era preciso escutar os outros. E, como dizia Inácio, era preciso 'entrar com o outro e sair consigo mesmo': um lema que evoca o ritual da luta japonesa, um cedimento aparente que permite que você abrace o seu interlocutor para levá-lo para o seu lado."
Para aqueles que vagueiam nos arredores da Reforma e da Contrarreforma – Prosperi é um dos principais especialistas – é impossível não se deparar com a Companhia de Jesus. Mas o livro também nasce de uma necessidade: a de libertar os jesuítas do espesso véu de lugares comuns que resiste ao tempo.
"Poucos estereótipos se implantaram na linguagem comum deixando marcas tão tenazes", comenta Prosperi. "Para melhor ou para pior, na apologia e na acusação de encarnar um poder secreto, responsável pelas páginas mais obscuras." Jesuitismo como sinônimo de hipocrisia ou dissimulação nefasta igual ao maquiavelismo.
O estudioso escolhe outro caminho que o leva a representá-los como "uma elite de militantes devotados à obediência absoluta". Mas essa atitude acaba chamando outra analogia inválida no século passado e ainda resistente: a aproximação aos revolucionários do século XX.
"Foi Sabina Pavone que me fez notar que Emmanuel Carrère, em O Reino, atribui a Pjatakov a frase: 'Se o partido assim o requiser, um verdadeiro bolchevique está disposto a acreditar que o preto é branco, e o branco, preto'. Na realidade, era uma das regras de Inácio de Loyola."
E também a prática da autocrítica é vista como elemento comum a jesuítas e comunistas na construção do homem novo. Outro aspecto valorizado por La vocazione é a invenção dos Colégios, "lugares de alta educação para jovens de boas famílias".
Em 1750, havia 500 colégios jesuítas na Europa, outros 250 no mundo. E a qualidade da sua obra educativa também era celebrada pelos não católicos. "Mas, na origem, havia uma exigência fundamental: a de selecionar as novas levas jesuíticas, dotadas de forte convicção e de meios intelectuais adequados".
Ser jovem é uma promessa extraordinária. E os jesuítas foram os primeiros a ter consciência disso. "Eles souberam reconhecer o tesouro escondido na plasticidade das jovens e muitas vezes muito jovens inteligências, interceptando a necessidade de saber que vinha de toda a sociedade. Foi o ás jogado por Inácio no século que descobria a escola."
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História dos jesuítas: muito diálogo e pouco jesuitismo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU