08 Fevereiro 2016
"O Santo Padre pede-lhe para parar a greve de fome. Ele leu a sua carta, ficou impressionado e acompanhará pessoalmente o caso." São as palavras que Dom Giovanni Angelo Becciu, subsecretário para os Assuntos Gerais do Vaticano, pronunciou no dia 29 de janeiro para Sergio Cavaliere, o advogado de Diego (nome fictício), suposta vítima de abusos sexuais por parte de um padre da diocese de Nápoles, na Itália.
A reportagem é de Antonio Crispino, publicada no jornal Corriere della Sera, 30-01-2016. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Diego estava em greve de fome desde o dia 18 de janeiro, depois de denunciar repetidamente as violências sofridas desde que era adolescente. "Eu não tinha outra escolha", conta-nos ele, que agora tem 40 anos. "Desde 2010 eu peço para que se faça justiça sobre esse caso."
Os atos denunciados remontam a quanto Diego tinha 13 anos e era aluno da oitava série. Seu professor de religião era o Pe. Silverio Mura. "Ele me convidou para ir à sua casa depois da aula", conta. "A minha família estava muito feliz, porque era muito católica, venerava aquele padre. Quando eu cheguei, ele fechou as persianas, me fez sentar em um sofá e começou a me beijar na boca. Àquele encontro, seguiram-se outros, por ao menos dois anos. Os avanços se transformaram em relações sexuais por ao menos dois anos. Começaram pedidos estranhos, aos quais ele sempre encontrava uma desculpa. Ele também tinha muitas perversões."
Ele conta muitos detalhes íntimos: "Ele tem um defeito físico que só quem teve relações sexuais com ele pode conhecer." Sobre esses encontros, Diego não fala com ninguém, sente-se culpado, censura-se por não ter tido forças para se opor.
"Aos 16 anos, eu lhe disse que aqueles encontros me faziam me sentir mal, que eu queria ir ao médico. Como resposta, ele me levou para comprar uma scooter, dizendo-me que assim eu me distrairia e não pensaria mais no que tinha acontecido."
Ele foi forçado a revelar tudo alguns anos depois. Ele sentiu um mal-estar enquanto trabalhava como segurança. Depois de uma longa peregrinação entre médicos e especialistas, foi dirigido a um psicoterapeuta.
"Foram necessários oito meses para lhe tirar a verdade", conta o doutor Alfonso Rossi. "Nas primeiras sessões, ele estava taciturno e introvertido. Falar da esfera íntima significava provocar nele um vômito violento. Quando eu entendi do que se tratava, eu o levei a fazer a denúncia, era o único modo para fazê-lo se sentir melhor."
A primeira carta à Cúria napolitana foi enviada pela mãe de Diego, em 2010. Poucos dias depois, ouviram alguém bater na porta. "Dois rapazes nos entregam um envelope e foram embora. Dentro, havia 250 euros", lembra a esposa de Diego, com a qual ele teve três filhos.
Há momentos em que o relato de Diego se interrompe abruptamente, começam os soluços e a gagueira. Ele fica roxo de raiva quando recorda o dia do casamento. Ele abre o computador e nos mostra uma fotografia: no centro, está o padre Silverio, que abraça a sua esposa, sorrindo, e o segura pelo braço. Que é o único que não está rindo. Tem um rosto fúnebre.
"A minha mãe quis a todo o custo que quem me casasse fosse aquele padre. Eu não podia dizer nada. Sentia que ia morrer." Depois do mal-estar, a família se dirigiu à rede L'Abuso (que nasceu da ideia de um grupo de pessoas abusadas por sacerdotes), cujo presidente é Francesco Zanardi, que, com o advogado Cavaliere, tentaram afastar a prescrição em sede cível (a penal já passou do prazo).
Enviaram uma nova carta ao cardeal Crescenzio Sepe, mas também à escola onde o Pe. Silverio Mura trabalha como professor de religião e ao Ministério da Educação. "Mesmo sabendo do que ele era acusado, mandaram o padre ensinar em uma escola média de Volla, com crianças de 10 anos."
Só no fim de 2014 é que convocaram Diego para uma audiência perante a Congregação para a Doutrina da Fé, presidida pelo cardeal Gerhard Ludwig Müller. Enquanto isso, ele tinha ameaçado se matar com a sua pistola de trabalho. Tudo o que ele obteve foi a retirada do porte de armas e a perda do emprego.
Um ano depois, em outubro de 2015, a família recebeu a proposta de fazer com que Diego fosse visitado por um psicólogo de confiança da diocese. "O objetivo era claramente o de fazer com que ele fosse declarado louco e encerrar o caso. Nós nos recusamos", responde o doutor Rossi.
Do Pe. Silverio, ao contrário, perdeu-se o rastro. A Cúria o tirou da paróquia, mas, no site da diocese, ele ainda está entre os sacerdotes em serviço. Antes de desaparecer totalmente, Diego tentou um encontro com o padre. Ele o gravou, enquanto contava o seu desconforto. "Esse encontro me fez entender que era inútil permanecer discreto, e é por isso que hoje eu decidi contar a história em todos os seus detalhes."
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Papa envia mensagem a homem que denuncia abusos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU