01 Dezembro 2015
Alguns dias antes da abertura da COP-21, várias buscas e prisões domiciliares foram feitas contra ativistas de ocupações e ambientalistas em toda a França. Segundo informações obtidas pelo "Le Monde", nos dias 25 e 26 de novembro pelo menos seis pessoas foram colocadas sob prisão domiciliar em Rennes, bem como um membro da equipe jurídica da Coalizão Climat21, que reúne 130 associações, ONGs e sindicatos. Buscas foram feitas em Ivrey-sur-Seine (Val-de-Marne) e em fazendas orgânicas de Dordogne.
A reportagem é de Laurent Borredon e Adrien Pécout, publicada por Portal Uol, 01-12-2015.
As ordens de prisão domiciliar que o "Le Monde" pôde consultar terminam no dia 12 de dezembro, ou seja, um dia após o fim da conferência sobre o clima. Elas visam claramente os eventuais movimentos reivindicativos que possam cercar o evento.
"Palavras de ordem circularam para convocar ações violentas", afirmam os decretos, que dizem ainda que "a forte mobilização das forças de segurança para combater a ameaça terrorista não poderia ser desviada para atender aos riscos de ordem pública ligados a tais manifestações". A lei sobre o estado de emergência autoriza a prisão domiciliar de uma pessoa caso existam "razões sérias para pensar que seu comportamento constitui uma ameaça para a segurança e a ordem públicas".
Os eventuais excessos da grande Marcha Mundial pelo Clima programada para 29 de novembro já vinham preocupando o governo há semanas. Por fim ela foi proibida em decorrência dos atentados de 13 de novembro. Embora os organizadores tenham previsto modos alternativos de expressão, diversas associações e coletivos não desistiram. Na terça-feira passada (24), vários intelectuais lançaram no jornal "Libération" um apelo para que as pessoas "enfrentem o estado de emergência" e o evento "Marcha Mundial pelo Clima (chamado à desobediência)" criado no Facebook reuniu, na sexta-feira, 4.700 participantes.
Na ocupação do Massicot, em Ivrey-sur-Seine, o dia começou mais "movimentado" que de costume. "Por volta das 8h, na quinta-feira, um amigo abriu a porta e foi algemado. Depois dois tiras apontaram a arma para mim e me mandaram ajoelhar." Agrupados em um canto do cômodo, os ocupantes assistiam às revistas. "Devia haver uns trinta deles. Eles vasculharam tudo, esvaziaram os armários, levantaram as camas, examinaram nossos papéis. Mas não encontraram nada".
Um dos dez moradores foi colocado sob custódia. "Fizeram perguntas sobre a COP-21, me perguntaram se íamos receber black blocs na ocupação, se eu iria à manifestação de domingo". Ele foi solto "por volta do meio-dia, 13h", meio "traumatizado".
Já em Dordogne, na quarta-feira, às 7h, as forças de ordem revistaram a fazenda de um casal de produtores orgânicos. "Eles nos falaram da COP-21, crentes de que haviam acertado na mosca. Um dos policiais nos perguntou: 'A COP-21, as cúpulas europeias, as manifestações pelo meio ambiente, isso não lhes diz nada?'", conta Elodie. "Depois eles nos perguntaram se tínhamos bombas ou armas. Na verdade, eles não sabiam muito bem o que estavam falando...".
Membro da Confederação Nacional do Trabalho, um sindicato de inspiração anarquista, a agricultora havia ocupado a Notre-Dame-des-Landes para protestar contra o projeto do aeroporto. "Isso foi há três anos e era a única coisa tangível que eles tinham! Desde então começamos essa produção, tenho um filho de 2 anos..." Computadores, celulares, tudo passou por ali: "Eles ligaram máquinas em meu telefone, me disseram que era um software para detectar palavras-chave. Mas não sei o que fizeram com os dados...".
Seus cadernos foram examinados. A palavra "Bruxelas" chamou a atenção dos investigadores. "Meu marido simplesmente morou lá. Falei para eles: 'Falando sério, fomos revistados porque fizemos parte da extrema esquerda e agora vocês começaram a imaginar uma ligação com o islamismo radical?'".
"Não sabemos se foram vocês".
Em Rennes, seis pessoas foram colocadas sob prisão domiciliar. Em um dos apartamentos, os oficiais chegaram na quinta-feira por volta das 9h30. "Cerca de 15 policiais entraram armados, gritando para que deitássemos no chão. Depois eles nos algemaram. Pensei que iam nos levar para sermos interrogados, eles não falavam nada sobre o contexto ou o motivo de sua presença. Eles revistaram nossa casa, e foi somente no fim que nos falaram da prisão domiciliar", explica um dos moradores.
O texto dos decretos reserva surpresas. Para um dos ativistas, foi mencionada uma "participação em manifestações violentas anti-NDDL, o aeroporto de Notre-Dame-des-Landes, no dia 22 de fevereiro de 2014 em Nantes", sendo que ele nunca chegou a ser detido para averiguações sobre esse assunto, e uma "participação ativa nas manifestações violentas contra a polícia em Pont-de-Buis (Finistère), nos dias 23, 24 e 25 de outubro de 2015", sendo que ele pode provar que não estava lá.
O improviso é ainda mais flagrante em outras cidades. Em Rouen, a política apareceu em um apartamento que as pessoas intimadas já não ocupavam havia vários meses. Em Lyon, diversos policiais à paisana apareceram por volta das 18h em uma república para emitir uma ordem de prisão domiciliar a um homem que já não morava lá há mais de um ano. A situação se tornou mais tensa quando as forças de segurança quiseram inspecionar a casa.
"O joguinho durou 20 minutos", explica um dos moradores do lugar. "Eles nos diziam: 'Não sabemos se foram vocês, recebemos ordem de cima, queremos verificar. Só estamos fazendo nosso trabalho'. Respondemos que se eles quisessem fazer o trabalho deles, eles podiam simplesmente ligar para a seguridade social para verificar os endereços". Foram chamados reforços, e em seguida, após uma ligação recebida por um dos policiais, os oficiais bateram em retirada. Sem maiores explicações.
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Pelo COP-21, estado de emergência na França atinge também ambientalistas - Instituto Humanitas Unisinos - IHU