09 Novembro 2015
A longa subida da relações públicas que dizia: "Sonhe o impossível". "Não passei no teste de medicina, mas surpreendi Andreotti [ex-primeiro-ministro italiano]." "Sério?", escandalizaram-se na Sala de Imprensa vaticana. "Ela deve ficar bem quietinha." Pode ser conveniente imaginá-la assustada e pronta para cooperar. Corvo depenada. Lobista mortificada. Jesuíta arrependida. Mas Francesca Immacolata Chaouqui ri, se faz de espirituosa.
A reportagem é de Fabrizio Roncone, publicada no jornal Corriere della Sera, 05-11-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
"Eu sou inocente. Eu não traí o papa. Não repassei documentos a ninguém. E, realmente, não tenho nada a acrescentar... Ou, melhor, não, há uma coisa a acrescentar: eu passei as últimas horas negando conversas privadas que os jornalistas depois transformam em entrevistas. Você está escrevendo?". Sim. "Exatamente. Ver sendo traída a própria confiança é a pior coisa que pode acontecer a uma pessoa."
Que o diga ao Santo Padre. "Escreveram um monte de mentiras..." Onde você está agora? "Quer saber onde eu estou?" É um segredo? "Estou nas grades, em uma cela de Castel Sant'Angelo... enquanto o monsenhor..." Mons. Lucio Anjo Vallejo Balda? "Sim... Ele, infelizmente, já foi crucificado de cabeça para baixo. Um fim horrível, acredite em mim."
Ironia macabra, mas que ajuda a entender: ela é uma mulher de 31 anos, casada (sobre Corrado Lanino, o marido, falaremos melhor em breve), inescrupulosa e astuta, determinada e rápida.
"Sonhe o impossível e viva-o", dizia a tia com poliomelite em San Sosti, um vilarejo na província de Cosenza, onde Francesca Immacolata cresceu com a avó e a mãe (o pai é um egípcio que esperou o seu nascimento e depois desapareceu).
O impossível: ser nomeada na comissão-chave das finanças vaticanas por um papa que quer revolucionar a Igreja. Ela, a única mulher. Que vem de longe, com passo veloz.
"Quando eu cheguei em Roma, não passei no teste para medicina, então passei para jurisprudência. Mas eu gostava de escrever e comecei a colaborar com um jornal, Roma In. Eu fazia entrevistas ao Senado, e surpreendi Giulio Andreotti, sozinho, na sala de leitura. Pedi-lhe um conselho: ele me disse para tentar com o famoso escritório Pavia e Ansaldo... Lá me contrataram e eu conheci a condessa Marisa Pinto Olori del Poggio, que me ensinou tudo: desde como se prepara uma mesa a como as pessoas se conhecem no Vaticano. Passei para o escritório Orrick, cheguei à Ernst&Young, me inscrevi na associação de Enrico Letta, VeDrò, encontrei-me espiritualmente próxima do Opus Dei. Até que, um dia, o Mons. Balda me telefona: 'Você é candidata ao comitê referente sobre os dicastérios econômicos da Santa Sé."
Ficha biográfica recolhida pela revista L'Espresso. Posto dessa forma, uma carreira leve, límpida, de muita sorte.
Ao contrário, há outras coisas. Muitas outras. Para começar: o marido, Corrado Lanino. Eles se conheceram no chat, e, no primeiro encontro, Francesca Immacolata – na época com 17 anos – se apresentou com o uniforme da Unitalsi, voltando de Lourdes. Ele é um jovem e brilhante consultor de informática que (na vida, as coincidências são tudo) acabará sendo o responsável pelo terceiro nível da rede de internet do Vaticano (o que se relaciona com todos os escritórios).
Ela, com a rede, é um pouco menos sortuda (digamos assim): porque, justamente quando ela começa a frequentar como lobista o submundo vaticano – estamos em 2012, ano do Vatileaks –, do seu perfil no Twitter começam a surgir alguns tuítes pesados. Um pouco escritos como pessoa "bem informada" sobre certos fatos: "Paolo Gabriele não é o corvo", "Papa entristecido com a prisão do mordomo", e, depois, enormes felicitações ao jornalista Gianluigi Nuzzi.
Um pouco são venenos esguichados na rede: o cardeal Bertone é "corrupto", Giulio Tremonti "tinha uma conta no IOR: depois de se oficializar que era gay, eles a fecharam", "o Papa Ratzinger está com leucemia".
Coisa pesada. Mas há um golpe de cena: "Eu não tenho nada a ver com esses tuítes. É meu apenas aquele sobre a doença de Ratzinger". Não só: muitos tuítes – depois da nomeação para a comissão de finanças – até mesmo desapareceram da sua conta.
"Tudo esclarecido: eram screenshots. Os hackers entraram no meu perfil." Os hackers são terríveis, piores do que uma micose: afinal, tendo em casa um marido que é mestre em informática, Francesca Immacolata conhece bem as suas perigosas habilidades.
"Eu, no entanto, sempre fui vítima." Como quando, durante a canonização de João XXIII e João Paulo II, ela organizou uma festa no terraço da Prefeitura para os Assuntos Econômicos (o Papa Francisco ficou sabendo e reagiu muito mal).
E também desta vez, pois ela jura: é claro que o Mons. Balda, o outro suposto corvo desta temporada vaticana, "me puxou para dentro, com raiva, quase louco, por causa de algumas promoções que lhe foram negadas". Mons. Balda: crucificado – como ela zombava antes – de cabeça para baixo (evocando, assim, o martírio de São Pedro).
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Os "tuítes" e a ironia macabra. A ascensão e a queda de Chaouqui - Instituto Humanitas Unisinos - IHU