23 Outubro 2015
Depois da publicação da reportagem Vítimas de uma guerra amazônica, a empresa Norte Energia, responsável pela usina hidrelétrica de Belo Monte, respondeu por e-mail a perguntas enviadas por Eliane Brum, autora do texto, publicado no dia 22 de setembro. O El País Brasil publica as perguntas e respostas quase na íntegra por tratar-se de um assunto complexo, com notas da redação para esclarecer alguns pontos levantados pela empresa.
A entrevista é de Eliane Brum, publicada por El País, 21-10-2015.
Eis a entrevista.
Por que a Norte Energia queimou a casa de Raimunda Gomes da Silva, violando a suspensão das “remoções” e demolições determinada pelo IBAMA e antes que a moradora pudesse retirar seus pertences de dentro da casa? E como pretende reparar o dano causado à moradora?
Esta versão fantasiosa e absolutamente distante da realidade havia sido abordada pelo EL PAÍS na reportagem. As negociações com a Sra. Raimunda Gomes da Silva estavam concluídas, inclusive com o pagamento pela indenização efetivado, quando ocorreu a desmobilização dos pertences e benfeitorias da moradora, ocupante da Ilha Barriguda. Não houve, portanto, relocação em desobediência à determinação do órgão licenciador, o IBAMA. A casa da moradora não foi queimada, pois este não é método adotado pela Norte Energia: a propriedade foi demolida seguindo os procedimentos de segurança e o terreno foi limpo, conforme é exigido pelo órgão licenciador e apenas parte de entulho foi queimada de forma controlada. Antes da relocação foi cumprido o procedimento padrão de averiguar se o local estava desocupado e livre para realização dos trabalhos. O processo incluiu o contato com a moradora para informar sobre a desmobilização na área, naquela altura já adquirida legalmente pela empresa.
Ela informou que removeria apenas espécies frutíferas que ainda se encontram no terreno. Raimunda Gomes, como os demais moradores de ilhas e beiradões com direito a compensações conforme preconizado pelo Projeto Básico Ambiental da UHE de Belo Monte, teve sua situação analisada novamente em consonância com as mais recentes orientações do Governo Federal. A ela será oferecida a possibilidade de relocação para uma ilha localizada no reservatório do rio Xingu e um conjunto em madeira para autoconstrução de uma casa de 63 m2.
Nota da redação: A casa de Raimunda Gomes da Silva foi destruída e queimada no dia 31 de agosto de 2015, conforme registrado na Certidão de Ocorrência da Polícia Federal de número 122/2015, de 3/9/2015, e comunicado ao IBAMA pelo Ministério Público Federal de Altamira no ofício nº 374/2015/PRM/ATM/GAB1, de 3/9/2015. Raimunda Gomes da Silva, conforme relatado na reportagem "Vítimas de uma guerra amazônica", só descobriu que a casa havia sido queimada em 1/9/2015, ao navegar até a ilha para retirar seus pertences, razão pela qual registrou ocorrência na Polícia Federal. Naquela data, as “remoções” e demolições das casas nas ilhas estavam suspensas pelo IBAMA, conforme o Of. 02001.007279/2015-62, de 6 de julho de 2015, devido ao descumprimento do Projeto Básico Ambiental, por parte da Norte Energia, constatado por uma inspeção interinstitucional. Em 11 de setembro de 2015, no Par. 02001.003656/2015-94, o IBAMA analisou a denúncia acolhida pelo MPF e concluiu: "Resta comprovado que a demolição e a queima da casa da Sra. Raimunda Gomes ocorreu na vigência do comando da Diretoria de Licenciamento Ambiental para a suspensão da remoção compulsória e demolição das casas nas ilhas. Ressalta-se que o forte simbolismo de uma residência queimada provoca medo aos vizinhos e as informações por meio de comunicação desprovida de cuidados com a população atingida serve para disseminar maior desconfiança ao processo de remoção. Recomenda-se que seja aplicada sanção administrativa em desfavor da Norte Energia, conforme requer o caso".
O IBAMA negou a Licença de Operação de Belo Monte por ter encontrado “pendências impeditivas” ao revisar o cumprimento das condicionantes socioambientais. O órgão federal elencou 12 itens, entre eles, conclusão das obras de saneamento das localidades Ressaca e Garimpo do Galo; a comprovação de que o sistema de abastecimento de água (captação superficial) nas localidades de Belo Monte e Belo Monte do Pontal encontra-se em operação para atendimento da população local, e a conclusão do remanejamento da população atingida da Área Diretamente Afetada, especialmente no que se relaciona à área urbana de Altamira (reassentamento nos 6 RUCs) e os ribeirinhos moradores de ilhas e beiradões do rio Xingu, e apresentação de planejamento para o cenário de necessidade de tratamento das famílias que, embora localizadas fora da Área Diretamente Atingida, poderão sofrer impactos decorrentes da elevação do lençol freático em áreas urbanas de Altamira. Por que essas medidas não foram cumpridas e como a Norte Energia espera obter a Licença de Operação?
Ao contrário da afirmação, o IBAMA, responsável pelo licenciamento ambiental de Belo Monte, não negou a Licença de Operação (LO) para o empreendimento, muito menos impôs novas obras condicionantes. O Instituto apenas indicou 12 itens em relação aos quais identifica pendências e solicitou que a Norte Energia comprovasse a realização deles, o que está sendo devidamente trabalhado. Registre-se que a solicitação do Ibama não tem nenhum efeito sobre o andamento das obras de Belo Monte, que continuam em plena execução.
Um dos problemas recorrentes exposto nos depoimentos de “removidos compulsoriamente” por Belo Monte e reassentados nos RUCs é a impossibilidade de ganhar o sustento, por estarem distantes do rio e do lugar de trabalho, situação agravada pela não conclusão da infraestrutura, como apontou o IBAMA, assim como as dificuldades causadas pela separação de sua comunidade, grupo com o qual tinham laços de afeto e vínculos de solidariedade considerados fundamentais para a sobrevivência. Tanto o IBAMA quanto a FUNAI referem-se explicitamente à necessidade de implantação urgente do RUC Pedral, para solucionar parcialmente o fenômeno causado pela Norte Energia na região, definido por técnicos e pesquisadores como “pescadores sem rio e sem peixe”. Quando será implantado o RUC Pedral e quantas famílias abrigará? E como serão compensados e reparados os prejuízos causados pela desterritorialização, no âmbito material e psíquico?
A Norte Energia sempre procurou manter as famílias e os grupos sociais de uma determinada localidade num mesmo bairro que recebeu os moradores de áreas de riscos. Em alguns casos, isso não foi possível, por algumas razões, dentre elas: A – Parentes moravam como dependentes e, conforme os critérios estabelecidos com anuência do IBAMA, não tinham direito a uma moradia, pois moravam na casa dos pais. Posteriormente, alguns desses casos foram revistos, por iniciativa da própria Norte Energia ou mesmo por ação judicial, que reconheciam o direito das famílias em receber a moradia em assentamento. Nesses casos, era comum que nos bairros para onde foram seus pais já não existissem mais residências disponíveis e as famílias tinham que ir para outro bairro.
B – Outras vezes, a Norte Energia reconhecia de imediato o direito dos moradores de uma mesma residência receberem casas separadas, mas as juntadas de documentos ocorriam de forma diferente e, assim, quando o segundo interferido conseguia juntar as provas que o habilitavam a receber a casa já não existia mais moradias nos bairros para onde foram seus parentes ou vizinhos.
C – Registre-se que há casos de graus de parentesco em que o pedido para ficar em bairros diferentes foi realizado para a Norte Energia.
D – Finalmente, há diversos casos de famílias que moravam em diferentes áreas de risco e foram atendidas na solicitação de morarem no mesmo bairro. Quanto aos Pescadores, eles tiveram preferência de opção pelo Bairro Laranjeiras, que terá atracadouro e acesso para o rio Xingu a partir do Igarapé Panelas. Muitos, no entanto, consideraram o bairro longe ou não quiseram esperar que ele fosse concluído e optaram por morar em outros bairros.
O bairro Pedral está sendo construído e também será opção para receber pescadores. No entanto, até agora, há menos de 10% de manifestações de interesse de mudança para o bairro em relação à quantidade de casas que podem ser construídas lá, cerca de 600. Neste momento, a Norte Energia está revisitando, uma a uma, todas as famílias em que pelo menos um membro da família se declarou pescador, oferecendo-lhes a opção de se mudar para o Bairro Pedral, que também contará com infraestrutura para a atividade pesqueira e para os barqueiros. A Norte Energia, o IBAMA e a Secretaria de Patrimônio da União (SPU) estão definindo novas ilhas que não ficarão submersas para serem usadas pelos pescadores como ponto de apoio.
Há numerosos depoimentos de pessoas “removidas compulsoriamente” pela Norte Energia, conforme foi possível constatar na audiência pública sobre o tema promovida pelo Ministério Público Federal em Altamira, que relatam violações dos direitos dos atingidos: analfabetos que assinaram papéis sem ler, pessoas que queriam ser reassentadas e, em vez disso, foram contempladas com uma indenização de valor insuficiente para comprar ou construir uma nova casa etc. Entre as denúncias, três são recorrentes: 1) os valores das cartas de crédito e indenizações são considerados incompatíveis com o mercado imobiliário de Altamira, que foi inflacionado pela construção da hidrelétrica; 2) o não reconhecimento da cultura de dupla moradia dos ribeirinhos, que tinham uma casa na cidade e outra nas ilhas ou beiradões do Xingu; 3) o não reconhecimento de casas como casas, como denunciou a Defensoria Pública da União, por divergirem do conceito de moradia do empreendedor. A Norte Energia cometeu as violações de direitos denunciadas na mencionada audiência pública do MPF, assim como junto a outros órgãos federais? Nesse caso, como pretende corrigir as distorções existentes no processo de “remoção compulsória”, em especial referentes ao reconhecimento da dupla moradia e à defasagem do valor pago aos atingidos?
A Norte Energia sempre atuou na questão das indenizações nos limites rigorosos da Lei, com critérios aprovados pelo órgão licenciador. Pelo Programa Básico Ambiental (PBA), a Norte Energia estruturou o chamado Caderno de Preços para as áreas rural e urbana de Altamira com objetivo de fixar os valores básicos unitários das benfeitorias a serem indenizadas. Para as benfeitorias reprodutivas (plantações) foi aplicado o método de reprodução conforme previsto nos itens 7.3.2.4 e 10.3 (NBR14.653-3) da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Para as benfeitorias não reprodutivas (construções e instalações) foi aplicado o método de quantificação do custo, conforme prevê o item 8.3.1(NBR 14.653-2) e item 8.6(NBR 14.653-3) da ABNT. O caderno de preços foi apresentado à sociedade civil em reuniões públicas e cópias dele foram encaminhadas aos principais órgãos públicos e privados do município, tais como Ministério Público Federal, Ministério Público da Estadual, CREA, Poder Judiciário, Prefeitura Municipal, além do órgão Licenciador, IBAMA. É importante ressaltar que a Norte Energia já realizou praticamente todas as relocações urbanas nas áreas de influência do reservatório da Usina Hidrelétrica Belo Monte e está concluindo as relocações rurais de famílias que vivem em ilhas e às margens dos reservatórios.
Os processos de negociação foram finalizados legalmente e grande parte acompanhados pela Defensoria Pública da União, com unidade de atendimento instalada em Altamira há cerca um ano. Atualmente, a empresa segue a nova orientação do governo federal, de garantir a transferência de ribeirinhos para ilhas e beiradões do rio Xingu que não serão afetadas pelos reservatórios a fim de garantir o modo de vida tradicional para essa população, conforme determina os órgãos licenciadores por meio do Projeto Básico Ambiental do empreendimento.
Quanto às famílias com duplas moradias estão em andamento estudos, em conjunto com o IBAMA e a Secretaria de Patrimônio da União (SPU), que possibilitarão o aproveitamento de outras ilhas que não ficarão submersas para servirem de pontos de apoio aos pescadores que assim o quiserem. Se o EL PAÍS não tivesse tanto desejo de reproduzir somente o que algumas Organizações divulgam, certamente ouviriam a Norte Energia e produziriam relatos baseados em fatos, não em mentiras e informações distorcidas.
Nota da redação: as denúncias de violações aos direitos da população atingida estão amplamente documentadas nos registros da audiência pública realizada pelo Ministério Público Federal, ocorrida em Altamira/PA, em 12/11/2014, assim como no Relatório da Inspeção Interinstitucional realizada entre 1 e 3 de junho de 2015, do qual participaram as seguintes instituições: Ministério Público Federal (MPF), Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), Fundação Nacional do Índio (FUNAI), Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA), Defensoria Pública da União (DPU), Defensoria Pública do Estado do Pará (DPE-PA) e Procuradoria Federal Especializada da FUNAI (AGU- FUNAI), além da participação dos professores Manuela Carneiro da Cunha, da Universidade de São Paulo e da Universidade de Chicago (USP/UCHICAGO), Mauro William Barbosa de Almeida, da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), e Sônia Magalhães, da Universidade Federal do Pará (UFPA), assim como pesquisadores que atuam com os grupos tradicionais da região, de entidades não-governamentais e de representantes dos atingidos. As conclusões deste relatório levaram o IBAMA a decidir pela suspensão temporária das "remoções compulsórias" e demolições das casas nas ilhas interferidas pela Usina Hidrelétrica de Belo Monte, até que o processo fosse corrigido, conforme consta no ofício 02001.007279/2015-62 DILIC/IBAMA, de 6 de julho de 2015.
A Defensoria Pública da União entrou com uma ação de 3,5 bilhões de reais, junto à Justiça Federal de Altamira, pleiteando uma série de indenizações e compensações em favor de indígenas, barqueiros, carroceiros, ribeirinhos, pescadores e a população urbana atingida pela hidrelétrica de Belo Monte. Na ação, a Norte Energia é elencada como uma das responsáveis pela violação de direitos das comunidades mencionadas. O que a concessionária tem a dizer sobre isso?
A empresa está tratando as ações judiciais dentro dos limites da lei respondendo a todas as questões com provas e testemunhas. Temos certeza que dentro do amplo direito de defesa, as instituições onde se encontram os processos terão todas as informações para finalizar os julgamentos.
Em ofício acompanhado de um relatório de 416 páginas enviado à presidência do IBAMA, a FUNAI concluiu ser impossível emitir um parecer favorável à Licença de Operação da hidrelétrica de Belo Monte enquanto não houver garantias de cumprimento das medidas necessárias à efetiva mitigação e compensação dos impactos causados aos povos indígenas na região do empreendimento, com a necessária atualização da matriz de impactos, revisão do PBA e continuidade das ações já previstas no componente indígena. No documento, a FUNAI exige a assinatura de um TAC com descrição clara das “obrigações e responsabilidades do empreendedor”, “prazos bem definidos” e “possibilidade de aplicação de penalidades pela FUNAI em caso de atrasos e descumprimentos”. Por que a Norte Energia não cumpriu as obrigações acordadas referentes ao componente indígena, como aponta a FUNAI, e mesmo assim pediu a Licença de Operação? Como pretende cumprir as medidas de mitigação e compensação do impacto no que se refere aos povos indígenas?
A Norte Energia trabalha para atender as solicitações da Funai em relação às exigências para emissão da Licença de Operação. Praticamente todas as ações do Projeto Básico Ambiental do Componente Indígena (PBA-CI) já foram concluídas ou estão em andamento. É verdade que a realização de obras nas aldeias não seguiram o mesmo ritmo daquelas realizadas em áreas urbanas e rurais, mas isso se deve ao respeito à cultura indígena e das exigências das lideranças e da própria FUNAI, que restringem a mobilização de trabalhadores nas terras indígenas. Ressalte-se que nenhum centímetro de terra indígena está sendo impactado, ainda assim, a Norte Energia realiza um conjunto de 27 ações do PBA-CI, algumas em aldeias distantes até três dias de barco em relação à Hidrelétrica Belo Monte. Até o momento o investimento em ações voltadas aos povos tradicionais do Xingu chegam a R$ 252 milhões em obras e serviços nas aldeias, algumas a três dias de distância de barco da hidrelétrica.
A empresa já construiu a maior parte das 700 casas de moradias determinadas em acordo, e já está construindo as 34 escolas e 34 unidades básicas de saúde para as comunidades indígenas, para as quais já foram entregues casas de farinha, sistemas de tratamento de água, pistas de pouso, estradas, veículos, equipamentos para produção, etc.
Na página 400 do relatório da FUNAI, afirma-se: “O projeto atual propaga aos quatro cantos do mundo que não haverá o alagamento de nenhuma terra indígena. E, ao contrário do que o empreendedor quer afirmar implicitamente (ou explicitamente), isso não quer dizer que não há impactos aos povos e terras indígenas do médio Xingu”. Lideranças indígenas têm declarado que há uma grande insegurança e temor sobre o futuro do seu modo de vida, em especial no trecho de 100 quilômetros da Volta Grande do Xingu, que ficará com vazão reduzida, alterando o ciclo natural de cheias e vazantes, com impactos sobre a navegação e sobre a pesca, assim como sobre todo o ecossistema, com alterações já detectadas pelos indígenas na reprodução de espécies de peixes. Duas questões aparecem fortemente nas falas dos indígenas: “Como navegar um rio seco?”; “Como os peixes irão se reproduzir sem cheias”? O que a Norte Energia vai fazer e em que prazo, para mitigar e compensar estes impactos e garantir que os povos indígenas, também da Volta Grande do Xingu, possam continuar com seu modo de vida em seu território ancestral?
Está garantido o nível do rio Xingu, no Trecho de Vazão Reduzida na Volta Grande, a partir de estudos validados pelo órgão licenciador. O controle do volume de água do rio é um processo previsto no Projeto Básico Ambiental (PBA) de Belo Monte e será executado por meio das comportas do vertedouro, no Sítio Pimental. A regulagem mecânica estabelece uma vazão mínima de 700 metros cúbicos por segundo e a manutenção do pulso hídrico. Segundo os estudos feitos pela Norte Energia, esse fluxo é praticamente o dobro da vazão mínima histórica, registrada em 20 de setembro de 2003 em 365 metros cúbicos por segundo. O ambiente da região do Médio Xingu vem sendo monitorado e conservado por meio de 117 programas, inseridos no PBA. Incluem ações para monitorar as condições na Volta Grande em seus aspectos físicos, bióticos, socioeconômicos e culturais, antes, durante e após o enchimento e operação do reservatório do Xingu. Além das ações de conservação socioambiental, há ainda o Projeto Básico Ambiental do Componente Indígena (PBA-CI), voltado exclusivamente para atender às comunidades de nove etnias do Médio Xingu. Quaisquer situações observadas ou relatadas que possam significar riscos à continuidade e/ou qualidade dos usos do rio, aplicados neste trecho em função da implantação do empreendimento, terão as medidas de mitigação implantadas, cujos parâmetros estabelecidos indicam um índice de sustentabilidade que será monitorado após o enchimento do reservatório.
A procuradora da República em Altamira, Thais Santi, afirma que as ações da Norte Energia na implantação de Belo Monte causaram um “etnocídio indígena”. Um dossiê publicado pelo Instituto Socioambiental mostrou que “a mesada de R$ 30 mil” (termo usado no dossiê do Instituto Socioambiental) dada às aldeias pela Norte Energia, em mercadorias, levou a um processo de destruição do modo de vida dos indígenas. Entre outros problemas, a entrada massiva de produtos industrializados causou a interrupção do processo de cultivo e a consequente insegurança alimentar. Entre as consequências, verificou-se um aumento de 127% na desnutrição infantil nas aldeias da região, entre 2010 e 2012. Lideranças indígenas relatam que representantes da Norte Energia “chegavam às aldeias dizendo que podiam pedir o que quisessem e que não precisariam mais trabalhar”. O Distrito Sanitário Especial Indígena de Altamira afirmou que: “A partir de setembro de 2010, com a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, os indígenas passaram a receber cestas de alimentos, composta por alimentos não perecíveis e industrializados. Com isso os indígenas deixaram de fazer suas roças, de plantar e produzir seus próprios alimentos. Porém, em setembro de 2012, tal ‘benefício’ foi cortado, os indígenas ficaram sem o fornecimento de alimentos e já não tinham mais roças para colher o que comer, o que levou ao aumento do número de casos de crianças com Peso Baixo ou Peso Muito Baixo Para a Idade, chegando a 97 casos ou 14,3%”. Em outro ponto do documento, o DSEI de Altamira relaciona o aumento dos casos de “doença diarreica aguda” à atuação da Norte Energia nas aldeias. Por que em vez de fortalecer e proteger os indígenas, como era determinado, a concessionária promoveu o que a procuradora da República definiu como “etnocídio indígena”? O que a Norte Energia vai fazer – e em que prazo – para reparar e compensar os danos causados aos povos indígenas?
Lamentamos o termo utilizado pela Procuradora, grave e que não condiz com a realidade do que vem sendo executado pela Norte Energia na região do Médio Xingu. Em relação à tal “mesada”, trata-se de auxílio financeiro contido no Plano Emergencial, assinado pela FUNAI e Norte Energia, e teve como objetivo a execução de ações emergenciais e de apoio, de proteção e de assistência às comunidades indígenas da área de influência de Belo Monte. O plano esteve em vigência até a aprovação do Projeto Básico Ambiental do Componente Indígena (PBA-CI) e do Plano Operativo pelo órgão indigenista, e funcionou em duas frentes complementares: 1 - Fortalecimento institucional, na qual a Norte Energia contratou 23 profissionais para apoiarem a Funai de Altamira pelo período de 24 meses, até realização de concurso público pelo Governo Federal para alocação de servidores efetivos para o órgão; compra de equipamentos e cessão de insumos, como combustível, para estruturar o trabalho na Fundação. A empresa também disponibilizou a manutenção e reposição de peças para equipamentos de informática, veículos, motores fluviais, grupo gerador e kit fotovoltaico. 2 - Promoção ao Etnodesenvolvimento, com investimento de R$ 30 mil mensais para cada aldeia da área de influência do empreendimento, pelo período de 24 meses, entre setembro de 2010 e setembro de 2012.
O valor foi estipulado pelo órgão indigenista. Nesta linha de ação, foram investidos e doados diversos insumos agrícolas, ferramentas, construção de pistas de pouso, melhorias de estradas de acesso às aldeias. É importante esclarecer que a coordenação deste plano de trabalho, conforme consta no Termo de Compromisso Firmado entre as partes, foi de responsabilidade da FUNAI, assim como a elaboração dos Planos de Trabalho. A Norte Energia continua os trabalhos para concluir as ações previstas no Projeto Básico Ambiental do Componente Indígena (PBA-CI), que estão garantindo segurança territorial, ambiental e alimentar às populações tradicionais do Médio Xingu a partir de investimentos que chegam, atualmente, a R$ 252 milhões em obras e serviços nas aldeias.
O ministro José Múcio Monteiro, do Tribunal de Contas da União, afirmou, em junho de 2015, que o TCU iniciaria uma auditoria sobre o uso de recursos públicos na construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, por duas razões principais: o fato de as empresas que formam o consórcio construtor de Belo Monte estarem sob investigação da Operação Lava Jato e a possibilidade de o alto custo da construção da usina inviabilizar um retorno financeiro para as estatais que estão investindo no projeto. Em 30 de setembro, o TCU aprovou a realização de uma auditoria para investigar um termo aditivo firmado entre o BNDES e a Norte Energia. A decisão se baseia numa alteração contratual feita pelo BNDES e denunciada pelo jornal o Estado de São Paulo, no financiamento de 22,5 bilhões de reais firmado com Belo Monte. Essa alteração, ao mudar o cronograma original, pode ter livrado a Norte Energia de uma multa com potencial de chegar a 75 milhões de reais. O que a Norte Energia tem a dizer sobre isso?
Em relação ao custo de Belo Monte, temos a informar que ele está rigorosamente dentro do previsto. Como jornais e jornalistas que escrevem sobre assuntos ligados a energia deveriam saber é o valor da tarifa proposta para a venda de energia que determina o custo do projeto hidrelétrico que passou por processo de concessão. No caso de Belo Monte, a tarifa vencedora para a venda da energia para o chamado mercado regulado (70% da energia de Belo Monte), foi de R$ 77,97 o MW/hora. Ressalte-se que o valor da tarifa é 6% menor que o preço teto fixado para o leilão, de R$ 83,00 o MW/hora, valor este aprovado pelo próprio Tribunal de Contas da União (TCU).
Os valores envolvidos na proposta vencedora são corrigidos exclusivamente pelo IPCA a partir da data do leilão, conforme cláusula contratual definida para todos os 35 anos de vigência da concessão de Belo Monte. Os acionistas tinham e têm pleno conhecimento destes valores, bem como das taxas de retorno dos seus investimentos, que estão dentro dos padrões para este tipo de empreendimento. Quanto ao aditivo assinado com o BNDES, ele foi necessário para alterar as datas dos marcos físicos de desvio do Rio Xingu na segunda fase e de início da geração da Casa de Força Complementar. O procedimento é usual em financiamentos de projetos do porte da UHE Belo Monte e foi realizado estritamente dentro das normas e do planejamento do empreendimento. Em relação às investigações do TCU, aquele tribunal tem o dever de investigar fatos que estão dentro de suas atribuições, mas desconhecemos investigações específicas sobre o aditivo.
O empresário Milton Pascowitch, delator da Operação Lava Jato, declarou que uma propina de 532.000 reais paga em dinheiro vivo ao PT teve origem nas obras da usina hidrelétrica de Belo Monte.O ex-presidente da construtora Camargo Corrêa, Dalton Avancini, também um dos delatores da Operação Lava Jato, relatou que a empreiteira se comprometeu a pagar ao PMDB propina correspondente a 20 milhões de reais para atuar na construção de Belo Monte. O que a Norte Energia tem a dizer sobre as afirmações de delatores da Operação Lava Jato de que houve pagamento de propinas para a construção de Belo Monte?
Oficialmente, Belo Monte não sofre nenhuma investigação, sendo, até agora, vítima de ilações divulgadas pela imprensa. Trata-se de absoluta tentativa de envolver o empreendimento sem nenhuma prova concreta em investigação da qual ele não faz parte. Ressalte-se ainda que todas as demonstrações financeiras da Norte Energia são auditadas e aprovadas sem ressalvas por auditoria independente e publicadas anualmente em veículos de comunicação. No caso da Norte Energia, temos absoluta certeza de que não há pagamentos indevidos em razão das práticas internas adotadas pela empresa. Por exemplo, todo contrato com valores acima de R$ 500 mil têm que ser aprovados pela maioria dos diretores e contratos com valores acima de R$ 5 milhões dependem de aprovação do Conselho de Administração, onde os acionistas se fazem presentes por meio dos seus representantes. Ressalte-se que as contas da Norte Energia são auditadas periodicamente por auditoria independente, pelos acionistas e também pelos órgãos financiadores.
Belo Monte poderá atingir uma potência de 11.233 megawatts, número que a coloca como a terceira maior hidrelétrica do mundo, atrás apenas da chinesa Três Gargantas e da binacional (Paraguai-Brasil) Itaipu. Porém, o pico de 11.233 MW poderá ser alcançado apenas quando o Xingu atinge suas vazões máximas e baixará drasticamente na época seca. Na média a previsão é de que Belo Monte garantirá 4.571 MW, ou 41% de sua capacidade instalada, o que a coloca entre as hidrelétricas menos produtivas no que se refere à relação entre capacidade instalada e energia firme. Por que continuar com a obra?
O Brasil precisa expandir em cerca de 5% ao ano sua capacidade instalada de geração de energia elétrica. São cerca de sete mil MW de potência que precisam estar disponíveis a cada ano para sustentar o desenvolvimento econômico e social do país. E a energia hidrelétrica é a fonte mais eficiente para esta expansão, por gerar energia com menos danos ambientais em relação a outras fontes e, principalmente, com menores custos para o consumidor. Belo Monte se insere neste conceito. De qualquer forma, a quantidade de energia a ser gerada em Belo Monte decorre de estudos e debates com intensa e ampla participação da sociedade brasileira durante 35 anos. Sem um grande reservatório por ter sido construída no modelo a fio d’água, ainda assim, a usina tem capacidade instalada de 11.233 MW e gerará em média 4.571 MW por ano, respeitando os regimes hidrológicos do rio Xingu. A geração média é uma quantidade de energia que justifica o empreendimento por beneficiar diretamente 18 milhões de unidades consumidores em 17 estados do Brasil. Algo em torno de 60 milhões de pessoas, equivalente à população de um país como a França.
Um ponto de fundamental importância a destacar é que em países em desenvolvimento a expansão da oferta de energia elétrica deve ocorrer com fontes que propiciam a chamada energia de base, ou seja, que asseguram a disponibilidade de energia a qualquer hora do dia durante todo o ano. Dentre as fontes atuais disponíveis, somente as fontes hídricas e térmicas oferecem esta disponibilidade, sendo a primeira a de menor custo de produção e menor impacto ambiental. Outras fontes, como a eólica e a solar são complementares, cujo desenvolvimento deve ser incentivado, como está sendo no Brasil, mas que devido a suas especificidades não são energia de base. Além disso, ao contrário do que divulga alguns grupos, a instalação de parques geradores com estas fontes têm custos ainda elevados e podem gerar mais impactos ambientais do que reservatórios de hidrelétricas.
A conta é simples. Para se ter a mesma potência instalada de Belo Monte seriam necessários 3.745 aerogeradores, considerando os de tecnologia mais avançada, que têm potência máxima de 3 MW. Para ter a mesma geração média de Belo Monte são necessários nada menos que 5.078 aerogeradores, uma vez que o fator de capacidade da energia eólica é de 30%. Em Valores médios, Belo Monte tem custo de instalação de cerca de R$ 1.7 mil por quilowatt instalado, contra R$ 3,7 mil a R$ 4 mil da eólica, R$ 8,3 mil para a PCH e de R$ 12 mil a R$ 18 mil para a fonte solar, cuja eficiência energética (energia assegurada) é de menos de 17% da capacidade instalada.
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Perguntas e respostas sobre a usina hidrelétrica de Belo Monte - Instituto Humanitas Unisinos - IHU