22 Setembro 2015
Agência permitiu que a Norte Energia, dona da hidrelétrica de Belo Monte, faça o enchimento do lago da usina em qualquer dia ou mês do ano, derrubando a exigência de sua resolução original
A reportagem foi publicada por O Estado de São Paulo e reproduzida por Amazônia, 18-09-2015.
A Agência Nacional de Águas (ANA), órgão federal responsável pela gestão de recursos hídricos, alterou uma resolução referente à vazão de águas do Rio Xingu, mudança que beneficiou diretamente a concessionária Norte Energia, dona da hidrelétrica de Belo Monte.
Ao fazer a mudança na resolução publicada pela própria agência, a ANA permitiu que a Norte Energia faça o enchimento do lago da usina em qualquer dia ou mês do ano, derrubando a exigência de sua resolução original, que permitia que essa operação ocorresse somente entre os meses de janeiro a junho. Essa alteração foi feita quando já se sabia que as obras estavam atrasadas e que o início das operações de Belo Monte não ocorreria conforme inicialmente garantido pela empresa. Interessava à Norte Energia, portanto, flexibilizar essa regra.
No dia 28 de fevereiro de 2011, a ANA publicou a resolução número 48. Assinada pelo presidente da agência Vicente Andreu, essa resolução tratava especificamente de Belo Monte e estabelecia que “o início do enchimento do reservatório deverá ocorrer entre os meses de janeiro e junho”. A regra estabelecia ainda que, neste período, a empresa teria que respeitar as vazões mínimas de água do Rio Xingu, ou seja, manter um volume mínimo para que a população não ficasse sem água.
No dia 19 de dezembro de 2014, porém, o prazo foi vetado. Uma nova resolução, de número 2046, dessa vez assinada pelo diretor da agência Paulo Lopes Varella Neto, estabeleceu apenas que a empresa teria de respeitar as vazões mínimas do Rio Xingu, mas que poderia encher o lago em qualquer data do ano, desde que garantisse a “preservação dos usos múltiplos dos recursos hídricos, inclusive a manutenção de condições adequadas ao transporte aquaviário”. Essa mudança na regra só foi publicada no Diário Oficial da União na véspera do Natal do ano passado, em edição do dia 23 de dezembro.
Hoje, no auge da seca e da baixa vazão do Xingu, a Norte Energia espera a licença de operação do Ibama o mais rápido possível para começar a encher seu reservatório. Segundo a empresa, todas as condicionantes socioambientais do empreendimento foram cumpridas e agora só falta a licença do órgão para que o bloqueio do rio seja feito. Internamente, a empresa esperava que essa licença saísse no dia 15 de setembro, apesar de o Ibama não ter obrigação de fixar data para emitir sua licença.
Os dados históricos de vazão do Xingu coletados pela ANA apontam que o rio está com um dos menores índices de vazão do ano, com cerca de 1.100 metros cúbicos de água por segundo. Para se ter uma ideia, no período chuvoso, entre março e abril, esse volume sobe para a média de 20 mil m3 por segundo, chegando até picos de 25 mil m3/s.
A Norte Energia tem todo o interesse em iniciar o enchimento de seu lago imediatamente, já que a usina está atrasada. Por contrato, Belo Monte deveria ter começado a entregar energia em fevereiro deste ano. Uma série de eventos, no entanto, retardaram as obras da hidrelétrica. A empresa alegou que não tinha culpa pelo atrasos e solicitou à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) a prorrogação de até 455 dias em seu cronograma. A Aneel rejeitou integralmente os argumentos da empresa e negou o pleito. Em maio deste ano, a Norte Energia conseguiu uma liminar na Justiça que a isenta da responsabilidade pelo adiamento.
Apesar de solicitar formalmente a prorrogação do prazo para começar a entregar energia apenas em fevereiro do ano que vem, a Norte Energia trabalha com a expectativa de iniciar sua geração ainda em novembro deste ano. Para isso, precisaria da autorização do Ibama para barrar o rio imediatamente.
Procurada pela reportagem, a concessionária não se manifestou sobre o assunto. A ANA também não se pronunciou sobre o caso.
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Agência de Águas muda resolução para beneficiar enchimento do lago de Belo Monte - Instituto Humanitas Unisinos - IHU