20 Agosto 2015
A entrada na era industrial marcou uma profunda transformação para os oceanos do planeta: durante quase dois milênios suas temperaturas vinham baixando de maneira contínua, mas o aquecimento devido às atividades humanas reverteu a tendência. Foi o que revelou um estudo internacional publicado nesta segunda-feira (17) pela revista "Nature Geoscience", que teve a colaboração de diversas equipes francesas.
A reportagem é de Pierre Le Hir, publicada no jornal Le Monde e reproduzida no portal Uol, 19-08- 2015.
Em todos os mares do globo, desde os trópicos até perto dos polos, os pesquisadores reconstruíram as variações de temperaturas das águas superficiais ao longo dos últimos dois mil anos, a partir de dados extraídos do zooplâncton fóssil enterrado nos sedimentos marinhos ou ainda de certas moléculas orgânicas. O teor de magnésio e de cálcio no caso dos primeiros e o tipo de lipídios que elas continham, no caso das segundas, fornecem informações sobre o calor das águas superficiais onde esses organismos evoluíam.
Revelou-se então que "as temperaturas de superfície médias do oceano diminuíram regularmente entre o século 1 e o início do século 19". O estudo não registra essa queda em graus Celsius, uma vez que as médias recobrem fortes disparidades regionais. "Globalmente, o resfriamento passado é mais pronunciado perto dos polos, com valores que podem chegar a 2,5-3 graus Celsius, do que nas zonas tropicais, onde ele se situa em torno de 1 grau Celsius nos dois últimos milênios", afirma Guillaume Leduc, pesquisador do CNRS no Centro Europeu de Pesquisas e Ensino de Geociências do Meio Ambiente, cossignatário do estudo.
"Até hoje só dispúnhamos de levantamentos de temperatura, medidos por navios oceanográficos, para o século passado", diz Marie-Alexandrine Sicre, diretora de pesquisas do CNRS no Laboratório de Oceanografia e do Clima, que também participou desse trabalho. "Pela primeira vez, temos uma visão retrospectiva da evolução climática do oceano por dois milênios. O resfriamento que evidenciamos até o início da era industrial é uma descoberta."
Como explicar esses quase dois milênios de resfriamento dos mares? Os pesquisadores rodaram modelos – que permitem chegar até somente os anos 800 – introduzindo neles diferentes fatores que poderiam ter influenciado: variações da órbita da Terra, intensidade da radiação solar, gases de efeito estufa, desmatamento e vulcanismo. Conclusão: no período entre os anos 800 e 1800, a atividade vulcânica é o único parâmetro que poderia explicar esse resfriamento.
Atividades humanas
Já se sabiam que as grandes erupções vulcânicas – tais como as de Pinatubo (Filipinas, 1991), do Krakatoa (Indonésia, 1883) e de Tambora (Indonésia, 1815) – poderiam abaixar temporariamente as temperaturas na superfície da Terra, às vezes durante vários anos. As cinzas e os gases que elas lançam para a estratosfera se transformam em aerossóis que bloqueiam os raios solares. O estudo mostra que essas erupções também têm por consequência "um resfriamento a longo prazo da superfície dos oceanos", explica Helen McGregor (Universidade de Wollongong na Austrália), primeira signatária do artigo.
Então tudo mudou com o início da industrialização. Em razão do aquecimento associado às atividades humanas, os oceanos têm esquentado progressivamente. "É espantoso constatar que a mudança climática de origem antrópica já esteja registrada nos sedimentos marinhos que se depositaram ao longo dos dois últimos séculos", observa Guillaume Leduc.
Essa mudança é ainda mais notável porque uma grande parte da energia acumulada no sistema climático, sob efeito do aquecimento global, é absorvida pelos oceanos, e, portanto, estes têm um papel crucial na regulação do clima de nosso planeta. Como as erupções vulcânicas não pararam com a era industrial, Marie-Alexandrine Sicre acredita que o efeito "resfriante" delas sobre os oceanos esteja minimizando o aquecimento real dos mares diretamente induzido pelo homem.
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Era industrial acabou com 1.800 anos de resfriamento dos oceanos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU