07 Julho 2015
Timothy Radcliffe é um frei dominicano, ex-mestre geral da ordem dominicana e um dos mestres espirituais cristãos mais amados do nosso tempo. "Entrar no mundo religioso – diz – significa passar de uma vida em preto e branco para uma vida em cores."
A reportagem é de Alain Elkann, publicada no jornal La Stampa, 05-07-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis a entrevista.
Padre, o papa o nomeou consultor do Pontifício Conselho da Justiça e da Paz. O que isso significa para você?
O trabalho do Conselho é importante. É uma forma para apoiar o papa, que o colocou no centro da sua missão.
Você vai se mudar para Roma?
Posso continuar pregando e dando palestras em todo o mundo tendo como base Oxford. Todas as vezes que o Conselho precisar de mim, eu posso ir a Roma.
Como padre dominicano, qual é a sua relação com o papa?
O Papa Francisco é um homem por quem eu tenho uma enorme admiração.
Quantas vezes você o encontrou?
Em Buenos Aires, quando era arcebispo, depois tive uma longa conversa com ele há 18 meses, no Vaticano. Depois, uma terceira vez, em dezembro, presenciei um encontro do Pontifício Conselho para o Diálogo Inter-Religioso. Tivemos um encontro entre cristãos (católicos e anglicanos), muçulmanos (xiitas e sunitas) e um rabino argentino.
Você apoia o papa na sua agenda pela mudança?
Eu dei o meu apoio a todos os papas, mas eu gosto da nova liberdade que se respira na Igreja. Ele acredita que o Espírito Santo se derrama sobre nós e não sabemos onde isso pode nos levar. Ele entendeu durante um retiro, refletindo sobre o seu mandato como provincial dos jesuítas, que tinha estado inclinado demais ao controle. É preciso confiar nas pessoas. O Espírito é dado a cada um de nós. Eu não acho que o papa esteja tentando promover a sua agenda pessoal. Ele está tentando encorajar um debate livre e aberto em todos os níveis da Igreja.
O que você fez nos seis meses sabáticos, quando deixou o seu papel de Mestre dos dominicanos?
O propósito dos seis meses era o de refletir sobre o significado da virtude. Eu estava na Eslováquia, com um irmão polonês, e ele me disse que, para São Tomás de Aquino, o propósito de uma vida cristã é compartilhar a alegria de Deus e a liberdade de Deus. Eu achei isso um pensamento interessante que eu queria explorar. Muitas vezes, as pessoas pensam que a moral diz respeito a regras a se respeitar. A busca da virtude, no entanto, é crescer fortes e alegres na amizade de Deus.
Quais são as suas maiores preocupações hoje?
A crise no Oriente Médio: esse é o motivo pelo qual eu fui para Bagdá, que, uma vez, era um grande centro para o Islã, o cristianismo e o judaísmo.
A Europa vai se tornar muçulmana?
Eu não acredito. Acho que há uma verdadeira crise de fé para os jovens muçulmanos. E acho que a nova geração na França e no Reino Unido têm o mesmo problema com a fé que os jovens cristãos.
Por quê?
Porque enfrentam o secularismo e experimentam a sua religião como não liberatória. Muitos jovens muçulmanos veem a sua fé abalada pela brutalidade do Isis e pelo conflito entre xiitas e sunitas.
As pessoas são menos religiosas?
Sim. Na Inglaterra, uma das sociedades mais secularizadas, é assim.
Por que na Inglaterra é assim?
Em certo sentido, a sociedade está marcada pelo fundamentalismo. Há um fundamentalismo científico, que pensa que tudo pode ser explicado pela ciência. A Igreja não tem nada contra a ciência, contanto que não tenha pretensões totalitárias! Depois, há o fundamentalismo dos mercados, que reduz os seres humanos a homo economicus. O fundamentalismo religioso é uma resposta a esses outros fundamentalismos. Acho que muitos jovens estão em busca de uma visão da humanidade que conserve o sentido da nossa beleza e da nossa dignidade. Temos muitos estudantes que vêm à missa aqui.
A Igreja está mudando?
Eu acho que a mudança existe: muitas vezes, houve divisões na Igreja entre progressistas e conservadores, mas agora as estamos superando.
A Igreja ainda é forte?
Sim e não. É verdade que, na Europa ocidental, muito menos pessoas frequentam a missa, mas a religião é mais do que nunca um ponto de referência. Eu acho que, se olharmos para encíclica do papa sobre a ecologia, é interessante que muitas pessoas digam: "Se há alguém capaz de fazer com que o mundo enfrente a crise ecológica, é a Igreja Católica". Os políticos carecem de convicção. Grande parte da indústria carece de motivação. Talvez só o papa possa obter algo. Portanto, ele é uma força significativa.
A Igreja foi posta sob cerco com os seus problemas financeiros e sexuais?
E sofreu uma perda de credibilidade. A crise dos abusos sexuais foi terrível, mas eu espero e rezo que a Igreja agora esteja se tornando o lugar mais seguro do mundo para as crianças.
Você dá a volta ao mundo para pregar. O que as pessoas buscam?
Buscam a esperança. O desafio do nosso tempo é recuperar a esperança.
Qual é o propósito da religião?
Somos feitos para a felicidade, que é Deus. Deus é pura felicidade, e esse é o motivo da nossa existência. A religião é o convite a compartilhar a felicidade de Deus.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
''A religião é compartilhar a felicidade de Deus.'' Entrevista com Timothy Radcliffe - Instituto Humanitas Unisinos - IHU