16 Janeiro 2015
Os que estudaram a vida do arcebispo salvadorenho assassinado Oscar Romero dizem que a antecipação da beatificação deste religioso é iminente.
A reportagem é de Chaz Muth, publicada por Catholic News Service, 13-01-2015. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
A notícia está sendo recebida com júbilo por muitos pesquisadores de Romero e com um misto de emoções pelos salvadorenhos.
Durante anos os apoiadores da causa pela canonização de Romero ficaram frustrados. No entanto, a causa, hoje, parece ter chegado ao seu momento, e uma beatificação ou canonização a ser anunciada em breve “seria um grande dia para todos nós”, disse Damian Zynda, pesquisadora de Dom Romero e professora no Programa Espiritualidade Cristã na Creighton University, na cidade de Omaha, Nebraska.
Zynda esteve entre os vários estudiosos que o site Catholic News Service entrevistou durante o Congresso Internacional sobre Dom Oscar Romero, evento anual que acontece nos meses de setembro na Universidade de Notre Dame, no estado de Indiana.
O movimento mais promissor da causa veio no dia 8 de janeiro, quando o jornal da conferência episcopal italiana anunciou que um painel de teólogos assessores da Congregação para as Causas dos Santos votou, de forma unânime, pelo reconhecimento do arcebispo como mártir e declarou que o arcebispo havia sido morto “por ódio à fé”.
Romero, destacado defensor dos pobres e crítico intransigente de um governo salvadorenho que, segundo ele, legitimou o terror e assassinatos no país, foi atingido e morto no dia 24 de março de 1980 enquanto celebrava missa numa capela de um hospital em San Salvador durante o 12º ano da guerra civil do país, terminada em 1992.
O próximo passo encontra-se com os cardeais e bispos que têm acento na Congregação para as Causas dos Santos, os quais irão votar sobre se sugerem, ou não, ao papa publicar um decreto de beatificação. Não se faz necessário um milagre para a beatificação de um mártir, embora seja normalmente necessário para a sua canonização como santo.
Alguns estudiosos dizem ser possível que o Papa Francisco não siga estritamente esta convenção e apresse o processo de canonização sem um milagre.
“Não sou ingênuo, pois já andei ao longo de muitas trincheiras, mas estou esperançoso”, disse o padre Robert S. Pelton, diretor do departamento de religião da Universidade de Notre Dame. Pelton é o organizador do congresso internacional anual sobre Dom Romero que acontece nesta instituição.
“Isso já deveria ter sido feito há muito tempo”, disse Julian Filochowski, presidente da iniciativa “Archbishop Romero Trust”, de Londres, lançada em 2007 para aumentar o nível de consciência a respeito da vida e obra do defensor da justiça assassinado. “Eu acho que esta beatificação vai impulsionar a Igreja e aqueles cristãos e católicos ao redor do mundo que buscam por justiça”.
A causa da beatificação de Romero foi aberta no Vaticano em 1993, mas ficou atrasada por anos enquanto a Congregação para a Doutrina da Fé estudava os seus escritos, em meio a um debate mais amplo sobre se ele havia sido morto por sua fé ou por motivos políticos. Há a preocupação de que ele seja como um símbolo político em vez de um símbolo religioso em El Salvador.
O martírio de Romero é diferente de como a maioria das pessoas tradicionalmente enxergam os mártires, disse Michael E. Lee, professor associado de teologia da Universidade de Fordham, em Nova York, administrada pelos jesuítas.
“Muitos de nós temos a imagem dos antigos mártires cristãos como estando diante de um imperador romano, mas aqui temos Romero, e tantos outros, que deram suas vidas na luta por justiça e pelos direitos humanos, os quais se inspiraram nos ensinamentos dos Evangelhos”, disse Lee ao Catholic News Service. “Estes são verdadeiros mártires e precisamos compreender o martírio sob uma nova ótica, por causa do exemplo que eles deram”.
O Papa Francisco tem sido um admirador assumido de Dom Oscar Romero. Ele o citou durante uma recente audiência geral no Vaticano, e quando se tornou Cardeal Jorge Mario Bergoglio, arcebispo de Buenos Aires, ele teria dito que já considerava Romero um santo.
A beatificação e canonização do arcebispo salvadorenho assassinado forneceria à Igreja e ao povo da América Latina um modelo para a paz e justiça social, disse Thomas M. Kelly, professor de Teologia Sistemática na Creighton University.
“A sua canonização iria, definitivamente, dar a estas pessoas que levam a sério o ensinamento da justiça social presente no [Concílio] Vaticano II um modelo e exemplo de santo que não temos e não tivemos até então”, disse Kelly ao Catholic News Service. “Com certeza, [a canonização] iria, penso eu, impulsionar a agenda do Papa Francisco de várias maneiras”.
As semelhanças entre o Papa Francisco e Dom Oscar Romero incluem uma profunda preocupação para com os pobres, esforços para minimizar o poder dos muito ricos e o uso do púlpito para defender os pobres e as vítimas dos abusos societários, disse.
Ao passo que muitos salvadorenhos já consideram Romero um santo, nem todo mundo está convencido de que uma sanção oficial por parte da Igreja seja necessária ou positiva, disse Claudia Bernardi, professora de artes na California College, em Oakland, Califórnia. Ela tem se envolvido na construção do sentimento de comunidade através da arte em Perquin, El Salvador.
Bernardi disse que, embora as pessoas com as quais ela trabalha honrem e reverenciam Romero, muitas se preocupam que a sua canonização possa afastá-lo das pessoas simples.
“Gostamos de pensar que ele foi um homem bom e que teve as mesmas oportunidades para ser ou não um alguém corajoso; gostamos de pensar que ele lutou por nós, que ele é humano”, e não um santo intocável, acrescentou.
Embora Zynda diga que compreende este sentimento, falou também que não acredita que o espírito de Dom Oscar Romero iria permitir que sua canonização desconecte a sua existência das pessoas de El Salvador.
Fica para os líderes eclesiais “não criar esta cultura”, disse Zynda. “Porque isso é exatamente o que estes ícones do discipulado devem ser para nós, alguém que não está distante, mas sim alguém como Jesus, com os pés no chão, que conhece a Deus e a humanidade. Assim como era Romero”.
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Possível aceleração da beatificação de Oscar Romero cria um misto de emoções - Instituto Humanitas Unisinos - IHU