15 Outubro 2014
Apenas transcorreu a metade do Sínodo do Vaticano sobre temas de família e o Papa Francisco já conseguiu sua primeira vitória silenciosa. O Pontífice convenceu muitos líderes da Igreja católica a moderar seu discurso frente às uniões homossexuais e admitir que os gays têm “dons e atributos a oferecer”.
O comentário é publicado por Religión Digital, 14-10-2014. A tradução é de Benno Dischinger.
O tom de uma posição preliminar redigida num rascunho por 200 bispos - após uma semana de discussões cerradas – mostra compaixão e entendimento não só frente a união de pessoas do mesmo sexo, senão também para casais heterossexuais que vivem juntos sem casar-se ou casais divorciados que decidem casar-se uma segunda vez sem conseguir por parte da Igreja a anulação do primeiro matrimônio.
Contudo, os bispos deixam claro que não haverá mudanças nos ensinamentos básicos do catolicismo sobre a permanência do laço matrimonial e insistiram em que um matrimônio válido só pode ser entre um homem e uma mulher.
Mas, a mudança de ênfase do Papa Francisco ao concentrar-se nos aspectos positivos da sexualidade humana, mais do que nos negativos, parece ter ganhado terreno entre os bispos que assistem ao Sínodo.
Seu predecessor, o Papa Bento XVI, se referia às relações entre homossexuais como “intrinsecamente desordenadas” num documento do Vaticano escrito em 1986, quando Bento era o principal conselheiro em temas teológicos do Papa João Paulo II.
Contrariamente, o Papa Francisco disse aos periodistas no ano passado: “Se uma pessoa busca a Deus e faz o bem, então, quem sou eu para julgar?”.
As primeiras reações de grupos católicos defensores dos direitos dos homossexuais em todo o mundo foram favoráveis à discussão levantada no rascunho elaborado em Roma.
A Associação católica Quest, situada em Londres, descreveu o documento como um “avanço” e o grupo católico estadunidense defensor dos direitos dos gays New Ways Ministry, o definiu como um “grande passo para frente”.
New Ways Ministry elogiou o documento por evitar o “grande pessimismo e fatalidade” que acompanharam prévios pronunciamentos do Vaticano sobre a homossexualidade.
Grupos católicos conservadores, tais como Voz da Família, foram duramente críticos frente ao rascunho e o qualificaram de “um dos piores documentos oficiais escritos na história da Igreja”.
O próprio Papa Francisco escutou atentamente as discussões plenárias durante a primeira semana do Sínodo, sem, todavia fazer uma importante intervenção.
No início da reunião, disse aos bispos não temer a hora de falar honestamente e de maneira aberta e não preocupar-se de dizer coisas que poderiam molestá-lo.
A maioria deles está de acordo com sua atitude mais compassiva frente aos casais que encontram dificuldades em aceitar os ensinamentos do catolicismo sobre alguns aspectos da família, como, por exemplo, os métodos anticonceptivos artificiais.
Após um ano de amplas discussões dentro da Igreja, o sínodo voltará a reunir-se em Roma em outubro de 2015, para finalizar suas recomendações sobre possíveis mudanças na disciplina da Igreja. O Papa terá a faculdade de aceitá-las ou rechaçá-las.
O Sínodo é, de fato, um corpo conselheiro sem poderes legislativos dentro da Igreja. O Papa Francisco disse que gostaria de compartilhar mais o governo da Igreja e já fez mudanças sobre as regras de debate para permitir mais discussões abertas e menos discursos repletos de formalidades.
A secretaria geral do Sínodo, após as reações e discussões surgidas após a publicação da Relatio post disceptationem, reiterou que o citado texto é um documento de trabalho, que resume as intervenções e o debate da primeira semana, e agora está sendo proposto à discussão dos membros do Sínodo reunidos nos círculos menores, segundo o previsto pelo
Regulamento do mesmo Sínodo. O trabalho dos círculos menores será apresentado à Assembléia na Congregação Geral da próxima quinta-feira pela manhã, dia 16 de outubro.
O padre Frederico Lombardi, diretor da sala de imprensa do Vaticano, iniciou a sessão informativa desta manhã com este esclarecimento, devido aos ecos e interpretações que se fizeram ontem na imprensa nacional e internacional, após a apresentação da Relatio post disceptationem.
O cardeal Filoni e o cardeal Napier acompanharam na sala de imprensa o padre Frederico Lombardi, para oferecer aos periodistas alguns detalhes sobre o documento e sobre os trabalhos que se iniciaram nos círculos menores.
Por sua parte, o cardeal Fernando Filoni, prefeito da Congregação para a Evangelização dos Povos, explicou que os 20 membros do círculo do qual ele é moderador, “temos tomado em consideração este documento que ontem de manhã tivemos ocasião de escutar e naturalmente o primeiro aspecto foi compreender a natureza do documento” e “sucessivamente entrar na metodologia, tendo em conta o modo de proceder nos círculos menores”. Uma metodologia que – como precisou – considera, acima de tudo, a satisfação que produziu a redação do documento. E, a seguir, se intervém nas partes do documento.
Ontem à tarde já fizeram as primeiras propostas dentro do grupo e nesta manhã se apresentaram os modos sobre os quais se discutiu e sucessivamente se submeteram à votação, explicou o purpurado. Também transmitiu a surpresa entre os membros do círculo menor, ao ver as reações nos meios de comunicação.
Por isso, quis recordar que “nós estamos trabalhando para por em mãos do Santo Padre um resultado sobre o qual ele mesmo decidirá, segundo o que será o terceiro momento do Sínodo”.
Em seguida, o cardeal Napier, arcebispo de Durban (África do Sul), precisou também que a Relatio pode levar as pessoas a pensar qual é a opinião global sustentada pelo Sínodo, mas é apenas um resumo. Não obstante, se mostrou esperançoso de que prevaleça o ponto de vista do Sínodo e não os pontos de vista particulares de alguns grupos. Ademais, recordou que o fim dos círculos menores é promover os aspectos positivos da família, que tem sido desenvolvidos.
Um ponto enfrentado durante o turno de perguntas tem sido o das famílias missionárias, como um dos temas abordados no Sínodo. “Está claro que, sabendo bem que depois do Concílio Vaticano II o mundo dos leigos entrou de forma plena na vida da Igreja, a família certamente não podia permanecer fora”, observou. Por isso, acrescentou, nestes 50 anos se viu as famílias participarem também na evangelização, encarregando-se deste aspecto.
“A novidade tem sido que as mesmas famílias compreenderam que elas podem ser não só objeto de evangelização, senão sujeito da evangelização”, precisou o purpurado. Uma evangelização que chega pelo testemunho que estas famílias dão nos países aos quais vão.
Sobre as excessivas expectativas criadas em torno a este Sínodo, o cardeal Filoni indicou que estas são criadas “através do nosso falar, e da imprensa”. Diria que – acrescentou – a expectativa não é uma questão de tipo ‘amanhã dou a solução a todos os problemas’. “A expectativa é que esta questão relativa à família, ao matrimônio e a todas as situações particulares estão no centro da atenção da Igreja. Esta é a primeira expectativa fundamental”, esclareceu. Além disso, o cardeal afirmou que “não deve ser uma expectativa somente desde o aspecto dos problemas”, mas também se deve recordar as famílias cristãs que “animamos” e que “também são objeto de nossa atenção”.
Finalmente, o padre Federico Lombardi recordou, a propósito da publicação da Relatio, que “o Sínodo não é algo que nasceu agora”, “é uma instituição que tem vários decênios”.
“Na comunicação do Sínodo ao exterior há etapas que estão bastante estabelecidas e formam parte do normal funcionamento do Sínodo”, acrescentou. Por isso, o porta-voz do Vaticano observou que a Relatio ante disceptationem sempre foi tornada pública imediatamente, e assim todos teriam consciência do ponto de partida do Sínodo. Assim como também a Relatio post disceptationem sempre foi publicada.
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O Papa obtém sua primeira vitória silenciosa no Sínodo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU