15 Outubro 2014
Não precisamos de uma "pastoral para as pessoas homossexuais", mas de um esforço comum bem pensado, para que sejam propostas a todos as exigências do Evangelho, com os caminhos necessários, no respeito absoluto de cada pessoa.
A opinião é de Dom Claude Dagens, bispo de Angoulême, na França, e membro da Académie Française. O artigo foi publicado na revista La Croix, 13-10-2014. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Há dois meses, fui convidado a proferir conferências em um departamento do norte da França, em diversas paróquias. Fiquei feliz em ser acolhido calorosamente e poder mostrar que a presença, a palavra e a ação do Papa Francisco chamam a todos nós a uma renovação da nossa existência cristã na sociedade.
Em vez de lamentar o passado ou de encontrar culpados, é bom reconhecer a pessoa de Jesus Cristo como o coração vivo da nossa vida e da nossa Igreja e relocar outras realidades na perspectiva da relação com esse centro essencial, como está tentando fazer o Sínodo atualmente reunido em Roma sobre os "desafios pastorais da família no contexto da nova evangelização".
Sei e creio que o Espírito Santo é dado aos apóstolos, desde o início da missão cristã, no primeiro Sínodo em Jerusalém, reunido para enfrentar novas situações e para decidir o que é bom para o povo de Deus, para essa Igreja circumdata varietate (cercada pela diversidade), como escrevia Santo Agostinho.
Depois da última das minhas palestras, me envolvi, apesar da minha vontade, em um incidente que me pôs a dura prova. Um casal, conhecido na comunidade paroquial, estava de pé no meio da nave da igreja. Fui cumprimentá-los. Eles se recusaram a apertar a minha mão e começaram a me insultar com violência. Tentei ouvir, mas era uma erupção de palavras cheias de ódio, a pior das quais foi pronunciada pelo marido, depois que a mulher me insultou como se eu fosse um inimigo. Esse homem me disse, de modo glacial, fixando-me nos olhos, como para me atacar: "O senhor está possuído por Satanás! Deve ser exorcizado!".
Fiquei espantado, e nós estávamos no meio da igreja, debaixo de um grande crucifixo que eu olhei com insistência. Fiquei em silêncio. Não tive medo, mas entendi que, sem querer, tinha provocado naquele homem e naquela mulher uma daquelas reações instintivas que têm a sua origem em um inconsciente muito profundo, como uma erupção vulcânica.
O padre e os outros membros da comunidade paroquial haviam se afastado. Não havia nada a fazer. Esse casal enfurecido e zangado, no fim, deixou a igreja, e eu pude reencontrar dos fiéis "normais" que estavam estupefatos com a agressão verbal, que vinha de pessoas respeitáveis que participam habitualmente da missa naquela igreja, mas que haviam se revelado católicos cheios de ódio.
Pude entender, em seguida, o que tinha provocado tal explosão de ódio. Entre os sinais da ação de Deus em nosso meio, na minha conferência, lembrei o seguinte (cito a mim mesmo): "Pessoas homossexuais que não ousam ou que não querem falar do que é constitutivo da sua existência, mas que não duvidam de ser também eles filhos de Deus, chamados a amar e a ser amados. Sem esquecer os pais e as famílias dessas pessoas homossexuais que são atormentados entre a rejeição dessa realidade ou a sua aceitação fácil e superficial".
Tenho motivos para pensar que essas palavras ponderadas e fundamentadas no conhecimento dessas situações e dessas pessoas tinham sido capazes de provocar a reação daquele homem e daquela mulher fiéis a uma certa tradição – puritana mais do que cristã –, segundo a qual a homossexualidade é uma doença que deve ser curada, e que as pessoas homossexuais, se permanecerem como tais, não têm direito a um reconhecimento social, com o risco, assim, de induzi-las a viver a própria vida sexual como um conjunto de transgressões ocultas e de encerrá-las na rejeição.
Não me resigno a esse ódio que percebi nas palavras desse casal sofredor e que o sofrimento tinha enfurecido. Sei, por experiência, que as nossas comunidades paroquiais comuns podem e devem fazer todos os esforços para que seja possível às pessoas homossexuais:
- nunca se desesperarem de si mesmas;
- viverem uma vida cristã real, feita de oração e de caridade ;
- terem um lugar na vida ordinária da Igreja, participando da sua missão.
Não precisamos de uma "pastoral para as pessoas homossexuais", mas de um esforço comum bem pensado, para que sejam propostas a todos as exigências do Evangelho, com os caminhos necessários, no respeito absoluto de cada pessoa.
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Homossexuais: um encontro difícil e revelador. Artigo de Claude Dagens - Instituto Humanitas Unisinos - IHU