15 Outubro 2014
Um novo vento está soprando no Sínodo Extraordinário dos Bispos sobre a família. Um vento que está trazendo de volta o "espírito" e até "o caráter" do Concílio Vaticano, disseram vários padres sinodais. É um vento que revela um desejo claro da Igreja para o diálogo com a família de uma maneira nova, positiva e esperançosa, do jeito que ela está no mundo de hoje, com suas variações e problemas e, neste contexto, com a questão da homossexualidade.
A reportagem é de Gerard O'Connell, publicada no sítio da revista America, 13-10-2014. A tradução é de Claudia Sbardelotto.
Muitos documentos foram escritos ao longo dos anos justamente na metade da jornada dos sínodos, mas eu não me lembro de nenhum como este nos últimos dois pontificados de forma a refletir uma abordagem nova e um espírito aberto da Igreja com relação à coabitação, às situações matrimoniais irregulares e aos homossexuais. E o faz com uma novidade de linguagem que respeita as pessoas e evita expressões ou termos que são ofensivos ou que as pessoas comuns não consigam entender. Assim, por exemplo, o texto não fala de homossexualidade como "intrinsecamente desordenada", nem utiliza o termo "lei natural".
Levando-se em conta que esse documento de quatorze página já provocou muitos comentários na mídia, é importante sublinhar que ele é um texto provisório, não definitivo, e assim, nesta fase, não se deve superestimá-lo. Podemos apenas obter desse texto algumas indicações, mas não conclusões finais.
Apresentado ao Sínodo na manhã de 13 de outubro pelo cardeal húngaro Peter Erdö, relator geral, o documento resume o principal material apresentado pelos 253 participantes durante a primeira semana do Sínodo.
O texto foi redigido pelo relator-geral e pelo secretário especial (arcebispo Bruno Forte) com a ajuda de uma equipe de especialistas e pelo secretário-geral (cardeal Lorenzo Baldisseri). Os seis novos membros que o Papa Francisco adicionou à equipe para elaborar o relatório final não estavam envolvidos nessa etapa, mas eles vão estar na redação do relatório final do Sínodo.
O texto servirá de base para a discussão em dez grupos lingüísticos do Sínodo nos próximos dois dias, e, com base em sua resposta, ele será revisto. Sabe-se que um número de padres sinodais estão claramente descontentes com partes do texto; alguns acharam que ele não deveria ter sido liberado para a mídia, enquanto outros levantaram objeções significativas na sala do sínodo após a sua apresentação e pretendem tentar apresentar alterações através dos grupos linguísticos se puderem convencer os seus componentes a apoiá-los. O texto revisto será apresentado ao plenário no dia 18 de outubro para aprovação como o relatório final do Sínodo.
Dito isso, é de fato muito significativo ver que esse texto provisório procura os elementos positivos nas várias e diversificadas situações em que os casais vivem: desde coabitação, a casamento e uniões irregulares até as uniões homossexuais (que ele afirma claramente não estarem equacionadas com o matrimônio). Ao invés de se envolver com o dedo abanando ou apontando as limitações, falhas ou defeitos (a partir do ponto de vista da Igreja) nessas situações, ele olha para elas com ternura e misericórdia, mantendo a clareza de um professor, insistindo na importância de acompanhar as pessoas em suas diferentes e, muitas vezes, complexas situações.
Isso é tanto uma mudança de tom quanto uma mudança de perspectiva que está muito em linha com a visão do Concílio Vaticano II, como refletida, em especial, no seu maior documento sobre "A Igreja no Mundo Moderno" ("Gaudium et Spes") , e nas mensagens emitidas pelo Papa Paulo VI, no final do Concílio.
Acima de tudo, o texto desse Sínodo está profundamente enraizado na compreensão da misericórdia e de uma Igreja missionária, que Francisco vem falando desde a sua eleição como papa 20 meses atrás. É uma grande conquista do papa, que veio "do fim do mundo", conseguir fazer tantos bispos - eu não digo todos - compartilhar a sua visão e adotar uma abordagem indutiva ao invés de dedutiva para a ampla gama de problemas e questões relacionadas com a família, e para com as relações humanas associadas.
Três coisas me impressionaram, particularmente, na escuta do relatório pelo cardeal Erdö. A primeira é a abordagem surpreendentemente positiva que o Sínodo traz em questões como a coabitação, o casamento civil, uniões irregulares e a sua tentativa evidente de procurar formas de responder à delicada questão da admissão de divorciados novamente casados ao sacramento da Reconciliação e da Eucaristia.
A segunda é a abertura do Sínodo para os homossexuais e como a Igreja deve acolhê-los. Foi interessante notar que, na conferência de imprensa, o cardeal Erdö tendia a passar as questões mais problemáticas relacionadas com a questão da Igreja e os homossexuais ao arcebispo Forte, o secretário especial do Sínodo. Pode-se dizer que ele era o chefe redator do texto, pelo menos, a seção sobre esse assunto?
Em terceiro lugar, o cardeal Erdö observou que "o que soou claramente do Sínodo foi a necessidade de opções pastorais corajosas" e que ao cuidar das "famílias feridas", o Sínodo diz que "não é prudente pensar em soluções únicas ou aqueles inspiradas por uma lógica de 'tudo ou nada'".
Ainda teremos que ver quais acréscimos e/ou alterações serão feitas a esse texto nos próximos dias, e quais seções - se houver - estarão sujeitas à uma maior revisão. Deveremos saber isso até o início da próxima semana se o texto for liberado para a imprensa.
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Um vento novo está soprando no Sínodo sobre a família - Instituto Humanitas Unisinos - IHU