Por: André | 19 Março 2014
“Durante o século XX nenhum Papa teve tantas resistências como Francisco”, e todas elas “são sinal de que o Papa está mudando a Igreja”. São palavras fortes e em certo sentido surpreendentes. Elas foram escritas pelo professor Andrea Riccardi, historiador da Igreja, em um comentário publicado na revista Famiglia Cristiana. O Vatican Insider o entrevistou para indagar a respeito.
Fonte: http://bit.ly/1gBMWd4 |
A entrevista é de Andrea Tornielli e publicada no sítio Vatican Insider, 18-05-2014. A tradução é de André Langer.
Eis a entrevista.
Você escreveu que durante o último século nenhum Papa teve “tantas resistências como Francisco”. Não lhe parece exagerado?
Fiz essas afirmações como historiador. Francisco encontra-se diante de resistências internas nas estruturas eclesiásticas, nos episcopados e no clero. Enquanto é evidente a aliança que se instaurou com o povo.
E as oposições que Paulo VI enfrentou, ou as mais recentes que Bento XVI teve que enfrentar?
O único Papa que teve uma forte oposição foi, certamente, Paulo VI. Mas naquela época estava se vivendo um momento de protestos generalizados que afetaram tanto a Igreja como a sociedade. Enquanto as oposições contra Bento XVI, que você justamente recorda, eram mais da opinião pública externa e internacional. Repito, as que Francisco enfrenta são, na minha opinião, mais fortes e provêm do interior.
Poderia indicar alguns exemplos?
Há algumas que se manifestaram publicamente, outras foram sussurradas e outras não foram expressas e se caracterizam pelo silêncio e a distância. Há alguns que não suportam a menor insistência na pregação papal sobre temas éticos. Mas também o enfoque pastoral de Francisco, que coloca em discussão a forma de governar dos bispos, aos quais as pessoas dizem: “Por que não fazem como o Papa?” Não quero generalizar indevidamente, mas estou convencido de que estas resistências existem. Além disso, Francisco, nos primeiros meses do Pontificado, disse tudo o que pensa e indicou quais são os pontos sobre os quais se deve trabalhar e mudar. Não fez como Paulo VI, que se expressava a “conta-gotas”, tratando de ser equilibrado. As resistências provêm daqueles que não querem ser questionados e não querem mudar.
Por que o silêncio, na sua opinião, equivale a uma “resistência”?
É uma atitude, como se não tivesse acontecido nada, como se o Papa não fosse o testemunho de um modelo que é preciso seguir. Há alguns que destacam que Francisco é pouco “teólogo”. Dá-me vontade de rir quando penso naqueles que diziam que Bento XVI era muito “teólogo” (isto demonstra que o “Papa bom” sempre é o de antes). Claro, não é preciso dizer que estas resistências chegam daqueles que durante anos destacavam a importância da autoridade do Papa e da obediência ao Papa. É curioso que para alguns seja válido este raciocínio: se o Papa não é como eu digo e não faz o que eu digo, é um Papa pela metade. Mas o catolicismo não é uma ideologia, é uma força dinâmica que cresce na história. Quero repetir: não se deve generalizar, porque há muitos bispos muito entusiasmados, e nos lugares em que a mensagem de Francisco chegou (nem sempre chega a todos os lados) há uma reação muito grande e positiva na vida da Igreja em nível popular.
Algumas das críticas mais duras chegam da galáxia de sítios e blogs do chamado mundo tradicionalista, mas também (pelo menos no caso italiano) dos círculos midiáticos-intelectuais, como no caso dos artigos publicados pelo jornal Il Foglio...
Sim, mas os conteúdos que você indica são, de qualquer maneira, expressão compartilhada por setores do mundo eclesial. É uma reação de uma certa visão da sociedade secularizada na qual um cristianismo minoritário combate por certos valores éticos. Francisco, ao contrário, fala de um cristianismo do povo, mais missionário.
E como vê a reação dos movimentos diante do novo Pontificado?
O cristianismo não é uma ideologia, a Igreja não muda de “linha”, como os partidos políticos, mas, como disse, cresce na história. Os católicos são fiéis ao Papa desde Pio XII até Francisco. Isto significa ser católico. Do contrário, tudo se torna ideologia. E hoje há reduções e visões ideológicas que estão pulando. Também os movimentos devem se sintonizar com a Evangelii Gaudium e não auto-reproduzir-se a si mesmos.
Durante os primeiros meses de Pontificado houve alguns que prognosticavam (e em alguns casos pareciam esperá-lo) o final da chamada “lua de mel” entre o Papa, a imprensa e as pessoas. Ao contrário, parece continuar...
A lua de mel não acabou porque não é um fenômeno midiático, mas algo que vai muito além, pois tem muita substância. Claro, o passo necessário na Igreja é acolher o que Francisco oferece como testemunho e um modelo de evangelização e de pastoral que propõe. O modelo que um Papa que nasceu, viveu e foi bispo de uma megalópole como Buenos Aires propõe está verdadeiramente à altura dos desafios da nossa época.
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“Estes são aqueles que resistem a Francisco”, revela Andrea Riccardi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU