17 Fevereiro 2014
Sete mulheres jovens e menos jovens, crentes e laicas escrevem abertamente ao papa sobre o papel das mulheres e das teólogas na Igreja, e se esta realmente quer mudar de rosto com relação às mulheres.
Publicamos aqui a carta de uma delas, a jornalista e ex-deputada italiana Mariella Gramaglia, professora da Universidade de Teramo, em artigo publicado na revista Leggendaria, n. 103/2014. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Caro Francisco,
Não se preocupe, se acaso ver estas linhas, nem se preocupem as leitoras: não se trata de uma mensagem carta. É difícil dirigir pergunta abstratamente. Portanto, a carta é a forma retórica que melhor se adapta às minhas impertinências. Sim, porque eu serei impertinente. Portanto, para me fazer com que me perdoe, ponho como premissa uma captatio benevolentiae. Sincera, porém.
O senhor é muito simpático para mim. Digo mais: a sua proximidade (a sua casa dista da minha apenas uma estação do trem urbano) me inspira um sentimento de proteção e de quietude. Às vezes, eu chego a perceber isso. Pode ser a minha velhice, pode ser a total ausência de autoridade masculina neste nosso pobre país, mas o fato é que eu gosto muito do senhor.
O senhor pode pensar que eu sou uma fiel ou uma convertida. Na realidade, não sou nada. E o nada é um lugar onde muitos espíritos religiosos defendem que não é muito desconfortável para ficar. Eu penso, como o cardeal Martini, que "o mundo, mais do que entre crentes e não crentes, se divide entre pensantes e não pensantes", e acredito também, como os meus amigos do Mosteiro de Bose, que às vezes todos somos crentes e às vezes não o somos.
As minhas vezes de crente são muito breves, mas me levam a intuir alguma coisa, talvez, de elementar: que os ateus trazem em si uma ingênua inveja dos crentes, a inveja pela ilusão da imortalidade, e que essa inveja os torna agressivos ou suficientes.
1. Por que o senhor não entende que o conceito de igualdade e o de diferença não estão em conflito um com o outro? Eu não gostei nada da sua resposta a um jornalista do La Stampa: "Nomear uma mulher cardeal seria uma forma de clericalização; não devemos clericalizar as mulheres".
Veja, essa é uma armadilha infernal. A única atenuante é que até mesmo o feminismo lhe oferece um álibi: muito frequentemente, ele usou o pensamento da diferença para se isentar dos duríssimos desafios da igualdade. Nomeie as mulheres como cardeais, coloque-as à frente das Congregações, decida-se à ordenação sacerdotal em tempos históricos, já que nada obsta em termos de dogma e de doutrina.
Depois, se as consagradas ou as princesas da Igreja souberem expressar uma diferença, se forem capazes de tornar a Igreja mais democrática e inclusiva, mais comunidade dos fiéis, e menos Cúria, tanto melhor assim. Eu, para dizer a verdade, estaria pronta a apostar nisso, se vocês praticarem a justiça e a igualdade como convém a uma comunidade que aspira à virtude.
Além disso, o truque da vocação feminina diferente é conhecido até pelos leigos, e muito bem: eles tiveram que renunciar a ele obtorto collo, porque, no contrato social, a tradição não é um valor. Mas o senhor deve se apressar.
2. A sua linguagem é muito bonita. Misericórdia, custódia, diálogo, discernimento, fronteira. Não sei qual dessas palavras eu gosto mais e me encanta o seu modo de enrolá-las como um novelo na entrevista com Antonio Spadaro. Certamente, o senhor não é um padrezinho ingênuo: o senhor também estudou psicanálise sobre os textos de Michel de Certeau, aluno de Lacan.
Mas, então, como lhe vem à mente dizer, ainda na entrevista a Spadaro: "Eu acredito em Maria [...] aquele rosto maravilhoso [...] que eu quero conhecer e amar"? Isso me dá alergia. Mas, em suma, justamente o senhor que diz magnificamente que "a verdade é relação" não tem nenhuma relação com o seu inconsciente? Não lhe vem a dúvida de que, em um mundo e em uma vida feita totalmente de seres humanos e entre seres humanos, essa "virgem bela mais do que criatura" é uma projeção não resolvida do feminino, uma parte da Anima, diria um junguiano, que o senhor não integrou?
O Mestre Eckhart, um grande místico, dizia: "Peço a Deus que me livre de Deus". Eu acho que ele se referia às incrustações antropológicas da imagem do divino. Também se poderia rezar para ser liberto de Nossa Senhora? Ou é blasfêmia?
3. Ainda não me resigno ao fato de que, ao se despedir de Eugenio Scalfari, o senhor lhe disse: "Vejamo-nos novamente para falar do papel das mulheres na Igreja". Mas o que o senhor quer que Scalfari entenda das mulheres e das mulheres na Igreja? Um idoso patriarca arrogante. Ouça, Francisco, fale conosco. O senhor não tem nada mais do que o embaraço da escolha.
Do Vaticano II em diante, a ciência teológica e a competência das mulheres se multiplicou, e já existe uma tradição de palavras femininas sobre o divino. Sem falar das chamadas não crentes, filas de criaturas cultas e inteligentes. Avisamos que não nos isentaremos. Se o senhor quiser, podemos trazer um jarro como a Samaritana e dar-lhe de beber, se o senhor tem sede.
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Três perguntas a Francisco sobre as mulheres. Artigo de Mariella Gramaglia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU