Por: Cesar Sanson | 03 Fevereiro 2014
No comando de uma área repleta de conflitos, a presidente interina da Funai (Fundação Nacional do Índio), Maria Augusta Assirati, 36, diz que a violência contra indígenas está se "banalizando". Em entrevista à Folha de S.Paulo, 02-02-2014, ela admite que, sozinho, o órgão não consegue lidar com o barril de pólvora das disputas entre índios e produtores rurais. Há sete meses no cargo, ela só teve uma reunião com a presidente Dilma Rousseff.
Anteontem, um dia após a entrevista, cinco índios foram presos no AM sob suspeita de matar três homens. Em nota, a Funai disse desconhecer os motivos das prisões e afirmou monitorar a situação.
Eis a entrevista.
Os conflitos indígenas no Brasil têm se agravado. Por que se chegou a esse ponto?
De uns anos para cá, as demarcações de terras indígenas estão concentradas na porção sul e centro-sul do país. São regiões difíceis de se trabalhar, porque muitos agricultores têm títulos das terras.
O governo Dilma foi o que menos homologou terras indígenas desde FHC. Por quê?
Sobretudo por essa intensificação dos conflitos. Para evitar conflitos com desfecho negativo, o governo estabeleceu mesas de diálogo.
Há na Funai sete estudos sobre terras indígenas que esperam a sua assinatura para ter continuidade na demarcação. Por que não assina?
Um pouco em função dessa orientação; onde o governo compreendeu que pudesse gerar conflito, se pensou em fazer um diálogo prévio.
Isso não agrava os conflitos?
O governo federal é composto por diversos órgãos. A nossa posição nesses diálogos é no sentido da defesa dos direitos indígenas. Mas o governo federal é mais amplo.
Segundo o Cimi [Conselho Indigenista Missionário], a média anual de índios assassinados passou de 20,9 nos mandatos de FHC para 56 nas gestões de Lula e de Dilma. Há descaso do governo?
Os indígenas ainda estão no centro de ação de grande preconceito, de racismo, e são vítimas, ainda, de uma violência grande no país.
O que o governo tem feito para resolver esses conflitos?
Essa iniciativa da mesa [de negociação] foi interessante porque é justamente voltada para a redução dos conflitos, mas é um caminho longo. Acredito que se chegou a um ponto de uma banalização desse tipo de violência.
A estrutura da Funai é insuficiente?
A Funai tem atuação em todo o Brasil e atende segmentos da população que estão em lugares com logística difícil de acesso. Precisamos ter presença mais frequente do ponto de vista da proteção territorial; garantir que áreas já regularizadas não sejam ocupadas para exploração ilícita de recursos naturais.
O que acha da proposta de dar ao Legislativo a atribuição de demarcar terras indígenas?
Na perspectiva da Funai, é bastante negativa, porque atrasaria em muito os processos e traria uma série de componentes políticos, de disputas entre segmentos que integram o Congresso.
E da proposta do Ministério da Justiça de incluir outros órgãos nas demarcações?
O decreto que rege a regularização fundiária das terras indígenas já tem um dispositivo que prevê a possibilidade de consulta a outros órgãos. A portaria propõe a regulamentação da forma de participação desses órgãos. Se eles tiverem efetivamente a capacidade de contribuir, a ação é bem-vinda.
Os conflitos na construção de Belo Monte vão se repetir na região do rio Tapajós (PA), onde o governo quer licitar novas hidrelétricas?
Esperamos que não. Por termos aprendido com a experiência de Belo Monte, esperamos fazer melhor.
Existe pressão do governo para ser permissiva em áreas onde há interesse em realizar obras de infraestrutura?
É evidente que existe uma necessidade de priorizar ações. Todos os órgãos intervenientes, como o Ibama, são sempre instados a ter manifestações céleres em ações prioritárias para o governo.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Violência contra índio está banalizada, diz presidente da Funai - Instituto Humanitas Unisinos - IHU