Por: Cesar Sanson | 14 Janeiro 2014
Os índios tenharim e jiahui decidiram em assembleia nesta sexta-feira (10) na aldeia Marmelos que só aceitarão discutir sobre a cobrança de pedágio na rodovia BR-230 (Transamazônica) com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, pasta da qual a Funai (Fundação Nacional do Índio) é subordinada.
A reportagem é do sítio Amazônia Real, 10-01-2014.
Eles dizem que a Funai recebeu há mais de quatro anos um relatório com pedidos de compensação pela construção da estrada e até hoje não tomou uma decisão para resolver o problema. A cobrança do pedágio na Transamazônica é um dos principais alvos dos protestos de não indígenas iniciados no final de dezembro, no sul do Amazonas, especialmente pelas populações dos municípios Humaitá, Manicoré e Apuí.
Os índios também confirmaram que estão se preparando para retomar a cobrança de taxas aos motoristas no próximo dia 1º. de fevereiro. Nesta sexta-feira eles iniciaram a reconstrução das cinco bases do pedágio (incluindo as cancelas) ao longo do trecho de 120 quilômetros da rodovia que fica dentro da terra indígena Tenharim Marmelos, em Manicoré, no sul do Amazonas.
A presidente Dilma Rousseff determinou o envio de uma comissão à região para pacificar o conflito, que ocorre desde o dia 25 de dezembro na região. O ministro Celso Amorim (Defesa) foi convocado para coordenar a discussão em Brasília.
Uma comissão de paz formada por representantes do ministérios da Defesa, da Justiça, da Secretaria-Geral da Presidência da República, além do vice-governador do Amazonas, José Melo e do general Eduardo Villas Bôas, esteve neste domingo (12) no município de Humaitá para reuniões entre índios e não-índios.
Segundo o líder indígena Aurélio Tenharim, o debate com a pasta da Defesa não foi aceito pelos índios tenharim e jiahui. O envio de uma comissão pela presidente também não agradou os indígenas.
“A gente quer que venha o ministro da Justiça (José Eduardo Cardozo), o ministro dos transportes (César Borges) e a presidente da Funai (Maria Augusta Assirat). Não adianta o governo mandar pessoas apenas para passar mensagem. Eles vão perder tempo porque não decidem nada. O pedágio envolve todos esses órgãos, por isso queremos que os ministros venham aqui na aldeia Marmelos”, disse Aurélio.
Cobrança
Segundo Aurélio Tenharim, os indígenas sabem que o clima de ameaças contra eles continua, mas todos estão dispostos a enfrentar a hostilidade e recomeçar a cobrança do pedágio. “Sabemos que a situação continua tensa, mas os índios decidiram e hoje (10) confirmaram em assembleia que a cobrança vai recomeçar. Se decidirem prender a gente, todos os índios vão ser presos”, disse.
A cobrança do pedágio pelos tenharim e jahui é feita desde 2006, quando estes entenderam que tinham direito à compensação pelas obras de construção da rodovia Transamazônica. A estrada foi construída dentro da reserva sem licenciamento ambiental. Os indígenas nunca foram consultados ou receberam ressarcimentos pelos danos.
“Por que o pedágio é necessário? Porque muitas vidas se perderam na abertura da Transamazônica. Essas vidas nunca serão pagas, mas queremos compensações por elas. Queremos compensar a morte de nossos pajés, que hoje não temos mais, a morte de crianças, de velhos, das parteiras. Nossos recursos naturais diminuíram. Tudo ficou mais difícil após a rodovia e nunca o governo nos deu alternativa de sobrevivência”, disse Aurélio Tenharim.
Em 2007, com apoio da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) os índios tenharim contrataram uma antropóloga para fazer um relatório técnico com o objetivo de dar uma solução ao conflito surgido a partir da instalação de barreiras na BR-230.
O estudo, do qual o portal Amazônia Real teve acesso, faz um levantamento sobre a história dos tenharim e sua relação com a sociedade não-indígena. O documento foi apresentado à Funai há quatro anos, mas os tenharim nunca obtiveram resposta do órgão, segundo Aurélio Tenharim.
Em 2013, o estudo foi entregue, junto com outras demandas, ao Ministério Público Federal do Amazonas. Nesta nova demanda, os indígenas pediram ao MPF que os incluíssem na lista da Comissão Nacional da Verdade, criada para investigar violações de direitos humanos durante a ditadura militar nos anos 70. Um inquérito foi instaurado pelo MPF.
Divisão
A população de índios tenharim é de 800 pessoas e de jiahui, de 136 pessoas. Todas as famílias são beneficiadas com a arrecadação do pedágio. Na Terra Indígena Tenharim Marmelos são 10 aldeias e na Tenharim do Igarapé-Preto, três. A terra dos jiahui é menor, composta por duas aldeias, que estão sobrepostas a uma unidade de conservação, a Floresta Nacional de Humaitá.
A renda da cobrança do pedágio é dividida em 27 grupos formada por 10 ou 15 famílias que se revezam na barreira. A média da renda arrecadada é de R$ 20 mil para cada um dos 27 grupos. Com os recursos, os indígenas bancam desde pertences pessoais a tratamento de saúde e acesso à educação.
“O pedágio foi a maneira que encontramos para termos projeto de sustentabilidade pois isto nunca nos foi oferecido. Sabemos que os waimiri-atroari, que também tiveram suas terras atravessadas por uma rodovia, conseguiram compensação anos depois. Mas não queremos ter compensação como fazem com eles, que só recebem por meio de projetos. Queremos que a compensação venha direto para nossas famílias, sem a intermediação de outras pessoas, como acontece com os waimiri-atroari”, disse Aurélio.
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Índios tenharim querem presença de ministro da Justiça na reserva - Instituto Humanitas Unisinos - IHU