Por: Jonas | 29 Julho 2013
Em seu encontro com jovens argentinos na Catedral do Rio de Janeiro, Francisco pediu perdão aos bispos presentes por promover a discussão interna dentro das dioceses. Milhares passaram a noite rezando para poder ver o Pontífice.
A reportagem é publicada no jornal Página/12, 26-07-2013. A tradução é do Cepat.
Por alguns minutos, Francisco deixou de ser o papa e voltou a ser Jorge Bergoglio. Então, inclinou-se sobre o púlpito da Catedral do Rio de Janeiro, pôde deixar de lado o jargão e falar simplesmente em argentino. “Quero agitação”, pediu aos jovens esperaram, durante muitas horas, para estar ali e que agora agitavam bandeirinhas azuis e brancas. “Quero que a Igreja vá à rua, caso contrário, torna-se uma ONG”, disse num discurso curto, mas concreto. De antemão, aos bispos argentinos que o escutavam do lado do altar, pediu perdão pelas dificuldades que a agitação poderia chegar a provocar. “É o que eu penso”, justificou.
Foi no arranque da mensagem e disse que isso era o que esperava como resultado da Jornada Mundial da Juventude. Que sabia que ali na Catedral tinha agitação, também no Rio de Janeiro durante estes dias, mas que queria “agitação nas dioceses”. Reivindicou uma Igreja na rua para que “defendamo-nos de tudo o que seja mundanismo, comodidade, clericalismo, ou que signifique ficar fechado em nós mesmos”, completou.
Os bispos explicaram que o encontro com os argentinos, no Rio de Janeiro, foi um pedido do próprio Francisco, talvez para compensar o fato de ainda não existir data certa para uma visita à Argentina, embora, por certo, seja muito solícito em atender aos argentinos que vão vê-lo no Vaticano. O problema é que se calcula que há cerca de 40.000 argentinos no Rio de Janeiro, por conta da Jornada, e a Catedral Metropolitana tem capacidade para cinco mil. Por isso, muitos resolveram fazer uma vigília e passar a noite em frente à Catedral, apesar da chuva e do frio. À meia-noite já tinha dois quarteirões cheios. Os últimos que conseguiram entrar foram os que chegaram às 5h00s. Passaram a noite rezando e cantando para não dormirem. Grupos de outros países da América Latina tentaram entrar. “Explicávamos-lhes que era somente para os argentinos”, dizia uma jovem de Rio Negro. Também não existiam possibilidades. Para entrar era preciso mostrar a credencial, mesmo os jornalistas.
Às 11h30min, já estava cheia. A Catedral do Rio de Janeiro fica no centro da cidade, é um edifício de estilo moderno. Uma espécie de cone de concreto, com 75 metros de altura. Dizem que o arquiteto se inspirou em Apolo, como símbolo do futuro. Do teto em forma de cruz saem linhas de vitrais que iluminam o interior. Francisco, que vinha da visita à favela de Varginha, chegou quando já passava das 12h30min. Parou para saudar os muitos milhares que estavam esperando do lado de fora. Lá dentro, uma banda havia feito a animação, cantando os clássicos juvenis católicos, como “Jesus, eu te seguirei”. Tinha muito da marca argentina: camisetas de Messi e até coisas penduradas nos cercados. Por exemplo, o que pendurou um jovem de “La 33”, um grupo católico de Rosário, uma bandeira com o rosto de muitos outros jovens como ele. “São meus companheiros que morreram no ano passado, em um acidente, queria que estivessem aqui com o Papa”, explicava emocionado.
Quando apareceu a figura branca pelo portão de bronze, o cone se estremeceu com a gritaria. “Esta é a juventude do Papa”, era um dos refrãos. “Se esta não é a Igreja, a Igreja onde está?”, outro. Francisco foi cumprimentando até chegar aos primeiros locais destinados aos deficientes, onde também estava Mariano, um garoto de Rafaela, que na realidade sofreu uma fratura jogando futebol e aproveitou a cadeira de rodas para o lugar preferencial. “Pedi-lhe um bispo para meu povo”, diria depois. Bergoglio, em seguida, saudou seus amigos, os bispos, que também tiravam fotos e filmavam.
O Papa sabia que não tinha muito tempo para o encontro que entrou apertado em sua agenda, assim, foi direto ao assunto. “A Igreja não pode ser uma ONG”, advertiu. Bem portenho, considerou que a civilização mundial “passou dos limites” em seu culto ao dinheiro e que foi criada uma exclusão dos dois polos da vida: os velhos e os jovens. No tema dos anciãos, chegou a dizer que se tratava de “uma eutanásia escondida”, também no sentido de que não eram ouvidos, nem se prestava atenção neles. Em relação aos jovens, insistiu em sua advertência no fato do perigo de haver uma geração que não conheça “a cultura do trabalho”, devido às dificuldades dos jovens para conseguir emprego, algo que também se tornou um problema para as nações europeias submergidas na crise.
Francisco contou que tinha planejado o encontro para estar mais próximo dos argentinos, mas que tinham ficado um pouco longe e brincou acerca do cercado: “Tenho pena que estejam enjaulados”, ironizou. E disse que os compreendia muito bem, dando a entender que ele se sentia igual, mas que era compreensivo em razão das precauções em matéria de sua segurança. “É feio estar enjaulado”, concluiu.
A saída foi de novo a todo fervor. Alguns se abraçavam e choravam. Houve quem levou uma camiseta de San Lorenzo, com a intenção de que o Papa a abençoasse, beijasse ou algo parecido, mas nem a viu. “Depois pedi ao segurança porque é a única que tenho”, explicava Federico Pérez, portenho, já com a camiseta vestida. Muitos ficaram tirando fotos perto do púlpito onde Francisco havia falado, para que ficasse uma lembrança. Lá se encontravam as jovens da paróquia São Francisco de Assis, de Neuquén. “Viajamos três dias num micro-ônibus, de Neuquén a Porto Alegre, onde estivemos numa jornada de oração. Em seguida, outros três dias até chegar ao Rio de Janeiro. No total, seis dias de micro-ônibus. Chegamos aqui, para entrar na fila às 5h00s e a verdade é que o vimos um pouco longe; do alto, de onde estávamos, não se escutava muito bem. Contudo, também valeu a pena”, convenciam-se. Como elas, centenas de paróquias e grupos católicos vindos de todo o país se esparramavam pelos arredores. Alguns continuavam cantando ou rezavam, muitas vezes, dirigidos por um sacerdote. Pelo menos um milagre já tinha acontecido, lá fora tinha parado de chover.
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O Papa quer que haja “agitação” nas paróquias - Instituto Humanitas Unisinos - IHU