Por: Jonas | 10 Julho 2013
Segundo o jesuíta José Luis Pinilla, diretor do Secretariado da Comissão Episcopal de Migrações da Espanha, a visita de Francisco a Lampedusa é “um gesto a mais de um Papa que carrega em seu DNA a dor e a preocupação permanente com a imigração”. O artigo é publicado no sítio Religión Digital, 08-07-2013. A tradução é do Cepat.
Eis o artigo.
Fonte: http://goo.gl/r6pza |
Quando o Papa decidiu viajar para Lampedusa, além das tristes recordações e imagens que esta ilha evoca a respeito da imigração, fez me lembrar do filme “Terraferma”, que estreou na Espanha, há um ano, e que foi filmado nesta ilha. Sua trama é o reflexo de um drama semelhante ao que vivemos em nossas costas, quando de maneira irônica e trágica os banhistas do sul da península, que desfrutam de seu descanso, misturam-se com os emigrantes recém-chegados, exaustos e quase moribundos, desembarcando das barcaças que não são mais do que balsas quase de brinquedo.
O diretor é um italiano chamado Emmanuele Crialese, que já se rebelou contra o costume social de colocar etiquetas nas pessoas, e que por isso tratou de excluir, em seu filme, alguns termos como “ilegal”, “extracomunitário” ou “imigrante”, considerando-os expressões depreciativas e segregacionistas.
Então, construiu um mundo imaginário, que foi o melhor caminho para poder tratar destes assuntos, sem ter a necessidade de cair nestes tipos de concepções. Em algumas entrevistas compartilhou suas emoções. São também as minhas.
Por exemplo, quando se dava conta do destino, às vezes trágico, dos clandestinos que perecem querendo chegar às costas. E, ao mesmo tempo, o assombro diante da vontade daqueles que conseguiram sobreviver a tal périplo. É esta coragem das pessoas, que fogem para conseguir alcançar um futuro melhor, que o realizador quis ressaltar com seu filme, uma ode à odisseia moderna destes milhares de imigrantes de Lampedusa. Uma coragem semelhante ao de muitos de nossos imigrantes, diante de tantos cortes sociais que deixam muitas pessoas jogadas nas praias do asfalto urbano.
‘Terrraferma’ que ganhou o Prêmio do Jurado, na 68ª edição do Festival de Cinema de Veneza, no ano de 2011, é a história de uma Sicília sem contaminar, fundamentalmente habitada por pescadores. Embora praticamente não conheçam o turismo, os moradores da ilha estão começando a mudar de mentalidade ao perceberem o potencial desta nova indústria.
Ao mesmo tempo, precisam enfrentar estrangeiros sem documentados, que chegam em balsas provenientes da Tunísia e Líbia, e uma nova lei que os obriga a rejeitar aqueles que buscam ajuda. Esta política colide diretamente com a lei do mar, que obriga o resgate de qualquer pessoa que esteja em apuros. Colide com a necessária hospitalidade que devemos à dignidade dos outros, os vulneráveis que chamam apreensivos em nossa casa.
Essa mesma hospitalidade que esperamos não ser cortada em nosso país [Espanha] por meio da reforma do código penal. Porque nosso grito é semelhante ao dos marinheiros de Lampedusa e ao de tantos e tantos homens e mulheres que na Espanha fizeram da campanha “Salvemos a hospitalidade” um bandeira de luta para continuar protegendo os que se preocupam em acolher, servir, acompanhar e defender os imigrantes sem documentados que batem em nossa porta.
O Papa se aproximará desta ilha que é, toda ela, como um centro de reclusão temporal de estrangeiros. Um gesto a mais de um Papa que carrega em seu DNA a dor e a preocupação permanente com a imigração.
Há meses, o exemplo de um Papa beijando os pés de alguns jovens imigrantes na Casa de Marmo, em Roma, na última Quinta-feira Santa, foi a síntese de outros muitos beijos que muitos outros sacerdotes realizaram, de maneira semelhante, naquele dia, em muitas igrejas da Espanha.
Hoje, sua aproximação com Lampedusa pode ser a porta que se abre à necessária atenção permanente, fluída e regularizada, que há tempo a Igreja solicita para que capelães e agentes de pastoral possam entrar nestes buracos negros que são os nossos Centros de Internação de Estrangeiros.
São autênticos exemplos de excepcionalidade jurídica, que já pedem alternativas – assim, os bispos espanhóis solicitaram na mensagem da Jornada de Migrações – que não privem da liberdade e nem façam sofrer tanto os “depositados” entre suas paredes.
Na Espanha, os Centros de Internação de Estrangeiros estão em toda a sua geografia. São para estadias temporárias, mas a situação de solidão, ansiedade e vontade de se comunicar – às vezes, inclusive, dificultada -, na qual se encontram os imigrantes ali retidos, faz com que solicitem ajudas de todo tipo.
Uma das mais valorosas é o trabalho do capelão ou do agente de pastoral, que de vez em quando exercem, em função do compromisso pastoral, caritativo e de justiça, um serviço e um testemunho muito necessário; serviço que também realizam no exterior, com as famílias. Porque este trabalho não termina quando os imigrantes saem do centro, caso fiquem na Espanha.
Os sacerdotes, os agentes de pastoral, os voluntários de ONGs católicas e outros que oferecem seus serviços ao Centro de Internação de Estrangeiros, em muitas ocasiões, também estabelecem contatos com os internados quando saem do centro. Desta forma, continuam ajudando estas pessoas e, inclusive, muitas vezes, vinculam-se às comunidades cristãs, paróquias ou grupos.
Por isso, a Igreja está lutando para regularizar a presença de capelães e agentes de pastoral nos centros, assim como a disposição de um espaço para os atos religiosos e a atenção personalizada aos internados. É verdade que é reconhecido o direito à assistência religiosa aos estrangeiros, mas ainda não existe nenhum acordo entre a Igreja e o Ministério do Interior que possibilite esta presença de maneira fluída e cotidiana, já que esta fica limitada pela discricionariedade de seus responsáveis.
Talvez a visita do Papa à ilha de Lampedusa seja o primeiro passo para isso, enquanto os centros existirem. E, para o futuro, alimentar a esperança do fechamento dos mesmos. Há alternativas!
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Imigrações. As portas abertas a partir da dor do Papa - Instituto Humanitas Unisinos - IHU