16 Abril 2013
"Os líderes políticos buscam se desvincular dos partidos políticos e da classe política, em consequência, o Chile começa a vivenciar sintomas da personificação da política", escreve Gastón Passi Livacic, graduado em Ciências Políticas e Administração Pública pela Universidade Central do Chile e integrante do curso de Biopolítica, a testemunha e a linguagem. (Des) encontros filosóficos, do Programa Pós-Graduação em Filosofia da Unisinos.
Eis o artigo.
A carreira presidencial no Chile começa a pegar forma, pois esse é o último ano de mandato do presidente Sebastián Piñera, representante da “Alianza por Chile”, bloco político de centro-direita que se compõe de RN “Renovación Nacional” e da UDI “Unión Democrata Independiente”.
Após vinte anos no poder político, de 1990 a 2010, a “Concertación” – coalizão política de centro-esquerda integrada por Partido por la Democracia (PPD), Partido Socialista (PS), Democracia Cristiana (DC) e o Partido Radical (PR) – não conseguiu se articular como bloco opositor ao governo de centro-direita. Todavia, eles veem na Michelle Bachellet a figura redentora do quadro político centro-esquerdista.
Da derrota eleitoral nas últimas presidenciais do ano de 2009, para o período 2010-2014, a atual oposição não tem podido se aglomerar em torno de um eixo programático comum, renovador e pragmático às dinâmicas sociais do Chile de hoje. E a verdadeira oposição ao governo esteve inserida no mesmo bloco governante.
A UDI tornou-se o maior dissidente às execuções do programa de governo. Entre as reformas recusadas pelo partido mais conservador do sistema, destacam-se as seguintes propostas: reforma ao sistema binominal e reformas ao sistema subsidiário. Nesse sentido, é a principal força de contenção do sistema político chileno.
Isso tudo apesar do quadro político desfavorável para a “Concertación”, que se vê refletido na pouca credibilidade daquela coalizão - até menor do que a da “Alianza por Chile” -, a qual se transforma na antípoda de preferências dos vinte anos deles no poder.
Contudo, nas enquetes da carreira presidencial, Michelle Bachellet aparece como a figura com mais possibilidades de chegar ao “Palacio de la Moneda”. Segundo a última enquete do Centro de Estudos Públicos (CEP), a ex-presidente posiciona-se com um 54% da intenção de votos.
Na mesma enquete, os melhores avaliados na centro-direita são Laurence Golborne (da UDI) com um 15% enquanto Andrés Allamand (RN) obtém 7% das preferências. Ambos, ex-ministros do presente governo; do Ministério da Energia e da Mineração e Ministério da Defesa respectivamente. Numa das mudanças ministeriais do presidente Piñera, Laurence Golborne passou daquele ministério ao de Obras Públicas.
Marco Enríquez Ominami, ex-integrante da “Concertación” chega a 8% das preferências. Entretanto, o ex-ministro de Fazenda de Michelle Bachelet, Andrés Velasco, obtém 3%. Por último, o economista Franco Parisi (Independente) também chega a 3% das preferências.
Por decisão do presidente, os dois ministros do gabinete com mais chance eleitoral nas próximas presidenciais saíram em dezembro do ano passado, nesse sentido, aproveitaram o “vazio de poder” deixado pela oposição param, desse modo, perfilar seus planos de governo e se preparar para uma primária. Sendo assim, poderão escolher o representante da direita política.
O particular dessa eleição interna na “Alianza por Chile” é que ela será a primeira daquela coalizão, em virtude de demonstrar perante a opinião pública sinais de democratização no núcleo de poder mais conservador do espectro político chileno. Trata-se de uma estratégia que se enquadra em um cenário de reivindicações por maiores espaços de democratização e onde os principais prejudicados têm sido a classe política.
Michelle Bachellet, apesar do sigilo permanente após seu mandato 2006-2010, posiciona-se na vanguarda da preferência cidadã. No entanto, ela em breve deverá se pronunciar sobre as críticas de seu mandato, de seu plano de governo e da visão a respeito da atual crise do modelo.
Em estrito rigor, a mudança notou-se de forma forçosa devendo fazer frente a vários tópicos necessários. Entre eles está o de se pronunciar sobre a conjuntura política num cenário social cada vez mais exigente.
Além disso, deve-se ser capaz de manter coeso todo o bloco político da “Concertación”. No mesmo plano interno, saber conciliar uma agenda de valores entre as facções mais conservadoras da Democracia Cristiana em relação ao eixo mais progressista do bloco destacando-se: o matrimônio igualitário, o aborto e a adoção de filhos por casais do mesmo sexo. Eis um choque de valores que se veria intensificado numa possível incorporação à “Concertación” do Partido Comunista.
Tendo em consideração que per se a direita representa o lado conservador do sistema político, a Alianza por Chile procura manter as relações econômicas e políticas de poder. Neste caso, defender a herança institucional esboçada no período militar; no outro lado, o bloco centro-esquerdista deveria canalizar o sentimento de demandas e de transformação.
Porém, a dificuldade radica em que Michelle Bachelet governou esse modelo desgastado, debilitado e enfraquecido. Em consequência, seu discurso apontará uma retórica reformadora. No entanto, no caminho apareceram algumas ambiguidades em torno de sua candidatura em relação a seu antigo mandato e ao mesmo legado da “Concertación”. Então, nesse sentido será que seu discurso estará conforme às forças centrífugas?
Por outro lado, mas na mesma senda, um discurso reformador poderia ter muitos flancos fracos. Entretanto, além de ter uma leitura sobre as demandas sociais, essas devem saber encaixá-las na paisagem partidária do sistema político e, principalmente, não causando uma ruptura drástica com seu antigo mandato e da obra geral da “Concertación”. Isso porque, para muitos, a atual oposição caracterizou-se por ser uma classe timorata. Portanto, um eixo programático expressamente em virtude da conjuntura atual pode trazer consequências adversas.
Manifestamente, a representante da Concertación, apesar das séries de obstáculos que deve passar, atualmente, é a presidenciável com mais chances de se tornar presidente do Chile. Mas pareceria ser que existe um ar de vitória antecipada na oposição.
Há tendências que têm que ser interpretadas com atenção. Depois do seu mandato como presidente da República do Chile, Michelle Bachelet saiu com uma aprovação de 80%. Sua credibilidade para ter estado alheia ao mandato de Sebastián Piñera é considerável. Não obstante, vai tendenciosamente à queda. Ao mesmo tempo, a estratégia do sigilo opta-se pela simpatia e carisma da ex-presidente. No entanto, o discurso político, a agenda programáticas e os políticos que a rodeiam serão fatores que conseguirão manter o piso da preferência atual?
Esses são os principais desafios em matéria da aprovação. Destaca-se principalmente a sintonia entre o carisma e o eixo programático que se apresenta, mais ainda, num ano que tem começado na melhor forma para governo. Todavia, a provação do governo chegou a 38% de apoio. Sendo assim, afasta-se da estagnação nos 30 % de adesão.
Se esta tendência continuar até as eleições, poder-se-á chegar aos números de adesão mais competitivos em benefício dos dois representes que procuram a continuidade do atual governo, ou seja, de Andrés Allamand e de Laurence Golborne.
O presidente executivo da consultora Adimark (empresa consultora em estudos de opinião pública), Roberto Méndez, não descarta que para o final do período eleitoral a margem de aprovação do governo poderia chegar próximo a 50% de adesão. A cidadania começou a valorizar algumas execuções do governo em relação a seu plano de governo, principalmente os índices em matéria econômica e a queda em delinquência.
Por um lado, Andrés Allamand pode beneficiar-se de uma sentença favorável na Corte Internacional da Haya no litígio que enfrenta o Chile e o Peru. Entretanto, ele trabalhou como Ministro da Defesa durante grande parte do período presidencial. Em caso de não ser ele o candidato da direita, as consequências da sentença, tanto se fossem favoráveis ou adversas, vão se transpassar à campanha de Laurence Golborne.
Por outro lado, Laurence Golborne tem um carisma similar ao de Michelle Bachelet. Nesse sentido, poderia emular uma campanha similar à de Joaquin Lavín (UDI) no ano de 1999, eleição na qual o bloco direitista perdeu por menos de 30.000 sufrágios contra a candidatura de Ricardo Lagos (PS), em 2000-2006. O resgate aos mineiros soterrados o ajudou em se tornar uma figura pública conhecida. Antes era ligado ao setor de assessorias de empresas do retail chileno.
Uma tendência que não pode deixar de ser analisada é a do mundo independente. A arquitetura institucional do país passa por momentos de tensão e as figuras independentes têm conquistado lugares que eram impensados no modelo institucional chileno. Figuras como a de Marco Enriques Ominami foram determinantes na última eleição presidencial. Ao mesmo tempo essa tendência tem se extrapolado à classe política convencional onde, em geral, os líderes políticos buscam se desvincular dos partidos políticos e da classe política. Em consequência, o Chile começa a vivenciar sintomas da personificação da política.
Ainda falta um longo caminho a ser percorrido. Setores triunfalistas, antes de propor itinerários de ação, eixos programáticos em virtude da agenda sistêmica, poderiam se adjetivar de pretensioso; ao mesmo tempo, as carreiras presidenciais tem que ser percorridas para vencê-las.
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Renúncia de Michelle Bachelet à presidência da ONU mulheres - Instituto Humanitas Unisinos - IHU