27 Fevereiro 2013
O teólogo Hans Küng sempre foi muito duro contra o pontificado de Joseph Ratzinger, mas depois da última audiência do Papa Bento XVI, ele ficou igualmente desiludido. Ele não esperava que o papa renunciante decidisse permanecer no Vaticano exercendo a sua influência. Um caso que não tem precedentes.
A reportagem é de Stefano Baldolini, publicada no sítio HuffPost.it, 27-02-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis a entrevista.
Dois papas no Vaticano?
Que fique claro, eu não tenho nada contra Joseph Ratzinger. Desejo a ele todo o bem possível. Não tenho nada contra uma vida bela, em um lugar para repousar. Temos a mesma idade... Inicialmente, eu pensei: foi uma boa decisão se retirar em um convento para rezar. Mas agora se vê que não era esse projeto. Ao invés, é muito perigoso ter um ex-papa que vive no próprio Vaticano. Que não vive em um mosteiro. Que não vive com monges, mas com freiras que estavam a seu serviço no Vaticano como papa. Ele terá o mesmo secretário, o padre Georg. Ele quer ter contato com os cardeais, com o novo papa. Tenho medo de um "papa-sombra" no Vaticano. Agora, isto me parece confirmado: ele certamente tem interesse de que a sua linha se prolongue, senão não teria feito assim.
O que poderia acontecer?
Isso não é ir ao monte para rezar: mas sim ter a possibilidade de intervenções contínuas. É uma situação perigosa. Eu vejo muitos conflitos. Eu vivo perto do Lago de Constança, onde tivemos o concílio do cisma do Ocidente, com até três papas. Era o século XV. A situação é obviamente diferente... Mas se, por exemplo, o futuro papa disser: é necessário discutir o celibato dos padres, como o atual cardeal da Escócia propôs, quem não quiser isso, se dirigirá ao antigo papa. Além disso, é preciso levar em conta a divisão da Cúria Romana e da Igreja inteira. Por exemplo, João XXIII, com esse sistema, não poderia ter convocado o Concílio.
O senhor vê uma forma de ingerência?
Ingerência secreta, não controlável. Ratzinger diz: "Eu estou fora, mas estou no coração do Vaticano". Em suma, não está certo. Certamente, ele não terá comunicações oficiais, mas sim infinitas conversas privadas. Como é possível, por exemplo, que o padre George Gänswein, o mesmo secretário do antigo papa, também seja prefeito da Casa Pontifícia? Com controle sobre a antessala, decisões sobre as audiências. Configura-se uma comunicação contínua entre palácio pontifício e antigo papa. Isso está sendo preparado há muito tempo. É parte de uma estratégia clara. Basta pensar na nomeação de um secretário como arcebispo (em dezembro passado). Na Cúria definiram tudo isso de "novo nepotismo". Ou há o prefeito do Santo Ofício, amigo e discípulo de Ratzinger, bispo de Regensburg. Menos aceito na Alemanha entre os bispos...
Podem ser mudadas essas nomeações?
No conclave, isso será discutido, e a direita poderia dizer: nós não queremos alguém que mude tudo.
"Quem assume o ministério petrino não tem mais nenhuma privacidade – disse Bento XVI nessa quarta-feira – pertence sempre a todos, a toda a Igreja". Como teólogo, é sustentável um "papa para sempre"?
Como teólogo, posso dizer que o ministério petrino, introduzido na Idade Média, não é um sacramento. Alguém pode ser ordenado sacerdote, pode ser ordenado bispo, permanece sacerdote para sempre. Mas o papa não. Não há uma ordenação para ser papa. Não há sacramento.
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''Ratzinger será um pontífice-sombra. Haverá a possibilidade de ingerências perigosas''. Entrevista com Hans Küng - Instituto Humanitas Unisinos - IHU