Por: Cesar Sanson | 19 Fevereiro 2013
"Neste incio de ano vai se confirmando o agravamento dos conflitos e violências contra os Kaiowá Guarani do Mato Grosso do Sul. Apenas foi publicado um de quase duas dezenas de relatórios de identificação e o agronegócio corre para a presidente Dilma, para o Ministro da Justiça, pedindo socorro, pois as terras lhes pertencem e delas não abrem mão. As prefeituras enviam ao governo federal documentos com esse mesmo teor. Ou seja, a guerra declarada contra a demarcação das terras indígenas no Mato Grosso do Sul está deflagrada. Os indígenas, aos quais resta o caminho da pressão através do retorno a seus tekohá, deixaram bem claro no decorrer do segundo semestre do ano passado que esgotaram todos os limitses de paciente e ativa espera. Inúmeros documentos foram enviados, centenas de visitas, milhares de promessas. Ao que tudo indica, diante da morosidade do governo em resolver definitivamente a identificação e demarcação das terras no Mato Grosso do Sul, das inúmeras iniciativas anti-indigenas no Congresso Nacional, diante da demora da justiça no julgamento das ações envolvendo as terras indígenas, podemos antever um quadro nada alentador. As notícias de Caarapó informam que os indígenas retornaram ao tekohá Pindoty, onde o jovem Denilson foi assassinado e sepultado", escreve Egon Heck, CIMI-MS, ao enviar o artigo que publicamos a seguir.
Eis o artigo.
Tiros na cabeça. O corpo estendido no chão é colocado em um carro e jogado longe do local da execução. Pistoleiros e seguranças da fazenda, cumprem a sina de matadores dos Kaiowá Guarani, na deflagrada guerra contra esse povo. Denilson Barbosa, de 15 anos, da aldeia de Tey’Ikuê, município de Caarapó, terra indígena do mesmo nome, é mais uma das centenas de vítimas do genocídio a que estão submetidos os Kaiowá Guarani no Mato Grosso do Sul.
O assassinato se dá num contexto de vários ataques e violências contra as aldeias e acampamentos desse povo no início de 2013. Denilson foi executado por ter ido pescar, no entorno da terra indígena.
A não demarcação das terras pelo Governo Federal é a principal causa do assassinato. Os confinamentos, como o de Caarapó, tornam as famílias desse povo cada vez mais dependentes da cesta básica, com uma alimentação deficiente e inadequada, aprofundando ainda mais a cultura da dependência e a infame realidade de menos de meio hectare de terra por habitante, poderá agravar ainda mais a situação de violência e morte.
Recentemente representantes dos interesses políticos e econômicos da região entregaram documento à presidente Dilma, reafirmando sua decisão contra o reconhecimento das terras indígenas. Os mesmos objetivos manifestaram em reunião com o ministro da Justiça.
Enquanto a notícia da execução do jovem Kaiowá começava a ser divulgada, já na tarde do dia 18 de fevereiro, em Brasília, nas dependências da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, se instalava a Comissão Especial Guarani-Kaiowá, com o intuito de somar esforços na garantia dos direitos desse povo e evitar mais violências, hostilidades e negação dos direitos. Infelizmente os Kaiowá Guarani não foram integrados à comissão, mas certamente o serão para a próxima reunião. Comissão com o mesmo escopo foi criada em nível da Secretaria Geral da Presidência da República, uma vez que a situação desse povo é prioridade neste ministério.
Denilson Kaiowá poderia ser um dos jovens a se encontrar com o Papa na programada Jornada Mundial da Juventude que em julho se realizará no Rio de Janeiro.O Papa renunciou e Denilson foi assassinado, após ser espancado, no Mato Grosso do Sul.
Num início de noite no centro de Manaus, no Amazonas, em julho de 1980, o Guarani Marçal Tupã’y se dirigia com veemência ao Papa João Paulo II, denunciando a história de massacre de seu povo, e as violências contra os povos indígenas no Brasil. Três anos depois ele seria brutalmente assassinado, em Campestre, na terra indígena Nhanderu Marangatu, no município de Antonio João, onde morava e trabalhava como enfermeiro. Chicão Xukuru, também externou ao Papa as preocupações dos povos indígenas no Brasil, quando de encontro com João Paulo II, em Cuiabá, no mês de outubro de 1991. Falou das ameaças que sofrem as lideranças indígenas que lutam pelos direitos de seus povos, especialmente a demarcação e garantia de suas terras e territórios. Pouco tempo depois foi assassinado.
Em 2007 os povos indígenas no Brasil expuseram ao Papa Bento XVI suas preocupações com a grave situação de negação de direitos e violências cometidas contra os povos indígenas em nosso país.
No momento da renúncia do Papa, dos assassinatos das lideranças indígenas e não garantia de seus territórios e recursos naturais, das contínuas invasões, pressões e destruição das terras indígenas, com perplexidade fica a indagação: quando haverá efetivamente respeito aos direitos desses povos e cessarão as violências e genocídios dos povos primeiros desse continente Abya Yala, América, Ameríndia?
Reza e resistência
As informações da região Kaiowá Guarani no Mato Grosso do Sul, dão conta do importante momento em que muitas comunidades estão fortalecendo sua resistência e luta, construindo casas de reza – oga pisy, e realizando os rituais, jerosy pucu. Uma demonstração de que a secular resistência e a afirmação de seus projetos de vida na busca da terra sem males, se fortalecem e lhes dá a garantia da vida e da vitória.
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Vida e morte Guarani-Kaiowá: Denilson, Marçal e o Papa - Instituto Humanitas Unisinos - IHU