Por: André | 27 Março 2012
Roxana Murdochowicz acaba de publicar Los adolescentes y las redes sociales, livro onde esmiúça a relação de adolescentes e jovens com as chamadas “novas” tecnologias. E adverte sobre os mitos e falsas crenças dos adultos.
A reportagem é de Soledad Vallejos e está publicada no jornal argentino Página/12, 26-03-2012. A tradução é do Cepat.
Não existe um mundo virtual e outro real. A ideia de que um computador isola fala mais dos adultos pouco familiarizados com a internet do que efetivamente acontece quando um adolescente se conecta à rede. Quem diz isso é Roxana Morduchowicz, especialista em educação, em Los adolescentes y las redes sociales. La construcción de la identidad juvenil en Internet (Ed. FCE). Muito longe de qualquer imagem de meninas e meninos que consomem de maneira passiva conteúdos de diferentes sítios, Morduchowicz coloca que a entrada na internet, que não é nova nem alheia, mas perfeitamente natural porque para as novas gerações sempre estiveram aí, converte a garotada em produtores ativos: leem conteúdos, sim, mas também produzem os próprios, interagem com seus pares em situações de comunicação horizontais e ensaiam, em suas intervenções, novos modos de algo tão tradicional como diferentes formas de desenvolver e apresentar suas próprias identidades.
Aqueles que hoje são crianças e adolescentes nasceram em um contexto tecnológico em pleno desenvolvimento, mas ao mesmo tempo dotado de certa estabilidade. Controle remoto, celular, internet, TV a cabo e de acessibilidade quase permanente, são coisas que sempre existiram em seu mundo, ou que ao menos chegaram tão cedo em suas vidas que seu aparecimento não implicou irrupção alguma. Por isso, diz Morduchowicz, os adultos não apenas deveriam “conhecer os consumos culturais da garotada, de que maneira usam a tecnologia e para quê”, mas também compreender que as tecnologias já não são novas. “Usar essa palavra, dizer ‘novas tecnologias’, só revela a idade dos adultos. Já não há meios tradicionais e novos. Todos coexistem”.
Por que pensar a relação entre adolescentes e redes sociais?
É inevitável, porque hoje a geração que tem menos de 18 anos vive entre telas. As três mais importantes na vida dos adolescentes são a televisão, o celular e o computador. Hoje a identidade juvenil não pode ser entendida caso não se entende a relação que os meninos e meninas têm com as telas, e dentre elas a que mais está crescendo nos últimos anos é o computador. E a isso é preciso acrescentar que o acesso à internet se faz cada vez mais acessível, quer seja através de netbooks ou celulares, com os quais a garotada está cada vez mais conectada. Meu interesse é entender a identidade dos adolescentes. E hoje, se não se analisa o vínculo que eles têm com a internet, perde-se uma parte fundamental de sua identidade.
No livro você sustenta que, em vez de se isolar, o computador se torna fundamental para a comunicação de crianças e adolescentes com seus pares.
Claro, é que o principal uso é comunicativo. Em geral, quando os pais compram um computador ou o conectam à internet, suas expectativas são educativas.
Em um sentido tradicional?
Sim, como algo do estilo “quero que o ajude na escola”, como uma ferramenta.
Um uso unidirecional?
Claro. Mas todas as pesquisas e os estudos mostram que o principal uso que as crianças fazem é comunicativo. Basicamente, se dedicam a chatear, a programas de mensagens instantâneas ou através de alguma rede social. Uma das que mais está crescendo, uma das mais populares, é o Facebook. Deveria ser somente para maiores de 14 anos, porque é isso que o sítio permite legalmente, mas também está sendo muito usado por pré-adolescentes, porque falsificam a idade e constroem seu perfil. Em todo o caso, entre os adolescentes a presença em redes sociais é alta: 80% estão em uma.
Esse número se modifica segundo as classes socioeconômicas?
Não reconhece fronteiras sociais. A presença já atravessa todas as classes. Hoje, para um menino, não estar no Facebook, como eles dizem, é não existir. Mas isso tem a ver com a construção da identidade.
É um espaço de socialização, como em outra época foi um bar?
Claro, o que para os adultos atuais era ver-se em um café, agora é cruzar-se no Facebook. Antes, a visibilidade passava pelo mundo, digamos, real: um café, uma esquina. Agora, para garotada isso acontece em um mundo virtual. Mas atenção, porque para a garotada o mundo on line e off line não são antagônicos: há continuidade. Eles podem estar em sua casa, falando com a mãe e ao mesmo tempo chateando em uma janela com seus amigos, navegando em busca de informações ou escutando a sua banda preferida. Eles abrem e fecham janelas virtuais como os adultos abrem e fecham janelas reais.
Os universos do on line e do off line coexistem, se superpõem.
É uma geração que em todo o mundo se chama multimídia, mas não apenas pela oferta diversificada de meios e tecnologia, mas fundamentalmente por seus usos simultâneos. Enquanto veem televisão, escutam música e também falam pelo celular, ou fazem a tarefa de casa. Não são atividades excludentes. Também se superpõem.
A atitude e os usos são os mesmos para meninas e meninos?
Poderíamos dizer que as meninas se comunicam mais, mas as diferenças entre meninas e meninos são mínimas. Estar no Facebook não apenas não reconhece diferenças sociais, mas tampouco de gênero. Isso demonstra também que a presença das telas na vida da garotada não implica um isolamento ou em anular sua vida social. Pelo contrário, as telas e a tecnologia produziram uma nova forma de sociabilidade juvenil. Antes, como dizia, no café; agora, aqui. Que o principal uso seja o comunicativo varre com os prejuízos dos adultos, que acreditamos que pela irrupção das telas a garotada está mais isolada e menos conectada com seu entorno social. São novos suportes para o social. Esta é a primeira geração que dispõe de variedade de suportes. Quando eu era menina, havia apenas o telefone fixo. E controlado, porque era caro. Agora, a criançada tem telefone fixo, telefone celular para falar ou para mandar mensagens, o blog, o chat, as redes sociais. Ao todo, eles têm cinco ou seis suportes, modos de se comunicar. Isso demonstra que estão muito longe de ser uma geração isolada. Pelo contrário.
São os adultos que acreditam isso, mas por sua própria distância, voluntária, com a tecnologia. Ao contrário, a criançada tem familiaridade com os dispositivos, não teme usá-los.
Como em casa, a garotada, quer sejam adolescentes ou menores, costumam ser aqueles que mais manejo instrumento têm do computador, há certos medos nos adultos, sejam mães, pais ou docentes. Os pequenos têm manejo instrumental. Apenas. Ao contrário, o critério, o sentido da experiência, segue sendo algo que um adulto tem, e que por isso deve guiar o uso, o manejo do instrumento, desse computador. Os adultos devem conhecer os consumos culturais da garotada, de que maneira usa o computador, para quê. Por mais que tenhamos filtros no computador, nada substitui um bom diálogo. Mas claro: conhecer seus consumos, para que os usam, não o que dizer no chat.
Seriam como os cuidados clássicos de “não falar com estranhos”.
A mesma precaução da vida real na vida virtual. Algumas precauções têm a ver com o uso da tecnologia. Assim como a garotada não sai sozinha às duas da manhã pela rua obscura, também é preciso saber que a internet é um espaço público, e quando eles transferem para ali detalhes de sua intimidade, podem ser vistos por qualquer um. É como falar aos gritos em uma praça: são ouvidos.
No livro, relaciona essa falta de compreensão dos limites da intimidade com a construção da identidade, com algo que têm que adquirir.
Sobretudo os adolescentes. Para eles, ser popular é um valor muito importante, ter muitos amigos nas redes sociais. Então, o conceito de vida privada cede diante do desejo de ser popular. Se para serem populares têm que contar em que escola estuda ou dar seu nome verdadeiro, fazem-no. A prioridade é ter amigos. E a garotada não mede o alcance da internet.
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“Ser popular na internet é um valor muito importante” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU