"Imposição de projetos torna discussão autoritária e truculenta, algo que eleva riscos e custos para o país", escreve
Ildo Sauer, professor titular do Instituto de Eletrotécnica e Energia da USP, em artigo publicado no jornal
Folha de S. Paulo, 20-11-2011.
Eis o artigo.
O projeto original da
usina de Belo Monte foi concebido no governo militar, como parte da estratégia desenvolvimentista de industrialização brasileira, que, na Amazônia, voltava-se para a produção de commodities para exportação, especialmente o alumínio, a exemplo de
Tucuruí.
Foram previstas sete barragens no rio Xingu, que gerariam 19.000 megawatts (MW), com o alagamento de mais de 18.000 km², atingindo 12 terras indígenas e grupos isolados da região.
Os estudos, aprovados na década de 1980, foram alvo de forte reação dos indígenas e demais povos da região. A reação social ao projeto, combinada com crise econômica das décadas perdidas (1980 e 1990), levou o projeto à hibernação, até ser ressuscitado pelo
governo Lula.
Sua ressurreição, já como
Belo Monte, em formato revisado - com redução do alagamento e da potência -, guarda forte vínculo com a incúria e deficiente implementação do plano energético proposto por
Lula.
O plano previa a retomada do planejamento, compreendendo, de um lado, a previsão da demanda de energia de curto, médio e longo prazos, e, de outro, o estudo atualizado de todos os recursos de oferta disponíveis.
Em 2003, o país tinha um potencial hidráulico de 188.000 MW; eólico, de 143.000 MW (com torres de 50 m, duplicável com torres de 100 m); de cogeração com biomassa e gás natural, de 25.000 MW. Tudo isso fora as possibilidades de racionalização do uso e de modernização das usinas antigas.
Havia ainda uma sobra de 7.000 MW após o racionamento de 2001.
O quadro era propício para estudar os recursos, ordenando os projetos por mérito técnico-econômico, social e ambiental. Era possível institucionalizar um processo decisório submetido a controle público, de forma a organizar a sequência das usinas a serem construídas, descartando aquelas problemáticas. Isso não foi feito.
Com a retomada do crescimento econômico e o fim das sobras, o governo começou a fazer leilões para aquisição de nova capacidade.
O país contratou energia de usinas a carvão, óleo e gás natural, opções inadequadas por seus elevados custos.
A avalanche de críticas teve como resposta a corrida improvisada a projetos existentes:
Santo Antônio e
Jirau (rio Madeira), herdadas do governo FHC, e
Belo Monte, do governo militar.
Com planejamento, essas usinas teriam dado lugar a projetos com melhores atributos sociais e ambientais. O autoritarismo e a truculência com povos indígenas e populações locais teriam dado lugar a processo decisório, que poderia conduzir à viabilização ou ao abandono dos projetos, com ganhos civilizatórios e redução de custos e riscos para o país.
Comunicar erro.
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Hidrelétricas teriam de passar por crivo social e ambiental - Instituto Humanitas Unisinos - IHU