09 Junho 2011
Pesquisas mostram o surgimento de uma crescente familiaridade dos jovens com uma cirurgia de tipo "reinventivo".
A análise é de Simona Segre Reinach, professora da Faculdade de Artes e Design da Universidade IUAV de Veneza, na Itália, em artigo publicado no jornal Il Manifesto, 01-06-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Nos anos 1970, havia uma imagem que me encantava. Era a capa do disco Tapestry de Carole King (imagem ao lado), datada de 1971. Certamente, eu gostava da música e das letras das canções que eu ouvia e ouvia novamente como um mantra, mas era seduzida principalmente pela representação de Carole King sentada ao lado de uma janela, com os longos cabelos ondulados que lhe caíam sobre os ombros como ondas fluidas, mal domadas por uma linha no meio, vestida um suéter largo (hoje se diria over), feito à mão e vestido sobre a pele, os jeans azuis do dia a dia, os pés descalços, o ar de quem se sentia livre para ser ela mesma. Um gato enrodilhado no travesseiro aprecia a atmosfera desse lugar tão acolhedor quanto isento de formalidades.
Quase um interior flamengo em versão hippie que literalmente me enfeitiçava, porque mostrava à jovem de 16 anos que eu era a sedução dos mundos anglo-saxônicos dos quais eu estava me apaixonando. Londres ou San Francisco, para mim, significavam a mesma coisa – corpos naturais, não aprisionados, não forçados, mas fluidos, como poderia ser o meu também, bastava que não ouvisse o que minha mãe e a cultura burguesa em que eu havia crescido me diziam.
Uma das canções do álbum Tapestry era You make me feel like a natural woman (de Aretha Franklin, que, no entanto, em 1967, a cantava vestindo uma peruca e um vestidinho brilhante em um look deliciosamente modernista!), quase um manifesto da construção de naturalidade que foi a estética de muitos meninos e meninas da época.
A uma distância de décadas, embora a ideia de naturalidade continue tendo uma importância notável para a geração que se tornou adulta nos anos 1970 no Ocidente, a ingenuidade da época deu lugar à consciência de que a naturalidade é só um dos possíveis hábitos do corpo e que não há antítese entre o corpo da menina "água e sabão" e o de uma femme fatale consumada, porque o corpo natural justamente não existe, pois somos animais culturais, embora haja muitos modos de intervir sobre ele.
Intervenções corporais
O fundamento de toda intervenção que fazemos sobre o corpo, modificando-o ou fazendo acréscimos (tatuagem ou rinoplastia, vestido de gala ou casaco real de uma coroação) é o de "fazer humanidade", para usar as palavras de Francesco Remotti, ou seja, dar-se conta daquela falta, incompletude, indefinição que nos caracteriza e nos define enquanto seres humanos e sobre a qual continuamos intervindo simbólica e materialmente.
Remotti propõe uma classificação que enquadra as diversas intervenções sobre o corpo, entendidas como atividades antropoiéticas. Ele identifica 14 delas, com a ressalva de que uma atitude mais sintética ou mais analítica poderia fazer variar o número, mas não a substância dessa taxonomia, cujo objetivo é dar conta do empenho que as pessoas põem na sua própria modificação. Isto é, transformar um indiferenciado natural em um específico cultural, portanto, humano.
Da primeira categoria, que consiste na simples construção de objetos a ser postos temporariamente no corpo (peças de roupa, mas também joias e máscaras) até a quarta categoria, que consiste em modelar cabelos e unhas, estamos no campo da reversibilidade. Isto é, trata-se, segundo Remotti, de agir no espaço ao redor do corpo, mas não definitivamente sobre o corpo.
A partir da quinta categoria, em que encontramos inseridas práticas como o body building e a massagem e, depois, sobretudo, da sexta categoria, "crânios esmagados, pés reduzidos, pescoços alongados", entramos no âmbito da irreversibilidade das intervenções, sempre mais definitivas, muitas vezes também muito dolorosas, até a 14º e última categoria, em que encontramos o chamado "tratamento do cadáver". A prática, universalmente difundida, tem o objetivo de procurar subtrair do corpo a decomposição, ou seja, o seu retorno ao regime da natureza.
O tratamento do cadáver indica a fundamental importância que os seres humanos atribuem à afirmação do seu próprio estilo de humanidade, até mesmo depois da morte. Por isso, é difícil tomar uma posição, como parece exigir o discurso comum estereotipado, a favor ou contra a cirurgia estética, quase como se fosse possível opôr um modo "natural" de estar no mundo – e de envelhecer e de morrer – contra um modo artificial e construído, e implicitamente pensando que haja, na segunda eventualidade, também uma inconveniente não aceitação de nós mesmos.
É verdade que a construção de naturalidade, ou melhor, a naturalidade da aparência, oposta à sua sofisticação, especialmente para a mulher, tem acompanhado períodos de abertura e de oposição a ideologias patriarcais. Pense-se no "pé de lótus chinês", prática que se dissolve depois de séculos, com o fim da dinastia imperial e a fundação da primeira república chinesa em 1911, e a abolição do busto na Europa, mais ou menos o mesmo período, com todas as promessas feministas do século XX. Devemos deduzir disso que vivemos em uma época muito opressiva, dada a maciça dose de modificações que aceitamos ou procuramos. No entanto, o discurso é mais complexo, e as práticas de cirurgia estética nos colocam diante de interrogações às quais é difícil dar uma resposta abrangente.
Cirurgias estéticas
Como o feminismo da década de 1980 já mostrou que a moda não tem como único propósito o de oprimir a mulheres, agora é a vez de compreender o sentido de práticas de cirurgia estética cada vez mais difundidas para homens e para mulheres. Na nossa cultura, o fenômeno das intervenções sobre o corpo pode ser dividida substancialmente em dois grandes filões.
De um lado, está a intervenção destinada a "bloquear" o tempo, isto é, a prolongar a estética da juventude. A idade média se esticou, e, assim como se combate a osteoporose que impede uma velhice de autonomia, do mesmo modo as pessoas buscam, sobretudo as mulheres, garantir um aspecto de eficiência, funcionalidade, bem-estar, atratividade sexual. Vai-se dos chamados "retoques" à plástica em si mesma, mas raramente as práticas de reconstrução da juventude envolvem a invenção de um corpo "novo". O foco das intervenções é o rosto, enquanto as práticas mais suaves como os vários tipos de ginástica confiam-se ao corpo.
Por outro lado, está o recurso, em idades sempre mais jovens, a querer mudar sua própria aparência. O foco é mais frequentemente o corpo, da construção de músculos à tatuagem, não o rosto. Nesse âmbito, as próteses para os seios é a prática mais pedida pelas jovens aos seus pais como presente ou como autopresente em caso de uma autonomia econômica alcançada. "Eu me dei dois tamanhos a mais" é o que os jornais relatam frequentemente, citando as palavras de garotas que ambicionam encontrar um lugar no mundo do espetáculo.
Como indica a pesquisa de Rossella Ghigi, que será apresentada no evento Diálogos sobre o homem, em Pistoia, é oportuno, portanto, perguntar-se quais tipos ideais e, portanto, quais expectativas estão na base do desejo da intervenção cirúrgica estética junto aos mais jovens, como se insere, no seu tornar-se adultos, o desejo, às vezes realizado, mais frequentemente sonhado, de um corpo novo.
Os dados de diversas pesquisas realizadas por Ghigi com amostras representativas do universo jovem italiano parecem mostrar uma crescente familiaridade com o uso da cirurgia mais reinventiva do que melhorativa – provando como as intervenções que visam a alcançar um ideal de beleza, na realidade pouco praticados nessa idade (15-24 anos), são uma forma de imaginação do eu de tipo projetivo, mas também um elemento que se delineia como fortemente caracterizador das novas individualidades pós-televisivas.
Aparece mais alto, a partir dos dados, o percentual favorável à intervenção cirúrgica estética do que às tatuagens ou aos piercings, demonstrando um estado de variação permanente do corpo dos mais jovens definido, por isso, pelos sociólogos como um "corpo fluido", "um corpo nômade que não tem fronteiras nem identidades fixas", mas está pronto para assumir novas formas, em constante evolução.
Nisso, está provavelmente uma das diferenças entre ontem e hoje. Caracteriza os jovens uma (aparente) contradição entre a submissão a mudanças irreversíveis, prontos, porém, para serem modificado na busca de ideais estéticos cada vez menos codificado. O risco de uma extrema liberdade de intervenção está, talvez, na perda do sentido abrangente da imagem corpórea. A unidade da pessoa, como se sabe, nunca é a resultante da soma das partes. As muitas partes montadas não fazem um corpo, mas podem criar um Frankenstein.