20 Julho 2016
“Conforme nos mostram os resultados da avaliação que fizemos, por meio dos indicadores, não há informação clara sobre quais são as autoridades competentes pela realização da Olimpíada e Paralimpíada, nem quais são suas responsabilidades, além de não ter sido disponibilizada uma relação organizada da legislação aplicável para o tema em questão”, informa a economista.
Imagem: publicdomainpictures.net |
Coordenadora de uma pesquisa realizada pelo Instituto Ethos, sobre a baixa transparência nas Olimpíadas do Rio de Janeiro, Paula frisa que outro “obstáculo” em relação à transparência diz respeito “à disponibilização das informações de forma difusa nas páginas eletrônicas de cada secretaria”. E reforça: “Como as responsabilidades não estão estabelecidas em nenhum documento, é difícil saber qual secretaria seria responsável por divulgar cada informação”.
A “dispersão das informações”, menciona, “torna o processo de acompanhamento da gestão pública muito trabalhoso e lento, tornando-o pouco eficiente”. Além disso, comenta, a falta de transparência no acesso das informações “não apenas torna mais complexa a medição do impacto dos Jogos Rio 2016, mas também prejudica a transparência ativa prevista na Lei de Acesso à Informação”.
Paula Oda é graduada em Ciências Econômicas pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, graduada em Matemática pela Universidade de São Paulo – USP e mestra em Economia Política pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP. Atualmente, trabalha no Instituto Ethos, na área de Práticas Empresariais e Políticas Públicas.
Confira a entrevista.
IHU On-Line - Quais foram as principais dificuldades de acesso à informação ao desenvolver a pesquisa sobre a transparência nas Olimpíadas do Rio de Janeiro?
Foto: Instituto Ethos
Paula Oda - Foram duas as principais dificuldades para a realização do estudo: a falta de consolidação dos dados de forma temática e a dispersão das informações.
O primeiro entrave foi encontrar, por exemplo, um orçamento da realização dos Jogos Rio 2016 ou todos os contratos firmados para a realização do evento em uma única busca. Isso implica em uma dificuldade de controlar, monitorar e avaliar o impacto real ou os processos que estão de fato relacionados à Olimpíada e Paralimpíada.
O segundo grande obstáculo está relacionado à disponibilização das informações de forma difusa nas páginas eletrônicas de cada secretaria. Como as responsabilidades não estão estabelecidas em nenhum documento, é difícil saber qual secretaria seria responsável por divulgar cada informação.
A dispersão das informações torna o processo de acompanhamento da gestão pública muito trabalhoso e lento, tornando-o pouco eficiente. A informação está disponível em alguns casos, mas a dificuldade de consolidá-la ocasiona a dificuldade de apurá-la como um todo.
IHU On-Line - Quais foram os dados e informações que você conseguiu obter em relação aos gastos feitos até o momento?
Paula Oda - A metodologia dos indicadores de transparência não prevê uma apuração dos gastos em si. A avaliação é formulada para identificar se todas as informações para mensurar os gastos, por exemplo, estão disponíveis. Nesse sentido, examinamos a disponibilidade dos contratos e da execução orçamentária, bem como dos empenhos de despesas, das renúncias fiscais, entre outras coisas. Assim, se esses dados estiverem acessíveis ao público, em uma avaliação quantitativa, seria possível encontrar não apenas o custo dos Jogos Rio 2016, mas também o impacto gerado pelo evento.
Entendemos que o monitoramento e o controle da gestão pública se dão em duas etapas. A primeira é a disponibilidade e o acesso à informação. A segunda é apuração dos números e informações. Neste momento, nosso trabalho se focou na primeira etapa.
IHU On-Line - Segundo notícias da imprensa, o TCU calculou em R$ 3,8 bilhões o total de impostos não arrecadados graças a leis de isenção para a Olimpíada. Você confirma esses dados?
Paula Oda - Essas informações não foram pesquisadas nesse estudo. O que encontramos é que nenhum dos entes federativos responsáveis pela realização dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos disponibiliza uma relação de renúncia fiscal, com a apresentação de formas, valores, beneficiários e condições de renúncia ou estímulos fiscais. Nesse caso, para a obtenção da informação completa, é necessário primeiro mapear cada renúncia pertinente por item e consolidar a informação por ente, fazer o processo para cada uma das três gestões públicas e somá-las para então obter o montante final.
IHU On-Line - Como você analisa, de um lado, a notícia do Rio de Janeiro de decretar estado de calamidade e, de outro, o repasse emergencial de 2,9 bilhões de reais por parte do governo federal?
Paula Oda - Entendemos que o decreto reforça o problema que evidenciamos sobre a falta de transparência dos dados relacionados às obras e ações dos Jogos Rio 2016. Publicamos no período um posicionamento sobre o assunto.
Como se pode observar, por exemplo, o decreto que estabelece o estado de calamidade pública (45.692/2016) autoriza a adoção de medidas excepcionais para a materialização dos Jogos Rio 2016, o que significa, por exemplo, a dispensa do cumprimento de processos licitatórios na contratação de obras e serviços. Outro ponto crítico dessa determinação é a autorização, aos órgãos designados, para editar atos normativos de modo a regulamentar o estado de calamidade, garantindo os eventos esportivos. Conforme nos mostram os resultados da avaliação que fizemos, por meio dos indicadores, não há informação clara sobre quais são as autoridades competentes pela realização da Olimpíada e Paralimpíada, nem quais são suas responsabilidades, além de não ter sido disponibilizada uma relação organizada da legislação aplicável para o tema em questão. Dessa maneira, o monitoramento dos processos que poderão ocorrer em caráter excepcional fica totalmente comprometido. Esses procedimentos, sem a transparência das informações, não apenas tornam mais complexa a medição do impacto dos Jogos Rio 2016, mas também prejudicam a transparência ativa prevista na Lei de Acesso à Informação.
IHU On-Line - O governo do Rio do Janeiro afirma que a atual situação das contas públicas não tem relação com os gastos referentes às Olímpiadas. Como você está analisando a situação das contas públicas na cidade e no estado do Rio? É possível fazer um diagnóstico das causas dessa situação?
Paula Oda - Essas informações não foram analisadas na pesquisa. O que encontramos foi que o processo de consolidação de todas as informações relativas aos gastos com os Jogos é difícil. Esperamos futuramente poder realizar um exame mais aprofundado dos impactos desse evento.
IHU On-Line - Quais são os impactos sociais das Olímpiadas para o Rio de Janeiro? Muitos críticos aos jogos falam em remoções, por exemplo. Você poderia apontar alguns desses impactos?
Paula Oda - O que foi possível observar no nosso estudo é que nenhum dos entes responsáveis pela realização dos Jogos disponibiliza informações, como o relatório de impacto social das obras em questão, a lista de desapropriações ou evidências da realização de reuniões e comunicação com as pessoas ou comunidades atingidas. Esses levantamentos deixam explícita a falta de envolvimento dos segmentos da sociedade impactados pelas obras nas discussões das propostas e a falta de transparência dos processos, decisões e obtenção de informações.
IHU On-Line - De que modo a iniciativa privada tem contribuído para a realização das Olímpiadas?
Paula Oda - Pelo que observamos, algumas obras significativas foram realizadas com financiamento privado, como se observa na matriz de responsabilidade e nos planos de legado (disponíveis no site da Autoridade Pública Olímpica). Vale destacar que não foi possível encontrar informações sobre as parcerias público-privadas que estavam previstas no âmbito do governo estadual.
Por Patricia Fachin
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Falta de transparência, de informação e ineficiência da gestão pública são as marcas das Olímpiadas 2016. Entrevista especial com Paula Oda - Instituto Humanitas Unisinos - IHU