28 Julho 2016
"Tenho a convicção de que a figura de Dilma sairia mais enaltecida e até amada se renunciasse", afirma Juan Arias, jornalista, em artigo publicado por El País, 27-07-2016.
“Sempre me chamou atenção a atitude de algumas mães das favelas que, diante dos algozes de seus filhos inocentes sacrificados pela violência de policiais ou traficantes, chegam a perdoar os algozes, mesmo com o coração sangrando”, testemunha.
Eis o artigo.
Não sei o que estarão aconselhando a Dilma Rousseff seus melhores amigos e conselheiros nestes dias que ela qualificou de “tormento”, e nos quais revela ter poucas esperanças de ser absolvida pelo Senado.
E sei menos ainda o que estará pedindo sua consciência, talvez dividida entre passar para a história como vítima política ou escolher o caminho da renúncia, que não significaria admissão de culpa, mas um gesto de generosidade capaz de apaziguar os ânimos inflamados da sociedade.
Mulher de caráter, que já demonstrou não ter medo nem em momentos de perigo físico, é natural que o corpo lhe peça para resistir e continuar proclamando sua inocência e o que ela considera um golpe.
Se, diante de si mesma, isso pode parecer uma postura nobre, diante da realidade da História pode ser diferente, já que, como sentenciou o perspicaz político italiano, Giulio Andreotti, “o poder corrompe só a quem não o tem”.
A política é nobre e cruel ao mesmo tempo. E, assim como no firmamento os astros giram em torno dos mais fortes e mais densos, também nela o poder real acaba atraindo tudo a seu redor e deixando na sarjeta quem o perdeu.
Será difícil até os mais fiéis seguidores de Dilma e defensores de sua causa, assim como as instâncias internacionais, permanecerem a seu lado depois que forem sancionados constitucionalmente sua perda de poder e seu afastamento forçoso da política por oito anos.
O mais certo é que acabe relegada ao esquecimento enquanto as novas forças políticas se unem para continuar governando, ratificando o dito popular “rei morto, rei posto”.
Com sua renúncia voluntária, bem explicada à sociedade, Dilma, muito pelo contrário, além de ficar livre para tentar novas aventuras políticas, poderia acabar polarizando um consenso da sociedade, inclusive por parte dos que hoje lhe são hostis, com um gesto de generosidade destinado a pacificar o país.
O que pode parecer fraqueza pode também converter-se em sua maior força moral e de atração.
Se há um povo capaz de perdoar é o brasileiro, que se sente mais atraído por políticos capazes de dialogar, e até de ceder, que pelos intransigentes e pétreos, que costumam inspirar mais medo e rejeição que empatia.
Por exemplo: sempre me chamou atenção a atitude de algumas mães das favelas que, diante dos algozes de seus filhos inocentes sacrificados pela violência de policiais ou traficantes, chegam a perdoar os algozes, mesmo com o coração sangrando.
Talvez eu esteja enganado, mas tenho a convicção de que a figura de Dilma, apesar dos sentimentos antagônicos que hoje desperta na sociedade, sairia mais enaltecida e até amada com um gesto de generosidade que a levasse a renunciar à presidência para favorecer uma volta à normalidade.
As posturas intransigentes de quem detém o poder podem até ser admiradas, mas o que costuma despertar maior aceitação e simpatia são os gestos de desprendimento que torna quem os protagoniza mais próximos a nós.
O que pode parecer fraqueza pode também converter-se em sua maior força moral e de atração.
Dilma Rousseff ainda está em tempo de escolher entre intransigência e generosidade. Está em seu direito.
Tomara que acerte.
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Deveria Dilma Rousseff renunciar? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU