10 Novembro 2021
"O BlakcRock propôs transformar 30% do mundo natural em 'áreas naturais protegidas' até 2030, ou seja, adquiridas e administradas pelo capital financeiro. Uma colossal campanha legalizada para tomar posse das terras do planeta. Em algumas décadas, o Big Money poderia reduzir todo o mundo natural a capital financeiro", escreve Riccardo Petrella, cientista político e economista italiano, em artigo publicado por Il Manifesto, 09-11-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.
Uma "revolução" perversa. No dia 7 de dezembro, foi a vez da empresa privada que administra a Bolsa de Valores de Chicago dar o sinal, abrindo as portas para a água, pela primeira vez, na Califórnia, como produto financeiro especulativo, um "futuro". Uma vez que a água é boa para o uso humano, agora considerada um elemento natural vital cada vez mais escasso, as finanças intervieram no sentido de, segundo eles, "governar" a escassez de água garantindo às grandes empresas que utilizam (empresas agrícolas, vinicultores, bebidas doces/gaseificadas...) a disponibilidade de água graças à seleção dos usos realizada pelo preço da água estabelecido pela especulação (como é o caso do petróleo, ouro, trigo…).
Em meados de outubro de 2021, antes da realização da COP15 sobre a biodiversidade e a conservação da natureza e poucos dias antes do início (3 de novembro) da COP26 sobre o clima e o meio ambiente, os gestores da Bolsa de Valores de Wall Street, de Nova York, lançaram uma nova categoria de ativos financeiro sobre o conjunto dos elementos da natureza. Mesmo propósito, mesma pretensão: considerada a degradação da natureza, a redução drástica da biodiversidade, os riscos de uma maior escassez maciça dos "recursos" naturais para a economia e o "crescimento econômico", as finanças privadas mundiais tomam para si o papel de "salvadores" assumindo a responsabilidade de regular de forma eficaz e sustentável, dizem eles, a gestão do mundo natural através da sua apropriação/monetização.
Como no caso da colocação da água na bolsa, por trás da decisão de promover/impor a monetização total da natureza está o fundo de investimento privado mais poderoso do mundo, o BlackRock do presidente Larry Fink. Hoje o BlackRock administra 9,5 trilhões de dólares e se tornou a terceira maior potência financeira do mundo, depois dos Estados Unidos e da China. Juntos, BlackRock, Vanguard (da qual BlackRock é o principal acionista) e State Street são os três fundos de investimento mais poderosos do mundo, e poderiam, se deixados por sua conta, se tornarem os principais proprietários do mundo ou fortalecer sua posição atual como "senhores" da Terra.
O BlakcRock propôs transformar 30% do mundo natural em “áreas naturais protegidas” até 2030, ou seja, adquiridas e administradas pelo capital financeiro. Uma colossal campanha legalizada para tomar posse das terras do planeta. Em algumas décadas, o Big Money poderia reduzir todo o mundo natural a capital financeiro. As empresas que administrarão as “áreas naturais protegidas” serão denominadas NAC (Natural Asset Company). Seu objetivo é extrair lucros de maneira ilimitada dos processos naturais que irão monetizar. As primeiras e principais vítimas seriam os povos indígenas cujas terras são consideradas por eles patrimônio ancestral intransferível. Os direitos para a e da vida individuais e coletivos seriam pisoteados sem limites em todos os lugares.
A monetização da natureza é um escândalo porque permitirá ao Big Money (os grandes bancos e, sobretudo, os fundos de investimento mencionados):
a) transformar todo o mundo natural em uma gigantesca mina de extração e de acumulação destruidora da “riqueza "da vida do planeta;
b) estender o seu poder de domínio e de violência sobre a economia dos humanos (uma economia cada vez mais artificial e dominada pela lógica do enriquecimento desigual e da exclusão), àquela de todo o conjunto da economia do mundo natural.
O pessoal do BlackRock estimou que o mundo natural vale 4 quatrilhões de dólares, ou seja, 4 mil trilhões de dólares. Pensa-se que o produto mundial anual esteja avaliado em cerca de 125 trilhões de dólares. O produto nacional da Itália em 2020 foi equivalente a 2.400 bilhões (a ser comparado ao valor monetizado do mundo natural de 4 bilhões de bilhões).
As autoridades públicas são cúmplices. A esmagadora maioria dos parlamentos eleitos democraticamente e dos governos oligárquicos dos grupos sociais dominantes acredita nos senhores das finanças. Nem no caso específico, mas determinante da água, nem no caso da bancarização e da financeirização especulativa geral da natureza, eles não reagiram. Na verdade, eles confirmaram sua aprovação.
A aceitação da monetização da natureza - aprovada pelos estados na Terceira Cúpula Mundial da Terra da ONU em 2012 - tem sido até o momento um dos fatores principais que impediu as COPs climáticas e ambientais (incluindo a atual COP26) de encontrar uma solução no interesse de todos os habitantes da terra (todas as espécies vivas). Por parte dos representantes eleitos dos povos, representa uma posição política e eticamente inadmissível e indecente.
Sabíamos que desde 1987 (data do compromisso sobre o relatório da Comissão Brutlandt da ONU) o discurso dos dominantes sobre o “desenvolvimento durável e sustentável” tem sido uma impostura descarada. Agora temos uma confirmação indiscutível disso.
O desafio apresentado pelos predadores à comunidade global da vida no planeta é total, imenso. Os dominantes não brincam e não prometem blá, blá, blá. Eles agem, colonizam, subjugam, destroem. O "Big Money" é criminoso. As experiências dos últimos vinte anos mostram que os povos não podem se limitar a continuar a fazer petições. Devem lutar para virar a história para uma “Outra Agenda” para o mundo, em nome da Humanidade e da Vida na Terra.
Para algumas propostas nesse sentido, ver meu artigo Dinheiro a serviço da vida, de 29 de outubro de 2019, em particular a seção "Desmonetizar os bens e os serviços comuns essenciais à vida".
Os trabalhadores inventaram a greve geral e tiveram um sucesso bem razoável. É hora dos habitantes da Terra encontrarem os instrumentos mais adequados.
PS.: Na fonte das informações contidas no texto estão os artigos de Ellen Brown, Wall Street's Latest Scheme Is Monetizing Nature Itsefl, disponível aqui. De Whitney Webb, Wall Street’s Takeover of Nature Adavances with Launch of New Asset Class, Oct.13,2021, disponível aqui. E "Big Three": i fondi d’investimento che comandano il mondo, disponível aqui.
O autor faz parte da Ágora dos Habitantes da Terra.
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A nova conquista colonial da vida começou - Instituto Humanitas Unisinos - IHU