19 Abril 2021
Estaremos prontos para retornar à vida normal e às interações com os outros, assim que a emergência sanitária terminar? Para o Washington Post, há quem prefira se refugiar no “pandemic cocoon”, o casulo pandêmico.
A reportagem é de Ilaria Betti, publicada por L’HuffingtonPost.it, 14-04-2021. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Sair do casulo construído durante a pandemia, aquilo que o Washington Post chama de “pandemic cocoon”, não é tão fácil, mesmo quando a liberdade está a um passo de distância, nem mesmo para quem teve a oportunidade de se vacinar e, portanto, pelo menos no papel, está livre.
“Tomei a última dose da vacina no mês passado, mas, até recentemente, não contei quase a ninguém. Como é que agora, com a minha rota de fuga à vista, eu me encolha diante da saída?”: essa é a pergunta feita pelo colunista Steven Petrow em artigo publicado no Washington Post.
O jornalista chama a atenção para um tema pouco debatido: enquanto há quem não aguente mais para sair da própria casa, depois de meses de reclusão, há também quem, sofrendo de ansiedade social, absolutamente não sente saudade das interações com os outros. Alguns parecem até ter esquecido como fazer trocas com as pessoas: o The Guardian escreve que a arte das “small talks”, das conversas fiadas, parece pertencer agora ao passado.
Sair do casulo, especialmente para quem já sofria de ansiedade social antes da pandemia e para quem a desenvolveu depois, é um esforço enorme. De acordo com um estudo publicado pela American Psychological Association, 49% dos estadunidenses que responderam à pesquisa disseram que se sentem “com dificuldade para voltar às interações presenciais quando a pandemia acabar”.
“Ainda não estou pronto para pular para a vida ‘depois’ com ambos os pés. Talvez, depois deste ano tão calmo e concentrado em casa, eu nunca consiga. E tudo bem”, escreve Steven Petrow.
O colunista admite que se recusou a participar de uma ceia de Páscoa com outras 30 pessoas (vacinadas), mentindo sobre o seu status de vacinado. “Francamente, o meu coração acelera quando penso em me reunir com grupos tão grandes. Temos que abraçar de novo? Vou me sentir nu sem uma máscara. E o mais preocupante: tenho medo de ter perdido a arte da conversa fiada ou simplesmente de não saber mais como abrir espaço no meio da multidão”.
O jornalista se pergunta: “Como vou conseguir retomar a minha pesada rotina de viagens de negócios, reuniões presenciais, exercícios na academia, fins de semana fora de casa e os mais diversos eventos sociais, de jantares a festas, passando pelos eventos noturnos?”.
A preocupação é a de não “saber voltar à vida de antes”, compartilhada também pela jornalista Eleanor Margolis. No The Guardian, em um artigo intitulado “Olá, eu sou Eleanor – por favor, você poderia me lembrar como é ter uma conversa fiada?”, ela escreve: “À medida que o lockdown afrouxa, a ideia de ter que manter uma conversa com alguém que não seja o meu parceiro ou o círculo seleto de pessoas com as quais eu regularmente faço videochamadas me enche de emoção e medo. Mesmo antes deste ano sem vida social, eu sofria de ansiedade social. As festas – se bem me lembro – me faziam me sentir como se eu estivesse tentando arrastar um colchão colina acima. Agora, eu sinto que tenho que correr para descansar depois de ter uma conversa fiada com o entregador”.
Saber conversar agora parece ser uma habilidade do passado. “Ainda há algum espaço para falar sobre o tempo agora, enquanto o mundo inteiro vive o mesmo acontecimento traumático?”, questiona a jornalista. Todos nós estamos processando traumas, todos estamos passando por dificuldades. Responder “tudo bem” à pergunta “como você está?” pode ser algo bastante deslocado. Mesmo as trocas mínimas precisarão ser repensadas. Mas vamos nos adaptar, diz Margolis. Exatamente como nos adaptamos à mudança da pandemia.
Recuperar a interação com os outros é fundamental para o nosso bem-estar. Em um artigo na Harvard Business Review, os estudiosos defendem que as “conversas fiadas” também são necessárias para quem trabalha remotamente. “Muitos trabalhadores sentem a falta das conversas fiadas no escritório e por uma boa razão: essas breves conversas ajudam as pessoas a se sentirem emocionalmente conectadas e aumentam a colaboração e a criatividade. Nem todos são fãs delas: alguns acreditam que elas são inautênticas ou uma perda de tempo.
Para reconciliar esses diferentes pontos de vista, os autores do estudo conduziram uma pesquisa de 15 dias sobre as conversas de 151 trabalhadores. Eles descobriram que, embora as conversas fiadas possam distrair os trabalhadores, os efeitos positivos superam os negativos, e os negativos podem ser muito bem geridos.
O problema com o trabalho remoto hoje é que essas breves trocas estão desaparecendo. A tarefa dos gestores deveria ser incluí-las nas reuniões virtuais e usar instrumentos para torná-las mais inclusivas e produtivas.
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Estamos prontos para deixar o nosso “casulo pandêmico”? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU