17 Mai 2019
As ruas das principais cidades do País, de norte a sul, de leste a oeste, foram tomadas, nesta quarta-feira, 15 de maio, por milhares de manifestantes. Estudantes, professores, pesquisadores, funcionários das universidades brasileiras, federais, estaduais, até particulares e de incontáveis escolas de renome se manifestaram em todo o País em defesa da educação.
A reportagem é de Luiz Roberto Serrano, publicada por Jornal da USP, e reproduzida por EcoDebate, 16-05-2019.
Se há consenso sobre os desafios que o Brasil tem que enfrentar nos próximos tempos, um dos principais é o da educação. O que moveu as multidões que foram às ruas em todo o País foi que esse consenso parece não ser compartilhado pelas autoridades federais do setor, como o Ministério da Educação e áreas próximas.
Além de, até agora, não terem apresentado qualquer proposta educacional para os próximos quatro anos de governo, adotam uma postura crítica, hostil, ideológica e preconceituosa a tudo o que se faz e se fez em educação no Brasil. Em nome das dificuldades fiscais, anunciam cortes financeiros indiscriminados no orçamento das entidades educacionais, especialmente as universidades.
Como uma fagulha em uma pradaria seca, a postura governamental incendiou o naturalmente inquieto espírito das universidades e escolas de prestígio e incentivou a manifestação que ocupou as ruas.
Foi um grito em defesa do futuro do País.
Manifestantes em Porto Alegre, RS. (Foto: Thales Ferreira / Mídia Ninja)
Em São Paulo, milhares de manifestantes ocuparam a região central da Avenida Paulista a partir das 14 horas. A concentração foi em frente ao Museu de Arte de São Paulo (Masp), onde lideranças se alternaram ao microfone sobre dois carros de som, criticando o governo Bolsonaro e os cortes na Educação. O público era predominantemente jovem, de idade universitária, levado às ruas pela indignação com o bloqueio de bolsas e o congelamento de 30% do orçamento discricionário das universidades federais pelo Ministério da Educação — cujo ministro, Abraham Weintraub, foi convocado também a dar explicações sobre os cortes na Câmara dos Deputados, em Brasília.
Acima da multidão, fixada ao postes da Avenida Paulista, uma coleção de desenhos dos cartunistas Laerte e Angeli parecia fazer coro com a manifestação, trazendo críticas ilustradas a várias ideologias políticas conservadoras que permeiam o governo e a legislatura atuais.
Entre os gritos de protesto e frases levadas em cartazes não faltaram ironias e críticas aos “chocolatinhos” que Weintraub usou em um vídeo para explicar o contingenciamento de recursos, nem com a “balbúrdia” que ele disse existir nas universidades federais, muito menos com os “idiotas úteis” e a “massa de manobra”, termos usados pelo presidente Jair Bolsonaro para se referir aos manifestantes numa entrevista em Dallas, no Estados Unidos, onde ele desembarcou ontem para receber uma homenagem.
“Nas ruas, nas praças, quem disse que sumiu; aqui está presente o movimento estudantil”, cantava um grupo de alunos do curso de Gestão Ambiental da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da Universidade de São Paulo (USP). Várias unidades da Universidade aderiram à manifestação, e um grupo de alunos chegou a caminhar em protesto desde a Cidade Universitária até a Avenida Paulista.
No início da semana, o Conselho de Reitores das Universidades Estaduais Paulistas (Cruesp) — USP, Unesp e Unicamp — divulgou uma nota defendendo “a importância de a comunidade universitária debater as questões relativas aos complexos problemas da educação, ciência e tecnologia no Brasil e suas consequências para o desenvolvimento do País”. O documento destaca que 95% das pesquisas científicas no Brasil são feitas em instituições públicas, principalmente nas universidades federais e estaduais. “Interromper o fluxo de recursos para estas instituições constitui um equívoco estratégico que impedirá o País de enfrentar e resolver os grandes desafios sociais e econômicos do Brasil.”
Concentração no Portão 1, na Cidade Universitária, USP. (Foto: Jorge Maruta / USP Imagens)
“A pesquisa brasileira é reconhecida e requisitada internacionalmente, então é um espaço público diverso e de grande valia para a sociedade como um todo”, disse Leonardo Meireles, professor nos cursos de licenciatura em Ciências Naturais e Gestão Ambiental, que foi às ruas ontem protestar com o grupo da EACH. “Não vejo nenhum curso dentro da universidade que não se reverta em benefício para o sociedade.”
“Não é só sobre três chocolatinhos e meio”, dizia um cartaz na Paulista. “O Estado não dá educação porque a educação derruba o Estado”, desafiava um outro. “O conhecimento destrói mitos”, era também uma frase que circulava amplamente pela avenida, em alusão ao apelido de Mito do presidente.
Entre as muitas bandeiras levantadas em meio à multidão via-se um mix de siglas de partidos políticos, sindicatos, associações, escolas e movimentos sociais. Em meio a críticas à reforma da previdência e convocações de greve que também ecoavam nos discursos, um sentimento predominava entre os manifestantes: a defesa da educação, da ciência e das universidades públicas. “Um país sem ciência e ensino superior não tem futuro”, alertava mais um cartaz. “Balbúrdia é cortar da educação”, ironizava outro.
(Foto: Edson Chagas / Mídia Ninja)
Carla Vitória, de 27 anos, mestranda de Ciência Política na USP, disse que os pós-graduandos de todos os programas da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) decidiram conjuntamente sobre a participação no ato. “Fizemos uma reunião na segunda-feira em defesa das Humanas, porque o que o Bolsonaro quer é dizer que ciências humanas não são ciências, e impedir as pessoas de pensar e refletir sobre a sociedade.”
A manifestação começou a se dispersar no fim da tarde e a Paulista foi reaberta ao trânsito. Parte da multidão desceu a Avenida Brigadeiro Luis Antônio para protestar em frente à Assembleia Legislativa do Estadão de São Paulo (Alesp).
“Contra a reforma! Unificou… com estudante, funcionário e professor!” Este foi o refrão repetido diversas vezes por manifestantes durante o ato realizado na manhã desta quarta-feira (15) na portaria 1 da Cidade Universitária, no Butantã. Além das reformas, os manifestantes protestavam contra os recentes anúncios de cortes junto às Universidades federais e estaduais.
De acordo com o 1º tenente Telles, da Polícia Militar, responsável pelo grupo de PMs que acompanhou o ato, no auge da manifestação, por volta de nove horas da manhã, cerca de 200 pessoas estavam presentes. O mesmo número foi estimado pelo diretor do Sindicato dos Trabalhadores da USP (Sintusp), Magno de Carvalho Costa. “A manifestação acontece de forma pacífica e reúne professores, estudantes e trabalhadores”, lembrou o dirigente sindical. Com a concentração, o tráfego na Avenida Afrânio Peixoto e na Rua Alvarenga foi interrompido, impedindo o acesso de automóveis pelo portão principal da Cidade Universitária.
Igor Barreto Estevam é aluno do primeiro semestre do curso de Geografia, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP e contou que está em sua segunda graduação na Universidade. Para o estudante, que já é formado em Biblioteconomia, é importante que todos se conscientizassem em apoiar o ato para que os cortes anunciados pelo atual governo sejam barrados. “Além disso, estamos aqui também para defender a melhoria de nossa universidade, tanto em relação a questões salariais de professores e funcionários quanto a questões como a moradia estudantil", disse.
A diretora do Sintusp Neli Maria Paschoarelli Wada questiona como é possível para o governo federal propagar que defende a soberania nacional e ao mesmo tempo anunciar cortes nas pesquisas.
Por volta de 9h20, os manifestantes iniciaram uma caminhada em direção à Faculdade de Educação, e o tráfego pelas ruas e a entrada principal do campus começaram a ser liberados. No início da tarde, após nova concentração, o grupo se dirigiu para a Avenida Paulista.
Desde às sete horas da manhã, desta quarta-feira (15/5) alunos, professores e funcionários da USP se concentraram em frente à entrada do Campus pela avenida do Café, em Ribeirão Preto. O movimento, segundo os manifestantes, visa principalmente lutar em defesa da educação e contra os cortes de recursos para as universidades federais.
Às nove horas o grupo saiu em caminhada até o centro da cidade, com a adesão de milhares de pessoas, onde aconteceu aula pública com professores da Universidade. De acordo com o Sindicato dos Trabalhadores da USP (Sintusp), cerca de cinco mil pessoas participaram das manifestações, a maioria estudantes. “Nosso objetivo foi alcançado nesta manhã: chamar a atenção para a necessidade de defender os investimentos em educação. Impressionou a adesão maciça dos estudantes”, relata André Orlandin, diretor estadual do Sintusp.
André Jorge Silva, representante da USPais, entidade formada por pais de alunos da USP, diz que a adesão de estudantes, professores e dos pais foi um recado, para os políticos do País, de que os jovens estão atentos e acordados para lutar contra os cortes de recursos para a educação e exigir respeito. “Foi lindo e emocionante participar desse movimento com a energia da juventude”.
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15 de maio e as manifestações pela educação – Um grito em defesa do futuro do País - Instituto Humanitas Unisinos - IHU