Por: João Vitor Santos | 23 Novembro 2018
Vivíamos, não só no Brasil, mas no mundo, tempos de avanços de perspectivas que podemos chamar de progressistas. Entretanto, o revés desse quadro se prefigura agora como o enraizamento de uma extrema direita que não apenas ameaça os avanços dos últimos tempos como também sinaliza um retrocesso de conquistas históricas. A eleição de Jair Bolsonaro no Brasil é justamente um sinal desses tempos, temido por muitos como a prefiguração do totalitarismo. Mas o que é totalitarismo? Para o antropólogo Orlando Calheiros, “o totalitarismo se define como um regime opressivo”. Sua experiência junto aos indígenas Aikewara o fez perceber que esse totalitarismo temido por muitos, especialmente depois de outubro deste ano, é algo vivenciado há muito pelos seus amigos da floresta. “Para meus amigos, todo regime, estatal ou vital, não importa se estamos falando do capitalismo ou das nossas necessidades alimentares, é em alguma instância opressivo. Existir é oprimir outrem”, explica.
Então, rapidamente, podemos dizer que todos, inclusive os índios, somos totalitaristas? Para Calheiros, sim. Mas o que nos difere é a consciência que temos disso. “Os Aikewara sabem que a carne que consomem já fora um queixada, uma anta… Reconhecer isso é fundamental. Justamente, fundamental para que sejamos capazes de reduzir isso ao mínimo possível”, observa. Enquanto isso, os não indígenas fazem o que ele chama de “negação desse axioma”. “Nossa existência, em suma, é erguida sobre o sofrimento de outrem. As massas de pessoas que, todos os dias, enfrentam ônibus lotados para ir trabalhar, exaustas, infelizes. Isso é sofrimento para os Aikewara”, observa. E completa: “negamos isso ativamente, negamos que todos os aspectos da nossa vida citadina sejam mantidos pelo sofrimento, seja o sofrimento de outrem, seja o nosso. E por isso somos verdadeiramente incapazes de combatê-lo”.
Na entrevista a seguir, concedida por e-mail à IHU On-Line, o antropólogo ainda destaca que todo o sofrimento imposto pelos “brancos” aos indígenas é apenas mais uma das consequências de sua sanha por mais e mais, pelo consumo. “Meus amigos afirmam categoricamente que somos escravos de nossos objetos, que há neles um feitiço que nos impede de fugir, de escapar desse regime, mesmo que ele nos cause tanto sofrimento”, acrescenta. Por isso, se mata, se morre e se faz isso porque nos violamos a nós mesmos. “Que mundo é esse em que nosso modo de vida replica o modelo de produção das fábricas? No fim somos apenas utensílios de nossos objetos, dizem os Aikewara. Nos sujeitamos a todo tipo de violação por eles”, reflete.
Calheiros também destaca os Aikewara como resistentes, quando apenas existir diante dessas lógicas já se configura como a resistência. Com o olhar desse povo extremamente atento à “política dos brancos”, apreende que o totalitarismo que se teme hoje é intestino, gerado pelo próprio branco. A diferença é que antes atacava o índio, agora, se volta para ele mesmo. “O totalitarismo, nos termos ‘deloucados’ pela filosofia aikewara, é muito mais do que um mero sistema de governo, é uma forma de existir: existir em negação”, sintetiza.
Orlando Calheiros (Foto: João Vitor Santos | IHU)
Orlando Fernandes Calheiros Costa é doutor em Antropologia Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ/Museu Nacional, onde coordenou o Grupo de Estudos da Ciência e Tecnologia e permanece como pesquisador do Núcleo de Antropologia Simétrica – NAnSi. Trabalhou como pesquisador sênior do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD, coordenando o Grupo de Trabalho Araguaia na Comissão Nacional da Verdade. Atuou ainda como pesquisador colaborador do Programa de Pesquisa em Biodiversidade – PPBio do Ministério da Ciência e Tecnologia. Realizou pós-doutorado no Departamento de Filosofia da PUC-Rio, onde também atuou como professor visitante.
O Prof. Dr. Orlando Fernandes Calheiros Costa esteve no Instituto Humanitas Unisinos – IHU no dia 08 de novembro, ministrando a conferência "A (nova) biossocialidade brasileira no cenário pós-eleitoral. Limites e Perspectivas". A atividade integrou o 4º Ciclo de Estudos – A reinvenção da política no Brasil contemporâneo. Limites e perspectivas. Confira o vídeo no final da entrevista.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Quem são os Aikewara e como foi sua experiência junto a essa comunidade indígena?
Orlando Calheiros – Os Aikewara são uma população ameríndia falante de uma língua Tupi-Guarani do sudeste do Pará, e sua Terra Indígena fica próxima à cidade de Marabá. Cheguei até eles no ano de 2009 e permaneci vivendo na aldeia até meados de 2011, como parte da minha pesquisa de doutoramento. Desde então, volto para lá sempre que posso, ainda que por períodos não tão longos quanto gostaria.
IHU On-Line – De que forma a ideia de “fuga” ajuda a entender os modos de vida aikewara?
Orlando Calheiros – O conceito de “fuga” – semim – é fundamental dentro da filosofia local. Não apenas o cosmos e os seres que ali habitam são descritos nos termos de “produtos” – se assim valesse a pena concebê-los –, desses processos que meus amigos entendem como fugas, como os próprios Aikewara (o povo aikewara) compreendem como uma “marcha de fuga”. O termo aikewara costuma ser traduzido como “índio” por meus amigos e muitas vezes é utilizado para designar aqueles que, de alguma forma, escapam dos padrões citadinos e estatais dos não indígenas. Os melanésios [nativos de uma região de ilhas na Oceania] que viam em meus livros eram chamados igualmente de aikewara por eles.
IHU On-Line – A História dos Aikewara é marcada pela Guerrilha do Araguaia. Gostaria que recuperasse esse episódio e analisasse como ele impactou – ou vem impactando – a vida desses índios.
Orlando Calheiros – Este é um evento crucial da história dessa população, e não apenas da nossa, vide que a Comissão Nacional da Verdade – CNV fora criada por conta desse episódio. Enfim, em termos gerais nos basta dizer que os Aikewara foram escravizados como parte dos esforços de combate à Guerrilha do Araguaia. Os homens foram obrigados a servir de guias para o exército – e eram tratados como prisioneiros –, enquanto mulheres, velhos e crianças eram mantidos em cárcere (não podiam deixar suas malocas). Isso durou meses. De fato, diria sem medo de estar exagerando que a aldeia de meus amigos, durante este tempo, era campo de concentração nos moldes daqueles criados pelos ingleses e espanhóis em suas campanhas coloniais do início do século passado (e algo semelhante aos alemães).
Como se pode imaginar, esse episódio gerou toda sorte de trauma para meus amigos. Até hoje, os homens e mulheres sofrem ao falar daquilo. Sofrem de maneira genuína, revivem os medos, sentem as dores novamente. Imagine: uma das mulheres perdeu seu filho por causa de um aborto espontâneo causado pela situação de penúria. Não é de se estranhar que, só depois de mais de um ano vivendo entre eles, o assunto passou a ser abordado comigo.
Mesmo hoje a intervenção do exército lhes causa toda sorte de problemas: a estrada que corta a Terra Indígena fora aberta como parte dos esforços de contenção da Guerrilha. E é dela que vêm os incêndios que todo ano devastam a Terra Indígena Aikewara; é de lá que vêm as doenças etc.
Para os Aikewara, existir é resistir. Foto: Orlando Calheiros | Arquivo Pessoal
IHU On-Line – Depois de terem enfrentado a Guerrilha do Araguaia, podemos considerar que o maior desafio dos Aikewara atualmente é resistir ao desenvolvimentismo brasileiro, materializado em empreendimentos como Belo Monte?
Orlando Calheiros – Este é um ponto fundamental, a escravidão nas mãos do Exército foi apenas um dos ataques sofridos pelos Aikewara. Anos antes foram reduzidos, por conta de uma epidemia de sarampo, a pouco mais de 30 indivíduos… O que quero dizer é que as violações não começaram com a Guerrilha e não cessaram com o seu fim. Os Aikewara, como tantos outros indígenas brasileiros, sempre foram considerados inimigos pelo Estado e tratados como tal. Na década de 1990, sofreram com asfaltamento e duplicação da estrada que corta sua terra; na primeira década deste século, sofreram com o plano de desenvolvimentismo do Estado brasileiro, com a criação de Belo Monte, com a instalação de mineradoras ao lado de suas terras… Como disse, as violações nunca cessaram, talvez tenham diminuído a intensidade em um momento ou outro, mas nunca cessaram – e isso são os próprios que dizem.
IHU On-Line – O senhor esteve entre os Aikewara em dois momentos, antes e depois de grandes projetos desenvolvimentistas na região norte do país. Quais as transformações dos modos de vida dos indígenas que mais o impactaram?
Orlando Calheiros – Eu acompanho a vida dos Aikewara desde 2009. Desde então, realizo pelo menos uma viagem anual para a aldeia, onde passo pelo menos um ou dois meses. Bem, diria que talvez a transformação mais significativa seja a mudança na dieta dessa população. Com a completa devastação da mata nos arredores, a Terra Indígena Sororó – cerca de vinte e poucos mil hectares – se transformou no último refúgio de diversas espécies de animais da região. Alguns destes, como os queixadas, exercem um papel cosmológico muito importante na filosofia desse povo – comer queixada é uma das coisas que lhes permite ser Aikewara, ou pelo menos exercia. Digo isso pois muitas espécies estão quase extintas no local.
A já citada devastação ambiental na região impede a renovação dessas populações. Como qualquer biólogo atestaria, o estresse causado pelo intenso fluxo de veículos e sons de dinamite das mineradoras do entorno diminui o sucesso reprodutivo desses animais (fora os que são atropelados). Ainda, a Terra Indígena costuma ser diariamente invadida por caçadores vindos das vilas no entorno. Além da escassez de animais nativos para consumo, por conta das mudanças climáticas na região (causadas pela devastação, lembro), as roças dos indígenas já não são capazes de suprir suas necessidades alimentares. Já é o terceiro ano consecutivo que o arroz não cresce por lá.
Isso os força a ter que buscar alimentação nas cidades do entorno, consumir produtos industrializados etc. O que custa dinheiro, como bem sabemos. E assim, os Aikewara, incapazes de retirar o seu sustento da própria terra, acabam se vendo obrigados a procurar fontes de renda, empregos, viver nas cidades do entorno etc. Para muitos isso pode não parecer nada, mas para meus amigos é extremamente doloroso. Para nós, brancos, seria o equivalente a se sujeitar a um regime de trabalhos forçados apenas para ter o que comer.
Menino aikewara com um queixada. Foto: Orlando Calheiros | Arquivo Pessoal
IHU On-Line – Como compreender a forma como os Aikewara observam os brancos? E, a partir disso, de que forma esses indígenas fazem a sua resistência?
Orlando Calheiros – Gunther Anders diz algo sobre Kafka que me parece muito próximo do pensamento aikewara – aos nossos olhos, deixo claro: ele “deslouca” os processos aparentemente normais do nosso mundo para tornar aparente a loucura que tomamos, justamente, por normal. A forma como os Aikewara compreendem os brancos e a vida citadina me parece ir nessa mesma direção. Coisas que consideramos normais como, por exemplo, acordar em um determinado horário, ir para um ponto de ônibus cheio etc., por meio do escrutínio da filosofia nativa se tornam completamente absurdas. Que mundo é esse em que nosso modo de vida replica o modelo de produção das fábricas? No fim somos apenas utensílios de nossos objetos, dizem os Aikewara. Nos sujeitamos a todo tipo de violação por eles.
Bem, tendo em vista o sofrimento inerente da nossa vida, das crises psicológicas relacionadas ao trabalho moderno, acho que eles estão muito certos. E é justamente aí que eles resistem, nessa recusa ativa a se tornarem escravos dos objetos, do regime da vida citadina. E isso inclui formas de resistência que não apenas a de viver “isolado” no meio da mata, mas a forma como encaram o mundo, para além e aquém do regime de acúmulo e excedente que marca a nossa existência.
IHU On-Line – De que forma os indígenas relacionam a idolatria do consumo com o esgotamento das formas de vida do planeta? E como, na cosmovisão desse povo, esse vício do homem branco pelos objetos também vai drenando a própria vida?
Orlando Calheiros – Como disse, meus amigos afirmam categoricamente que somos escravos de nossos objetos, que há neles um feitiço que nos impede de fugir, de escapar desse regime, mesmo que ele nos cause tanto sofrimento. E antes que o leitor dê risada, diminua a potência dessa crítica por conta da palavra “feitiço”. É sempre bom lembrar aquilo que o próprio Marx escreveu sobre, justamente, o fetiche da mercadoria. Veja bem, não estou dizendo que meus amigos replicam Marx, apenas que existe, entre nós, brancos, uma associação explícita entre o mundo dos bens e a feitiçaria. Uma tradição que Isabelle Stengers atualizou de forma primorosa em seu livro La sorcellerie capitaliste (La Découverte, 2007).
A filosofia aikewara recoloca o problema da feitiçaria do capitalismo sob outros termos, desloucando-a. Os objetos, o seu feitiço, nos impedem de fugir, pois viciam, nos impedem de verdadeiramente desejar algo. O “desejo” (outra categoria fundamental do pensamento aikewara) dos brancos é totalmente condicionado pela mercadoria, ao ponto que muitos se tornam verdadeiramente incapazes de desejar algo, pois sua existência é reduzida ao vício. Nos comportamos como espectros, dizem os Aikewara, andamos como zumbis sem vida pelas ruas: os monstros da nossa antropologia especulativa são maltrapilhos que vagam atrás de alimentos, cérebros, os monstros da antropologia reversa de meus amigos são análogos, talvez mais bem vestidos, que vagam pelas ruas em busca de objetos.
IHU On-Line – O senhor fala que os Aikewara de hoje são viciados em política. O que isso significa? E como eles apreendem as lógicas e dinâmicas da política?
Orlando Calheiros – Eles “nos” assistem na TV como assistimos estes documentários naturalistas sobre animais. Se nossos joguetes políticos não lhes causassem tantos danos, eles achariam apenas curioso (e ridículo). Eles compreendem muito bem o jogo político e de uma forma que julgaríamos até cínica: eles não acreditam nas grandes narrativas que inventamos para dar conta do jogo – e acham ridículo esse nosso apego a elas. Realpolitik, é isso.
É isso que está em jogo para eles. Não importa o lado, a forma do discurso, no fim do dia sua vida ainda vai estar em perigo. Óbvio, eles sabem que existem escalas, que existem gradações, mas ali, para quem está de fora, isso é apenas um narcisismo das pequenas diferenças. Bom lembrar que as violações, os processos genocidas contra esse povo não começaram na ditadura e não terminaram com ela. Eles perduram, inclusive se agudizaram durante os últimos governos supostamente à esquerda.
De fato, diria que eles são viciados em política, pois eles sabem que esses joguetes de poder os atingem diretamente: são viciados pois é necessário compreender bem o que se passa, a ecologia da nossa política, para que possam se defender dela. Que espécie de animal é o político branco? O que ele come? Como vive? Mais importante, como posso me proteger dele? Essas são as perguntas fundamentais da reflexão dos Aikewara sobre a nossa ecologia política.
Para esses indígenas, reconhecer-se opressivo é o primeiro passo para minimizar seus efeitos sobre o outro. Foto: Orlando Calheiros | Arquivo Pessoal
IHU On-Line – Suas incursões junto aos Aikewara o fizeram mudar suas concepções e entendimentos acerca da política? Como?
Orlando Calheiros – Bem, eu venho de uma formação anarquista (ou pós-anarquista como diriam alguns) e as palavras de meus amigos me ajudaram a compreender e a codificar vários dos meus incômodos com o nosso vocabulário político tradicional. Por exemplo, a distinção entre a ordem política e a ordem natural que marca, fundamentalmente, a nossa existência “política”. Política e natureza não são coisas distintas – e compreender isso se torna cada vez mais urgente diante do antropoceno.
IHU On-Line – De que forma a ideia de totalitarismo pode ser apreendida a partir da cosmovisão indígena?
Orlando Calheiros – Não gosto da palavra cosmovisão, ela nos remete a um dos piores pressupostos (racistas) da nossa noção de cultura. Uma espécie de fidelidade cega a um conjunto de pressupostos simbólicos etc. Enfim, mas esse não é ponto.
Sobre o totalitarismo, bem, isso depende daquilo que concebemos como totalitarismo nos termos da nossa filosofia, o termo não é tão simples quanto normalmente supomos. É sempre bom lembrar que Hannah Arendt escreveu centenas de páginas para tentar caracterizá-lo – e ela não foi a única. De uma maneira bem geral, poderíamos dizer que o totalitarismo se define como um regime opressivo. E esse é um ponto fundamental. Para meus amigos, todo regime, estatal ou vital, não importa se estamos falando do capitalismo ou das nossas necessidades alimentares, é em alguma instância opressivo. Existir é oprimir outrem. Afinal, os Aikewara sabem que a carne que consomem já fora um queixada, uma anta… Reconhecer isso é fundamental. Justamente, fundamental para que sejamos capazes de reduzir isso ao mínimo possível. Como os Aikewara buscam fazer ativamente.
A existência dos não indígenas, dos brancos, pelo contrário, dizem os Aikewara, é marcada justamente pela negação desse axioma. E não apenas pela negação de que o alimento que chega até nós é resultado final da opressão de outro ser vivo, mas nossas roupas, nossos objetos. Nossa existência, em suma, é erguida sobre o sofrimento de outrem. As massas de pessoas que, todos os dias, enfrentam ônibus lotados para ir trabalhar, exaustas, infelizes. Isso é sofrimento para os Aikewara. Negamos isso ativamente, negamos que todos os aspectos da nossa vida citadina sejam mantidos pelo sofrimento, seja o sofrimento de outrem, seja o nosso. E por isso somos verdadeiramente incapazes de combatê-lo. Reconhecer que se tem um problema é o primeiro passo para o tratamento. Nesse caso, para o regime totalitarista – pois opressivo – que marca a nossa vida.
Resumindo: diria que o totalitarismo, nos termos deloucados pela filosofia aikewara, é muito mais do que um mero sistema de governo, é uma forma de existir: existir em negação.
Perspectivismo indígena pode ser caminho para enfrentar desafios de nosso tempo. Foto: Orlando Calheiro | Arquivo Pessoal
IHU On-Line – De que forma o perspectivismo ameríndio pode se configurar como um caminho para compreender e enfrentar os desafios de nosso tempo?
Orlando Calheiros – O perspectivismo ameríndio inscrito pelos trabalhos de Eduardo Viveiros de Castro e Tania Stolze Lima marcam uma virada na etnoantropologia ocidental. A criação de um dispositivo de aliança que amplia os termos do nosso pensamento, abrindo-o, tornando-o capaz de ser afetado por aqueles, por aquelas vozes que até então julgávamos incapazes de compor. Não é o caso de fazer uma análise da tradição que dá origem ao perspectivismo, o importante é que ele nos permite não apenas falar do outro, mas, por meio da ampliação do nosso vocabulário filosófico – afetado por este outro, justamente –, falarmos de nós mesmos.
De fato, diante do cenário atual (antropoceno, reemergência global do fascismo) acho que esse tipo de movimento não é apenas saudável como urgente.
IHU On-Line – Deseja acrescentar algo?
Orlando Calheiros – Que quando falo da necessidade de recorrermos às filosofias indígenas para falarmos de política, da nossa política, estou falando para escutarmos aqueles que não apenas, historicamente falando, resistiram ao Estado, mas aqueles cuja existência, em todos seus aspectos, são radicalmente marcados por essa recusa.
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Totalitarismo como forma de existir. Um olhar aikewara sobre o “mundo branco”. Entrevista especial com Orlando Calheiros - Instituto Humanitas Unisinos - IHU