Por: João Vitor Santos | 28 Fevereiro 2018
IHU promove simpósio internacional para discutir as provocações do Papa diante das questões do mundo contemporâneo
Em 13 de março de 2013, o anúncio de que o cardeal Jorge Mario Bergoglio seria o novo papa deixou surpresos até os vaticanistas mais experientes. Dentro da Igreja não foi diferente e, aos poucos, ao longo desses cinco anos, o estilo de Francisco foi surpreendendo, provocando o próprio catolicismo a se repensar no mundo de hoje. Muito menos teórico e mais pastor, o novo pontífice de imediato convoca uma “Igreja em saída”. Formado no ambiente da Teologia do Povo, na Argentina, em que a ênfase está na pastoralidade e na atenção aos mais necessitados, Bergoglio lança outros olhares não só sobre os problemas da cristandade, mas também do mundo. Aos poucos, vai despontando também como um líder político internacional que, em tempos de nacionalismos extremados, torna-se uma voz dissonante em meio à intolerância. O tom de seu papado é dado logo na primeira viagem, a ilha italiana de Lampedusa, onde vai defender os imigrantes, que morrem aos milhares na travessia do Mediterrâneo. Os contornos do atual pontificado ganham ainda mais expressão quando comparados à eleição de Donald Trump, em 2016, que vence o pleito com um discurso que vai, justamente, na contramão e cuja principal promessa era a construção de um muro entre o México e os EUA.
Essa postura vai chamando a atenção de diversas pessoas que pensam os problemas da humanidade na pós-modernidade muito além do espectro religioso. Entre elas, o sociólogo e filósofo polonês Zygmunt Bauman (1925-2017), uma referência nas reflexões sobre as inquietações geradas a partir da modernidade. Em setembro de 2016, o professor reuniu-se com Francisco, em Assis, na Itália. Bauman manifestou ao pontífice sua simpatia pelas manifestações e ações diante de questões globais. Andrea Riccardi, em ensaio publicado no volume La luce in fondo al tunnel. Dialoghi sulla vita e la modernità (San Paolo Edizioni, 2018) [A luz no fim do túnel. Diálogos sobre a vida e a modernidade, em tradução livre], escreve que o professor nunca escondeu seu “pessimismo” sobre a situação e a evolução do mundo contemporâneo. Entretanto, disse a Francisco: “eu trabalhei toda a vida para tornar a humanidade um lugar mais hospitaleiro. Cheguei aos 91 anos e vi muitos falsos começos, até me tornar pessimista. Obrigado, porque você é para mim a luz no fim do túnel”.
Uma das marcas de Francisco é a forma como dessacraliza a figura do pontífice em qualquer ambiente (Foto: Ismael Francisco/Cubadebate)
De onde vem o fascínio de intelectuais pela figura de Francisco, que não se coloca como um nobre líder internacional, ao contrário, parece até tentar se afastar dessa ideia, buscando sempre um contato mais direto com as pessoas? Em grande parte, esse fascínio é baseado em ações como, por exemplo, a busca de Francisco pelo diálogo inter-religioso, a defesa que faz da importância do acolhimento ao imigrante e o combate feroz ao estilo de vida que tem no consumo seu alicerce. Posicionamentos que provocam inquietações que ecoam dentro e fora dos muros vaticanos.
No turbilhão dos dias correntes, a liderança política de Bergoglio não aparece como salvacionista, mas como alguém atento aos dilemas contemporâneos. Ele coloca a Igreja e os dilemas do mundo de hoje no mesmo cenário, fustigando um debate acerca dos desafios contemporâneos, sem se fechar no mundo eclesial, mas olhando para fora e propondo uma visão social, econômica, (geo)política, ecológica, cultural e teológica que não encontra eco nas formas hegemônicas de financeirização da vida e da natureza.
Talvez, olhar com mais atenção à figura do papa Francisco possa nos ajudar a pensar nossos desafios de forma transdisciplinar. É com o intuito de promover esse movimento que o Instituto Humanitas Unisinos - IHU promove, entre os dias 21 e 24 de maio, na Unisinos Porto Alegre, o XVIII Simpósio Internacional IHU – A Virada Profética de Francisco. Possibilidades e limites para o futuro da Igreja no mundo contemporâneo.
O XVIII Simpósio Internacional IHU é destinado tanto à comunidade acadêmica como ao público em geral. Ao todo, serão 32 convidados, divididos em palestras e minicursos. As inscrições podem ser feitas através do site. Já na manhã de segunda-feira, dia 21 de maio, serão exibidos filmes que ajudarão os participantes a mergulhar no universo de Mario Jorge Bergoglio, desde a sua origem, na Argentina. À tarde, inicia a agenda de minicursos que se estenderão ao longo da semana. Serão mais de dez, que abordarão desde a repercussão e recepção de documentos como Amoris Laetitia e Laudato Si', assinados pelo papa Francisco, até perspectivas teológicas, litúrgicas e também econômicas, sociais e políticas defendidas pelo pontífice.
A conferência de abertura ocorre à noite, também na segunda-feira, dia 21, às 20h, e terá como palestrante o Prof. Dr. Luiz Gonzaga Belluzzo - FACAMP. Ele abordará “As grandes tendências que caracterizam o mundo contemporâneo”. Em entrevista ao site do IHU, Belluzzo destaca suas impressões sobre o pontífice. “O que o Papa fala é que, a despeito da capacidade de produção e da oferta de bens, aumentou a desigualdade e se impôs ao comportamento das pessoas uma tremenda atração, ou o que ele chama de fetichismo do dinheiro, com uma perda de importância dos valores de solidariedade, de amor ao outro”, destaca.
No último dia do evento, 24 de maio, a palestra de Austen Ivereigh, doutor em Ciência Política e articulista do Catholic Voices, de Londres, é um dos destaques. Ele proferirá a conferência “A opção de Francisco: como evangelizar um mundo em mudança?”. Ivereigh é autor de The Great Reformer: Francis and the Making of a Radical Pope [O grande reformador: Francisco e a criação de um papa radical, em tradução livre] (Allen & Unwin; Edição: Main, 2017), a principal biografia do Papa publicada até agora. Isso porque, ainda antes de escrever sobre Bergoglio, Ivereigh se dedicou a pesquisar as relações da igreja na Argentina com o regime militar pelo qual o país passou. Em entrevista à IHU On-Line, o jornalista justificou o título que deu a Francisco: “Eu o chamo de ‘grande reformador’ porque ele tem se mostrado resoluto em seu objetivo de convocar a Igreja para voltar à sua missão essencial. Isso faz dele um reformador na tradição das reformas católicas ao longo dos séculos”.
Período: 21 a 24 de maio de 2018
Local: Teatro Unisinos – Campus Porto Alegre
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O estilo Francisco: uma inspiração para o nosso tempo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU