Por: João Flores da Cunha | 01 Fevereiro 2017
Um integrante do governo de Mauricio Macri na Argentina relativizou a última ditadura do país (1976-1983) e os crimes cometidos por ela. Juan José Gómez Centurión, diretor-geral de Aduanas do país, negou o caráter sistemático da repressão de Estado e questionou o número de 30.000 desaparecidos da ditadura. Entidades e pessoas ligadas aos direitos humanos pediram a renúncia do funcionário.
Gómez Centurión afirmou que “não é a mesma coisa 8.000 verdades do que 22.000 mentiras”, aparentemente negando o número de 30.000 desaparecidos e sugerindo que teriam sido 8.000. Ele negou que a ditadura tenha sido um “plano sistemático” ou um “plano genocida” e disse “não compartilhar” dessa visão, que chamou de uma “visão da história”. As declarações foram dadas a uma emissora de televisão no dia 29-01.
As afirmações do integrante do governo foram duramente criticadas por diferentes setores da oposição e de entidades de direitos humanos. As organizações das Avós e das Mães da Praça de Maio pediram que o funcionário renuncie ou seja demitido.
A ex-presidenta Cristina Fernández de Kirchner criticou o funcionário do governo, que, segundo ela, cometeu “apologia do delito”. Ela destacou que “as condenações judiciais provaram e definiram genocídio e plano sistemático de desaparição”. Em seu governo, os Kirchner impulsionaram uma política de direitos humanos que buscou conduzir à Justiça os responsáveis pela repressão de Estado que ocorreu no período da ditadura.
Gómez Centurión cometió apología del delito. Las condenas judiciales probaron y definieron genocidio y plan sistemático de desaparición.
— Cristina Kirchner (@CFKArgentina) 30 de janeiro de 2017
As declarações também foram criticadas pelo próprio governo. A Secretaria de Direitos Humanos emitiu um comunicado em que afirma que as opiniões de Gómez Centurión são “pessoais, não são compartilhadas desde nenhum ponto de vista e não podem ser tomadas como representativas do pensamento do governo”. Na nota, o órgão reitera que houve na ditadura um “plano sistemático de desaparição de pessoas, roubos de bebês, assassinatos, expropriações e detenções arbitrárias”, e que o número de 30.000 desaparecidos é um “emblema social”, e é “indiscutível”.
No dia 30-01, Gómez Centurión, que é militar aposentado, pediu “uma sincera desculpa” a quem se ofendeu por suas declarações, mas não se retratou. Não é a primeira vez que o funcionário aparece envolvido em uma polêmica. Em 2016, ele chegou a ser afastado por suspeitas de corrupção, mas acabou sendo reinstalado no cargo.
Tampouco é a primeira vez que o governo de Macri é criticado por conta de sua forma de tratar a ditadura. Em agosto de 2016, o próprio presidente havia afirmado “não saber” se foram 30.000 os desaparecidos pela ditadura. Cristina Kirchner buscou associar as declarações de Gómez Centurión ao presidente, sugerindo que as manifestações revisionistas são uma política de seu governo.
Recentemente, o governo se viu obrigado a recuar de uma decisão de alterar o feriado de 24-03, que marca o aniversário do golpe de 1976. Na Argentina, há feriados fixos, que devem ser celebrados necessariamente na mesma data – como o dia da Independência –, e os que podem ser movidos para outro dia: um feriado que ocorra em uma quinta-feira pode ser celebrado na sexta-feira, por exemplo. As reclamações de entidades de direitos humanos, porém, fizeram com que o governo desistisse da iniciativa.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Argentina. Integrante do governo Macri minimiza crimes da ditadura - Instituto Humanitas Unisinos - IHU