29 Agosto 2016
Segundo o diretor-executivo do Centro Brasil no Clima, Alfredo Sirkis, a situação é preocupante, e mesmo que “todos os países cumpram seus iNDCs religiosamente”, ainda assim, sobrará em 2030 aproximadamente 15 gigatoneladas de emissões de carbono para contribuir com o aquecimento global.
O Brasil faz parte dos 23 países que, até o momento, já aderiram ao Acordo de Paris sobre Mudança do Clima, para reduzir os gases de efeito estufa (GEE) como forma de limitar o aumento da temperatura mundial a 2ºC até 2100. Contudo, essas nações respondem por apenas 1% do total de gases poluentes no mundo. Para o acordo entrar em vigor de forma imediata é necessário que 55 países ratifiquem suas metas de redução, especialmente potências como Estados Unidos, China, Rússia e o bloco da União Europeia, que juntos, são responsáveis por 57% das emissões no planeta.
A reportagem foi publicada por Agência Gestão CT&I, 26-08-2016.
O andamento do acordo foi apresentado nesta terça-feira (23), durante audiência pública promovida pela Comissão Mista de Mudanças Climáticas do Senado Federal. O colegiado reuniu especialistas do setor para debater o Acordo de Paris e sua regulamentação, que será feita na 22ª Conferência das Partes (COP 22), a ser realizada de 7 a 18 de novembro pela Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês) em Marrakesh, no Marrocos.
No entanto, as ações que os países pretendem tomar para reduzir os gases poluentes, previstas na Pretendida Contribuição Nacionalmente Determinada (iNDC, na sigla em inglês), podem não ser suficientes para lidar com as mudanças climáticas. Segundo o diretor-executivo do Centro Brasil no Clima, Alfredo Sirkis, a situação é preocupante, e mesmo que “todos os países cumpram seus iNDCs religiosamente”, ainda assim, sobrará em 2030 aproximadamente 15 gigatoneladas de emissões de carbono para contribuir com o aquecimento global. “Ou seja, é o equivalente a uma China e meia de emissões, ainda que todos cumpram seus iNDCs.”
Na avaliação de Sirkis, a questão chave para resolver esse problema é um sistema econômico mundial alinhado a ações que estimulem a utilização do baixo carbono. “A dinâmica da economia tem que ser amigável em relação ao que se percebe das mudanças climáticas, e por outro lado, temos que resolver como será o financiamento na transição do modelo atual para economia de baixo carbono nas próximas décadas. Assim, chegaremos a situação em que aquilo que é emitido e o que é removido da atmosfera se equivalha. Esse é um desafio gigantesco”, ressaltou.
Discutir financiamento no âmbito da UNFCCC, especialmente para estimular a economia de baixo carbono, tem sido um dos maiores percalços das Nações Unidas, na visão de Sirkis. Iniciativas como o Fundo Verde para o Clima, criado para ajudar países vulneráveis a lidar com os efeitos da mudança climática, reuniram investimentos abaixo do mínimo necessário.
“Quando eles falam em financiamento, pensam em algo como US$ 100 bilhões por ano, ou US$ 120 bilhões no máximo, mas a demanda da economia global para essa transição [para o baixo carbono] é de US$ 3 trilhões por ano. Ou seja, de onde virá esse dinheiro? Em um momento em que praticamente todos os governos estão endividados, isso é uma grande questão”, alertou o diretor-executivo.
De acordo com o embaixador José Antônio Marcondes de Carvalho, um dos líderes da delegação brasileira em Paris, o acordo necessita ser regulamentado adequadamente em vários setores. Isso inclui áreas como a de transferência de tecnologia entre os 195 países que integram a UNFCCC, a responsabilidade histórica de nações desenvolvidas nas mudanças climáticas, e as formas de financiamento das ações para reduzir emissões de GEE.
“Temos um abismo no provimento de meios para as ações climáticas. O que é necessário ainda está longe. O Fundo Verde do Clima, na sua capitalização em 2015, alcançou pouco mais de US$ 10 bilhões. Houve um entendimento de que haveria disponibilização de US$ 100 bilhões anuais de várias fontes. Mas onde estão os US$ 90 bilhões restantes? Como será feita essa contabilidade? Como será a transparência nesses fundos? Esses são aspectos que estão por ser regulamentados, na conferência em Marrakesh”, comentou Carvalho.
Para o diretor-executivo do Centro Brasil no Clima, a estratégia de mitigação dos gases do efeito estufa precisa ser visualizada, além do ponto de vista social e ambiental, pelo seu valor econômico. Sirkis avalia que assim será possível atrair investimentos essenciais para financiamentos, oriundos do setor produtivo. “Quando 196 governos anunciam ao mundo que reduzir ou remover carbono da atmosfera tem valor econômico intrínseco, cabe transformar isso em mecanismos financeiros. Mas isso é algo que transcende as Nações Unidas, porque envolve o G-20 e os grandes bancos centrais e internacionais”, explicou.
Ao mesmo tempo que enfrenta a questão das mudanças climáticas, a economia de baixo carbono precisa encontrar soluções convergentes, que disponibilizem recursos em massa. “Esse processo faz parte do investimento produtivo, gerador de empregos em vários países. No Brasil, há oportunidades fantásticas. Somos um país muito bem situado para energias limpas, como eólica, solar, biomassa, o etanol de segunda geração. Creio que é no campo da economia que vamos conseguir matar esse problema”, disse Sirkis.
Segundo o diretor do Departamento de Mudanças Climáticas do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Adriano Santhiago, há estratégias em elaboração com outras pastas governamentais para expandir a redução dos gases poluentes e aumentar a participação do setor privado nos investimentos. “Temos iniciado diálogos importantes com o setor privado. Um exemplo foi a reunião com secretários estaduais de meio ambiente que teve como objetivo buscar recursos privados. Vamos precisar muito do setor produtivo para atingir nossos compromissos”, afirmou.
O Brasil apresentou uma série de metas no Acordo de Paris, como o compromisso de reduzir as emissões de gases do efeito estufa em 37% até 2025, podendo chegar a 43% até 2030, além da participação de fontes de energia renovável em 45% da matriz energética do País. Também assumiu o compromisso de baixar em 80% o desmatamento legal e em 100% o ilegal até 2030. Outra meta para 2030 é restaurar 12 milhões de hectares de florestas, uma área equivalente ao território da Inglaterra.
A confirmação da adesão do Brasil ao Acordo de Paris foi aprovada em pouco mais de um mês pelo Congresso Nacional, por meio do Projeto de Decreto Legislativo (PDS) 19/2016, encaminhado à promulgação. O embaixador José Antônio Marcondes elogiou a tramitação rápida imposta pelo Senado e Câmara dos Deputados, e informou que países como Estados Unidos e China ainda continuam com seus processos a serem analisados.
“A possibilidade de confirmação do acordo dos Estados Unidos e da China pode vir antes da conferência no Marrocos, em novembro. Outros países poderão demorar um pouco mais. A França já concluiu o processo interno de ratificação, mas a União Europeia pretende apenas fazer o depósito de seu instrumento de ratificação quando todos os membros dela estiverem em condições. Há uma luta coletiva internacional contra o relógio para que, o quanto mais rápido possível, seja colocado em vigência o Acordo de Paris”, comentou o embaixador.
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Acordo de Paris enfrenta desafios econômicos para cumprir metas - Instituto Humanitas Unisinos - IHU